Sábado, 28 Dezembro 2024

No último artigo “Um Réveillon a bordo nos Anos 30”, mostramos alguns navios de passageiros de cascos brancos, dentre os quais mencionamos o Conte Grande, de que foi mostrado o salão de festa durante jantar de gala. Mas o navio não foi apresentado, o que vai acontecer neste artigo, em que é protagonista o Conte Biancamano, gêmeo do célebre Conte Grande.


O Conte Biancamano, da Itália di Navigazione que fazia par com o Conte
Grande
, atracado em Santos, por volta de 1950, já com a proa lançada e o
casco na cor branca, que o diferenciava do período anterior à Segunda Guerra
Mundial. Acervo: Laire José Giraud

 

O texto abaixo é de um catálogo publicitário da Itália Flotte Riunite – Genova, do início dos anos 30, o qual dá algumas informações aos pretensos passageiros daquela longínqua década. Para dar mais ênfase no artigo foi conservada a forma de escrever, bem como a grafia da época.

 

“O Conte Biancamano não é desconhecido dos Sul Americanos. Em Março de 1928 effectuou uma viagem a Buenos Ayres interrompendo o seu serviço regular na carreira da América do Norte. A Sociedade “ITALIA” decidiu definitivamente meter na carreira da América do Sul este paquete destinado a fazer o maior sucesso não só pelo tamanho, segurança e rapidez, como também pelo excellente serviço, completamente remodelado quando da sua entrada nesta nova carreira.

 

Capa do catálogo publicitário do início da década de 1930,

com informações gerais sobre o navio, que ia desde as

características técnicas, ambientes e lazer de bordo.

Acervo: Laire José Giraud

 

A Segunda Classe do Conte Biancamano, apesar de não ter o luxo da Primeira Classe, offerece um conjuncto de salas espaçosas, claras, mobiladas com raro gosto, cabines cômodas, casas de banho e duche, convez coberto e aberto, emfim tudo quanto pode tornar a vida abordo agradável e cômoda. Uma cosinha optima tradicional dos Contes; espetáculos animatograficos, concertos, bailes nos salões e no convez, sports e jogos; um jornal “Il Corriere Del Maré” com as noticias de todo o mundo; vida alegre e sã abordo do Conte Biancamano, terceiro da série dos Contes, e maior que os dois paquetes gêmeos Conte Rosso e Conte Verde, que já conquistaram grande fama na carreira da América do Sul”.

 

Beleza e luxo

Pelo seu esplendor, o transatlântico italiano Conte Biancamano sempre despertou enorme admiração. Embora não fosse o maior navio da frota italiana, mas apenas um transatlântico de porte médio, pelos padrões mundiais da época, dele se destacavam o luxo e a beleza.

 


O Conte Biancamano, antes da Segunda Guerra Mundial, com o
casco na cor preta e a proa reta, que dava um aspecto bem diferente
do período pós-guerra, onde sua aparência era mais alegre e tropical.
Foto: Reprodução

 

A primeira classe era de um luxo digno de um castelo de condes. Os privilegiados ocupantes dispunham de duas suítes, 12 cabinas de luxo, 56 cabinas especiais com banho e vastos salões públicos esplendidamente decorados. Neles, os arquitetos Brasini e Coppede (da casa artística Coppede, fundada em 1885, em Florença) exibiam verdadeiras obras-primas.

 

O Conte Biancamano recebeu esse nome em homenagem ao conde Umberto, apelidado de Biancamano (mão branca, em italiano), por suas qualidades diplomáticas.

 

No mar

Depois do sucesso dos transatlânticos Conte Verde e Conte Rosso, no início da década de 20, tanto nas rotas dos Estados Unidos como da América do Sul, a armadora Lloyd Sabaudo decidiu construir outro par de navios, com características semelhantes: o Conte Biancamano e o Conte Grande. Este último, durante muitos anos, também freqüentou as águas do Brasil.


O Conte Biancamano em plena navegação e com um ar jovial,
atraía muitos passageiros, tanto na linha do Atlântico Norte, como
na linha Sul Americana.  Acervo: Laire José Giraud

 

Encomendado ao Estaleiro W. Beardmore, de Glasgow (Escócia), o Conte Biancamano foi lançado ao mar em abril de 1925 e, no dia 7 de novembro do mesmo ano, partiu com destino à Itália, impressionando pela imponência e linhas mais equilibradas que as dos antecessores.

 

No dia 12, finalmente, o Conte Biancamano entrava no Porto de Gênova, embandeirado de gala, verdadeiro orgulho da marinha mercante da Itália.

 

Perfil

Em viagem inaugural, sob o comando do capitão Turchi, o transatlântico deixou Gênova no dia 23 de abril, rumo a Nova Iorque. Encontravam-se a bordo 1.604 passageiros, 350 dos quais viajavam em primeira classe.

Os artistas de Hollywood Douglas Fairsbank
e sua esposa Mary Pickford, na companhia de
sua filha, foram alguns dos inúmeros passageiros
famosos do legendário navio. Foto: Reprodução
 

Com oito conveses e 12 divisões estanques, o navio ainda dispunha de cinco porões de cargas, sendo um reservado a produtos refrigerados e outro à bagagem dos passageiros, além de duas salas de caldeiras, duas de máquinas e tanques de combustível.

 

Durante uma década e meia, deslocou-se seguidamente entre a Europa e as Américas, alternando as viagens aos Estados Unidos e ao Brasil, Argentina e Uruguai.

 

Maria Fea

Vale a pena registrar um fato importante relacionado a Santos. Foi a bordo do Conte Biancamano que a italiana Maria Fea chegou ao Brasil.

 


O catálogo do navio mostrava fotografias dos locais por onde o navio escalava.
Santos era representada pela Praia do Gonzaga. – Anos 30.

 

Ela morava em São Paulo e, no dia 4 de outubro de 1928, foi assassinada pelo marido, que tentou despachar o corpo para a Europa, dentro de uma mala, no navio francês Massilia. Mas o cadáver foi descoberto pelos estivadores do porto, e sepultado no Cemitério da Filosofia.

 

Desde então sua sepultura é visitada por parte da população, que lhe credita muitos milagres.

 

Nova Era  

A Segunda Guerra Mundial praticamente decretou o fim dos transatlânticos e o Conte Biancamano não fugiu à regra.


A série de jogos e distrações a bordo era infinita, que iam desde
exercícios físicos, ministrados por professores de educação física,
até os jogos de precisão e de lazer, como o que vemos na fotografia.
Foto: Catálogo Conte Biancamano

 

Em dezembro de 1941, foi apreendido pelos Estados Unidos em Cristobal (Panamá), onde se achava refugiado. Transformado em navio-transporte de tropas e rebatizado Hermitage, operou para os aliados até o fim do conflito.

 

Em 1947, foi devolvido às autoridades italianas, mas o mundo já não era o mesmo. Em menos de uma década, os transatlânticos perderiam espaço para o avião.

 

O salão de jantar de segunda classe era mais luxuoso do
que os de primeira de outros navios da época, conforme
mostra a fotografia.
 

 

Totalmente reformado, mas sem o esplendor antigo, o Conte Biancamano iniciara a primeira viagem pós-guerra no dia 10 de novembro de 1949, deixando Gênova com destino á Argentina. Com escalas no Rio de Janeiro e em Santos, voltava ao Brasil depois de 13 anos de ausência.

 

O transatlântico italiano ainda representava o que de melhor havia em transporte marítimo, mas ano a ano diminuía a procura dos passageiros (no fim da década de 50, os Super-Constellation faziam a ligação aérea entre o Brasil e Europa em 36 horas!) e a última viagem aconteceu em 1960, ano em que foi levado a La Spezia, para ser demolido.



Maria Mercedes Fea, que é tida por muitos como
milagrosa, foi uma das passageiras do Conte
Biancamano
.
Ficou conhecida por ter sido vítima
do crime da mala.
Maria Fea está sepultada no
Cemitério da Filosofia em Santos. Foto: Reprodução


Restaram as lembranças da era de ouro dos transatlânticos, o charme das viagens transatlânticas e a visão eterna dos magníficos navios brancos, embandeirados a arco, cruzando a Barra de Santos.


O maravilhoso e inesquecível Conte Grande, que deixou de ser
mostrado no artigo anterior, foi um dos navios mais belos e célebres
que passou pelo Porto de Santos, nos anos dourados dos transatlânticos.
Acervo: Laire José Giraud

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