Quinta, 21 Novembro 2024

Diante dos antecedentes e das perspectivas de caos, de colapso, e de uma intrigante letargia para que o sistema de agendamento de descarga/carga no Porto de Santos passasse a ser praticado (projeto que se arrastava por 14 anos e 23 normas), não havia outra alternativa: Caminhões e carretas precisariam ser retidos, de qualquer forma, em algum ponto ao longo do trajeto porteira-porto.

Nos últimos anos, às vésperas do pico exportador das safras, normalmente são anunciadas iniciativas e/ou planos para solucionar os caos. Mas, desta vez, certamente, escaldado pelas tormentas de 2013 (01, 02, 03, 04, 05, 06, 07, 08, 09), o governo federal resolveu se antecipar para anunciar o Plano Safra-2014 (01, 02, 03, 04). Se conceitualmente e no conteúdo ele não difere muito dos anteriores, na estratégia sim:

Por um lado, os governos federal (responsável pelo Porto), estadual (pela malha rodoviária de acesso) e as prefeituras (pelo viário urbano) parece que caminham para atuar mais coordenadamente. Por outro lado, se preparam para um tratamento de choque. P.ex: Multas e viabilização/disponibilização de pátios reguladores (bolsões de estacionamento), mesmo que improvisados.

Os caminhoneiros, todavia, já manifestaram seu ceticismo: “Agendamento de descarga em portos transfere filas para o interior”. E justificam, já chiando: “As filas só estão mudando de lugar e o caminhoneiro continua sendo penalizado. O embarcador continua fazendo do caminhão seu armazém”.

Para a Safra-2014, e para o curto prazo, insista-se: não há alternativa!

Infelizmente o dever de casa não foi feito no seu devido tempo. Assim, menos mal que seja lá (no interior; que tem alternativas de áreas) que no porto (onde o espaço é exíguo): É preciso evitar que o sistema trave completamente; que colapse ... com as consequências colaterais, também, sobre o dia-a-dia das cidades portuárias. Mas, no médio/longo prazo, a sensibilidade dos caminhoneiros, e as questões que eles levantam fazem sentido; merecem reflexões: Mudanças estruturais, e profundas, são necessárias!

No curto prazo, os bolsões e pátios reguladores são imprescindíveis. Mas não dá para se imaginar que a solução no médio/longo prazo, para as cadeias logísticas que envolvem portos, esteja na implantação de dezenas de bolsões ou pátios reguladores... sob pena de, aí sim, transformar-se caminhões/carretas (também vagões ferroviários!) em silos... com enormes perdas econômicas.

Por isso, vale à pena relembrar (01, 02, 03):

Por que será que inexiste fila de caminhões de cítricos (suco de laranja) no Porto de Santos? Certamente porque o setor concebeu, implantou e gerencia cadeias logísticas multimodais, bem coordenadas, da origem (no interior do Estado) até o destino (em algum ponto no exterior). Além das filas desprezíveis, quando existentes, tal coordenação resultou em redução de custos logísticos, um dos pilares da competitividade e liderança mundial do Brasil nesse mercado.

Algo semelhante (inexistência de filas) também ocorre com as montadoras automobilísticas: Já de algum tempo, desde que adotaram o “just-in-time”, seus estoques foram reduzidos, chegando a “estoque ZERO” em muitos dos componentes.

Outra analogia: Em vários países desenvolvidos (Canadá e Suécia, p.ex.) há muitas cidades cujas casas simplesmente não têm caixa d’água instalada: torneiras e registros estão ligados diretamente ao encanamento da rua! Isso porque a confiabilidade (inverso da probabilidade de falta) do fornecimento é tão alta que as caixas d’água tornaram-se desnecessárias. No Brasil, ao contrário, em muitas cidades a confiabilidade é bastante baixa (ou seja, a probabilidade de falta é alta). Para enfrenta-la, uma caixa d’água é insuficiente; demandando uma segunda, grandes cisternas, toneis e, até, piscinas portáteis.

Esses exemplos contradizem algumas ideias equivocadas, largamente aceitas/arraigadas: i) Que a existência de algum tipo de armazenagem (estoque, caixa d’água, estacionamento, etc.) é imprescindível a qualquer processo produtivo ou de consumo. ii) Que o tamanho dessa armazenagem é direta e inexoravelmente proporcional ao tamanho do fluxo.

... também que mais infraestrutura é a única saída para as filas portuárias. Não! Inteligência, planejamento, organização e gestão certamente podem minimizá-las.

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