Sábado, 04 Janeiro 2025

Todos sabem que a Via Anchieta é uma das estradas que liga a cidade de Santos à Capital Paulista e a cidades do ABCD (Santo André, São Bernardo, São Caetano e Diadema), além de contar com muitas curvas no trecho da Serra do Mar. Essas curvas ficaram famosas no Brasil inteiro, na canção de Roberto Carlos.

 

A Via Anchieta, no ano em que foi composta a melodia ’’As Curvas da

Estrada de Santos’’, de Roberto Carlos,  em1969.

 

Numa dessas noites, pouco antes de dormir, escutava no meu radinho de pilha (companheiro inseparável) uma famosa estação de rádio de São Paulo, que intercala músicas e notícias. Durante a audição, uma das músicas tocadas foi As Curvas da Estrada de Santos, canção de 1969 que fez muito sucesso. Diga-se de passagem, desde o início dos anos 60, escuto falar que a televisão havia matado o rádio. Mas que grande mentira, ele está aí, cada vez mais forte, com seus milhões de ouvintes. Cada um tem o seu espaço. Sou um grande admirador desse meio de comunicação.

 

* Operário de 89 anos relembra construção da Via Anchieta

 

Voltando à canção, ela me trouxe muitas lembranças, como os sábados à noite no Clube dos Ingleses, as domingueiras do Clube Sírio Libanês, antigas namoradinhas. As lembranças vindas através dessa bela música, mergulharam tanto nas recordações, que me levaram até o distante 1951, ano da minha primeira viagem a São Paulo, através da Via Anchieta. Isto é, que me recordo.

 

 

 

 

 

 

 

A simpática Praça Ruy Barbosa, antigo Largo do Rosário, com o monumento ao Padre Voador, Bartolomeu de Gusmão, tendo à direita a Igreja de Nossa Senhora do Rosário. Era dessa praça que saíam os ônibus da Pássaro Marrom. Cartão-Postal do final da década de 1940. - Acervo: L.J.Giraud.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Naquela época para os santistas que iam à Capital, de trem da Estrada de Ferros Santos-Jundiaí (Em 1947 terminou a concessão da São Paulo Railway – SPR), ou de ônibus intermunicipal, que já estava tendo a preferência dos viajantes. Era uma verdadeira aventura, isto é os preparativos eram feitos com antecedência. Sem deixar de dizer, que para esse feito vestíamos nossas melhores roupas. – As pessoas de São Paulo

 

Eram chiques no seu trajar. Os homens usavam chapéus, ternos e gravatas. Já as paulistanas se trajavam com muito requinte. – A Barão de Itapetininga era a passarela da moda

 

As companhias que faziam o percurso Santos-São Paulo, e vice-versa, eram o Expresso Brasileiro (EBVL), Viação Cometa  (pontos de partidas na Praça Mauá) e a Pássaro Marron. Os veículos mais vistosos eram os do EBVL, que utilizavam os famosos coachs GM, seguidos pelos da Cometa, que também eram chamativos.Sendo os de aspecto mais simples, porém operantes, os da Pássaro Marrom, cujos motores ficavam na dianteira, ao lado do motorista.

 

O cartão-postal, mostra um ônibus intermunicpal da Pássaro Marrom,

no quilômetro 19 da famosa Via Anchieta, 1950. Acervo: L.J.Giraud.

 

Pois bem, meu pai, que era médico e precisava levar uns documentos pessoalmente no Conselho Regional de Medicina em São Paulo, ia de ônibus. Ao escutar isso, eu disse s ele que queria ir também. Após algumas oposições de minha mãe e de minha avó paterna, fui autorizado a ir à cidade dos bondes camarões, conhecidos por Gilda, apelido dado a esses bondes, em razão do filme com o mesmo nome, estrelado por Rita Hayworth e Glenn Ford, recentemente. Rita Hayworth foi uma das mais lindas estrelas de Hollywood. Era simplesmente linda.

 

Saímos de casa (Canal 5) por volta de umas 11,00 horas, e fomos para o Centro, no Ford Coupe -1946 de meu pai. A vaga para estacionar foi fácil de encontrar, que pela minha lembrança foi na Rua Frei Gaspar. Dali seguimos para a Praça Ruy Barbosa,  de onde saíam os ônibus da Pássaro Marrom( próximo ao Café Paulista).

 

Trecho da Via Anchieta, onde é visto o Parlour Coach GM, com

sua traseira corcunda - 1950.

 

Confesso que fiquei desapontado, pois pensei que iríamos no moderno Coach Parlour – GM, com motor marítimo traseiro, do Expresso Brasileiro, recém chegados dos Estados Unidos (tinha uma certa magia, luxo e bom gosto), e no entanto, fomos  num simples ônibus Chevrolet. O importante é que chegamos bem, mesmo com forte neblina, que nos acompanhou desde a raiz da Serra do Mar até próximo de São Bernardo.

 

Passamos pela Nazareth, do Estado,Senador Queirpós e outras vias até chegarmos no ponto final  na conhecida Praça Clóvis Bevilaqua, de onde seguimos para O Conselho Regional de Medicina, cujo atendimento foi rápido, e nos permitiu um passeio pelas ruas do Centro de São Paulo. Dentre elas: Rua Direita, Rua  São Bento, Barão de Itapetininga, que como disse era o máximo da elegância, e a famosa Av. São João, entre outras. 

 

Foi exatamente assim a São Paulo que o autor encontrou, ao

caminhar pelas ruas do Cento, na companhia de seu pai. - Uma cidade

muito movimentada, em relação a Santos - 1951. Acervo: L.J.Giraud.

 

O que mais me impressionou foi o grande numero de pessoas que transitavam por essas ruas, com seus sotaques bem diferente dos santistas (com forte influência italiana), seguido das grandes lojas como Mappin, a Casa São Nicolau, Lojas Garbo. O número de restaurantes e sapatarias, também chamava a tenção. O Centro de São Paulo era um deslumbre total.

 

Entretanto, o que fizeram meus olhos brilharem de alegria, foi ao avistar uma filial das Lojas Americanas (Santos já tinha), uma verdadeira dádiva para um menino de 06 anos, ávido por brinquedos. – Essa loja para mim era a campeã entre todas.

 

O Caminho do Mar, era a estrada que existia anteriormente à Via

Anchieta, 1935. Acervo: L.J.Giraud.

 

Na verdade contei  essa recordação para mostrar através de imagens de cartões-postais, algumas coisas da Via Anchieta, a inspiradora da famosa canção, As Curvas da Estrada de Santos, bem como uma São Paulo, que não volta mais.

 

Muito antes do surgimento da Via Anchieta, inaugurada em 1947, a Vila de Santos servia de ponto de passagem para o Planalto. A viagem era dificultosa, e feita através de atalhos repleto de perigos, como foi visto na minissérie da Tevê Globo, A Muralha, que mostrou a grande dificuldade para transpor a Serra do Mar nos séculos XVI e XVII.

 

No século XVII, um incremento nas exportações de açúcar de São Paulo. Pensou-se num caminho mais rápido para a subida da serra, e foi construída o  Caminho de Lorena, que foi abandonada no século XIX, com a com a chegada da Estrada de Ferro – São Paulo Railway, que tornou fácil, o transporte de cargas e pessoas entre as duas localidades.

 

Na descida da Serra, o Parlour Coach,

ônibus no qual o autor retornou da Capital

para Santos - 1951.  Acervo L.J.Giraud.

 

Ainda no século XVII, foi traçada uma nova estrada, a da Maioridade, que recebia veículos com cargas.O Caminho da Mar surgiu em 1917, por iniciativa de Rudge Ramos, mais tarde passou para o Estado. Em 1935, foi determinada a construção de outra estrada, para atender as necessidades da região e do porto, que veio ser a Via Anchieta. Essa estrada encurtou o caminho ente Santos e a Capital, além de desenvolver Santos, em todos os sentidos.

 

A Via Anchieta ficou pequena, e 28/06/1976, surgiu a moderna Rodovia dos Imigrantes, que atende bem o fluxo de veículos, entre as duas cidades. E o que diriam os homens de outrora, se tivessem tido conhecimento do Rodoanel Mario Covas, que irá interligar dez rodovias, eliminando o tráfego através da Cidade de São Paulo?

 

Em tempo: No retorno dessa viagem, meu pai atendeu ao meu pedido, e viemos a bordo do Parlou Coach – GM, para minha satisfação. Tem coisas que não esquecemos nunca.

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