Jornalista e mestre em História Social pela Universidade de São Paulo (USP). Servidor público de Cubatão, atua na assessoria de imprensa da prefeitura do município.
Em 1949, apenas quarto anos após o fim da Segunda Guerra (1939-1945), o mesmo Borges (1899-1986) já havia publicado em “O Aleph” a narrativa “Deutsches Requiem”, em que o narrador, nos mesmos moldes do romance de 2006, um oficial nazista, o subdiretor do campo de concentração de Tarnowitz, Otto Dietrich zur Linde, registra seu próprio epitáfio:
Nas últimas semanas tenho escrito sobre livros publicados nos últimos 20 anos nos quais o testemunho e o relato pessoal recebem camadas de fabulação e ficção e como isso vem ocorrendo em temas trágicos da história recente, como a ascensão do nazismo ou as ditaduras latino-americanas. No mais diferentes entre si, identifiquei essa forma de escrita em já consagrados autores como W.G. Sebald, Roberto Bolaño e Gonçalo M. Tarares ou novos nomes como Marcelo Ariel e Rodrigo Naranjo. Seus livros têm uma linhagem.
Nas últimas colunas apresentei algumas leituras de autores que se utilizam dos relatos da memória para tecer poemas, narrativas, contos e romances e como esta literatura (de natureza ficcional em grande parte) dão perspectiva para a reflexão sobre a experiência recente de tragédias sociais como Vila Socó (Marcelo Ariel), das ditaduras latino-americanas (Roberto Bolaño e Rodrigo Naranjo) ou, duas gerações antes, o destino forçado de emigrantes que se afastavam ou fugiam da ascensão do nazismo (W.G. Sebald).
II A junta militar por dentroOutro autor que li sobre o mesmo prisma foi o chileno Roberto Bolaño. É algo que vale para muito de sua obra, mas referi-me principalmente ao romances “Noturno do Chile” no texto “História e literatura em Bolaño” (aqui), primeira obra sua publicada no Brasil, em 2004, um ano após sua morte. Seu narrador é um crítico literário e poeta que, ao fim da vida, narra o começo de sua carreira na década de 70 quando, após o golpe, forma-se como padre e, após alguns serviços intelectuais para a Opus Dei, acaba dando aulas de marxismo para a junta militar.
As narrativas de testemunho em primeira pessoa – como “Memórias do cárcere” (Graciliano Ramos) ou “O que é isso, companheiro?” (Fernando Gabeira) – são entranhadas pela memória dos fatos vividos pelo narrador, são verdadeiros documentos históricos e na Argentina têm até valor como prova testemunhal nos julgamentos de torturadores.