Sempre tive grande admiração por três conhecidas praças de Santos, que são a Mauá, onde está situado o Paço Municipal; a Praça da Independência, com seu monumento que homenageia o santista mais ilustre, José Bonifácio, e seus irmãos; e a Praça Ruy Barbosa.
O Largo do Rosário, com os vendedores de jornais. Um deles segura um exemplar de A Tribuna. A foto é da década de 1920. Acervo: José Carlos Silvares.
Neste artigo vou me deter na simpática Praça Ruy Barbosa, local que me trás boas recordações. A primeira lembrança que tenho da praça data de um dia do ano de 1949, quando fui ao Centro com minha mãe, após termos descido do ônibus da linha 5, do Expresso Brasileiro (até 1955, o EBVL fazia linhas urbanas na Cidade), conhecido como Gostosão (ver artigo “O coach Gostosão”).
O ponto final desse coletivo, na época era na Praça Mauá. Dali fomos para a Praça Ruy Barbosa, para comprarmos alguns salgadinhos na Casa Hespéria, para o lanche vespertino de meu pai, que mantinha consultório médico no Edifício Novo Mundo (Riachuelo com Praça Mauá). Lembro daquele dia com nitidez, em razão de um fotógrafo de rua, fato comum naquele tempo, ter tirado uma fotografia nossa, na Rua General Câmara próximo da Ruy Barbosa.
Cartão- Postal da segunda década do século 20, mostrando
uma cena típica da época, tendo ao fundo a Igreja da Nossa
Senhora do Rosário. Ao seu lado o Cine Politeama Rio Branco.
Acervo: L.J.Giraud.
A conhecida praça, no passar do tempo, teve estabelecimentos comerciais que marcaram época na Cidade, como Café Java; Cine Politeama – Rio Branco; Casa Lido (brinquedos); Casa Alemã (móveis), que depois passou a ser a Galeria Paulista; Bar Metrópole, conhecido pelo seu delicioso chope; a sapataria Casa dos 40, conhecida também como Quá-Quá; Chocolates Kopenhagen; a sede do Santos Futebol Clube, mais precisamente na esquina com a Rua Visconde de São Leopoldo; Café Caravelas, lá era servido um dos melhores cafés de todos os tempos. Uma curiosidade: na parede do balcão, havia um grande espelho, onde as pessoas ao se olharem ficavam bonitas. Acreditem as feias ficavam com um belo semblante. Isso atraía uma boa freguesia, que aos saborearem um cafezinho ficavam mais confiantes. Onde estará esse espelho mágico?
Voltando à Ruy Barbosa, tinha na esquina da General Câmara, uma loja para pessoas elegantes, A Casas Teixeira, suas vitrines exibiam roupas de qualidade. Os chapéus eram muito usados pelos homens de todas as profissões, e ali estava a loja Chapéus Ramenzzoni; Camisaria Paramount; a Agência de Navegação Johnson Line (sueca). Dali, em épocas diferentes saiam os ônibus do Expresso Brasileiro, que mais tarde mudou para a Praça Mauá; o Expresso Pássaro Marrom e o Expresso Luxor.
O cartão-postal de 1908, mostra o prédio onde funcionou
a agência dos Correios, antes de mudar para a atual, na Rua
Cidade de Toledo. Nesse prédio funcionou a Casa dos 40, Café
Caravelas, Casa Teixeira, Chocolates Kopenhagen.
Acervo: L.J.Giraud.
Tudo isso sem deixar de dizer, da casa lotérica Zig-Zag, além do grande número de bilheteiros que vendiam bilhetes da Loteria Federal do Brasil, era uma profissão que rendia o sustento de várias famílias. Para os apostadores só existia, o turfe, bilhetes e jogo do bicho (foi sempre proibido). Portanto, não havia a enxurrada de jogos que hoje nos assola. A profissão de bilheteiro justificava. Atualmente são vistos somente dois desses profissionais. Em 1960 eram 85 catalogados. Até os anos 70 do século passado, quem precisasse de dinheiro emprestado, podia recorrer aos agiotas, que faziam ponto na praça. Com um detalhe: com as taxas de juros muito abaixo das oferecidas pelos bancos que aí estão.
O Largo do Rosário, ou melhor, a Praça do Rosário, diga-se de passagem abrigou o prédio dos correios, anterior ao atual, na Rua Cidade de Toledo, era o ponto de reunião dos antigos homens de negócio da Cidade. Formavam grupos no jardim, fazendo transações de pequenos e grandes vultos, aliás de todos os tipos, desde venda de casas aos empréstimos em dinheiro. O local, segundo o jornalista Oláo Rodrigues, no Dicionário de Curiosidades – 1973, era conhecido como “a Ilha dos Negócios”.
O cartão-postal do início da década de 1920, mostra o Café Java,
muito conhecido naquele tempo. Notem que a Igreja da Nossa Senhora
do Rosário se projetava para fora dos outros imóveis, sua fachada
foi recuada para fins de alinhamento da praça. Acervo: L.J.Giraud.
O mais antigo restaurante de Santos e da praça é o Café Paulista, fundado em 1911, o único que atravessou décadas e está no mesmo lugar (ver artigo “Café Paulista, Um Cantinho do Passado”).
Vale dizer que o solo onde está assentada a Praça Ruy Barbosa. antes era uma quadra com edificações, que foram demolidas para dar espaço a essa nobre praça.
A Praça Ruy Barbosa nas confluências das Rua Frei Gaspar e General Câmara. O prédio à esquerda deu lugar ao Edifício Itatiaia. Anos 20.
Acervo: L.J.Giraud.
O falecido professor Nelson Salasar Marques, homem de grandes conhecimentos, conta no livro “Imagens de Um Mundo Submerso”, Vol. 1, que até 1940 a Praça dos Andradas era a preferida dos santistas. Vamos a um trecho do livro:
“Mas a década de 1940 trouxe o declínio da Praça dos Andradas como atração noturna. Surge então o predomínio incontestável da Praça Ruy Barbosa, um predomínio que iria durar até o início da década de 50, quando a Via Anchieta já consolidada como a grande via do lazer iria despejar em Santos os paulistanos, transferindo definitivamente para a orla da praia, a vida noturna da Cidade. Mas a que se deveu essa ascensão da Praça Ruy Barbosa? A um conjunto de fatores que isoladamente pouco teria influído, mas no conjunto criaram um novo Centro em pólo de atração dentro da noite santista. O Rádio-Bar, lançando música na praça, o Café Caravelas, o Bilhar Aristocrata, o Termômetro Esportivo do Paisano (local que transmitia jogos de futebol, e exibia um painel dos jogos), e, em função disso o Cine Paramount, desbancam o do Cine Guarany. O Santos Futebol Clube começava a emergir do esquecimento a que fora relegado após o título de 1935, e suas novas vitórias iam trazendo grupos de torcedores que se postavam diante do Termômetro Esportivo do Paisano.”
De acordo com informações da Fundação Arquivo e Memória de Santos (FAMS), a Praça Rui Barbosa, antigo Largo do Rosário, é um dos locais, no Centro, de maior movimentação de pedestres. Nela está situado o monumento a Bartolomeu de Gusmão. O padre Voador, que inventou os balões aerostáticos, conseguindo “penetrar no mistério das Leis da Natureza: a conquista do ar”, segundo um de seus biógrafos.
Uma vista da praça por volta de 1950.
Acervo: L.J.Giraud.
A pedra fundamental da obra foi lançada a 12 de julho de 1922, sendo inaugurada no dia 7 de setembro do mesmo ano, como ato saliente das comemorações oficiais do centenário da Independência . De autoria do escultor italiano Lorenzo Massa, o conjunto forma um dos mais bonitos monumentos da Cidade e apresenta elementos com simbolismo próprio: as esfinges representam os mistérios da natureza e os mosaicos romanos mostram a passarola e o balão, contando a história da aviação.
Localizada em frente a Praça, está a Igreja da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário, que deu origem ao Largo do Rosário, sendo erguida a partir de 1757 pela Irmandade de Nossa Senhora dos Homens de Cor.
De estilo barroco, a igreja teve sua frente recuada para o alinhamento da Praça Rui Barbosa, sendo tal reforma iniciada em 1926 e a obra inaugurada em 12 de outubro de 1930.
A Praça na direção da Rua do Comércio. Notem que era moda os homens usarem chapéus,1933. Acervo: L.J.Giraud.
Quando demoliram a Antiga Matriz, em 1908, a Igreja do Rosário fez vez até a construção da Catedral de Santos, situada na Praça José Bonifácio
Após o sucesso da travessia do Atlântico, pelos aviadores portugueses Gago Coutinho e Sacadura Cabral, os mesmos visitaram Santos, no dia 10 de julho de 1922. onde ficaram por quatro dias. Entre as várias solenidades cumpridas pelos ilustres visitantes, foi o lançamento da pedra fundamental do Monumento a Bartolomeu de Gusmão, o Padre Voador. O monumento foi inaugurado no dia 7 de setembro de 1922, quando do Primeiro Centenário da Independência, há exatamente 86 anos. Muitos santistas de nascimento e coração que por ali passam diariamente desconhecem esse acontecimento.
Uma tomada do lado direito da praça, com edificações que
hoje não mais existem. Ali permaneceu só o prédio onde fica
a tradicional loja de artigos masculinos Ao Camiseiro. Nessa
quadra funcionou o Café Metrópole a Camisaria Paramount,
além de ter sido ponto do Expresso Luxor. Acervo: L.J.Giraud.
Rarissima imagem de 1933 , onde são vistos o antigo Centro Lotérico,
a Casa Hespéria (mais tarde mudou-se para o Edifício Leôncio Peres) e o ônibus que fazia a linha do Boqueirçao. Além do prédio onde funcionou
a Casa Alemã, hoje ali funciona a agência marítima do Nedlloyd.
Acervo: L.J.Giraud.
Cartão de visitas do tradicinal Café Paulista, distribuído à sua
clientela por volta de 1950. Acervo: L.J.Giraud.