O navio da esperança. Assim pode ser visto o Kasato Maru (leia sobre a história do navio), que atracou em Santos em 18 de junho de 1908, há 100 anos, com os primeiros 781 imigrantes japoneses, de 165 famílias. Ao longo dos anos e décadas seguintes à escala pioneira do Kasato Maru, numerosas embarcações do Japão trouxeram cerca de 260 mil emigrantes. Hoje a comunidade japonesa e descendentes (já na sexta geração) somam 1 milhão 500 mil. O Kasato Maru foi o mais marcante por ser o primeiro, mas outros transatlânticos também escreveram sua história nas páginas do fenômeno da imigração.
Desenho do pioneiro Kasato Maru atracado no cais do armazém 14
da Companhia Docas de Santos, em 18 de junho de 1908. Imagem
utilizada em anúncio da indústria Sakura
Para contar um pouco dos navios que trouxeram imigrantes japoneses, vou transcrever um artigo do amigo e jornalista Armando Akio, publicado em A Tribuna, em 18 de junho de 1998, uma quinta-feira. No texto estavam pesquisas minhas sobre esse acontecimento, que se juntaram às do jornalista, que atuava havia mais de 20 anos na cobertura de assuntos relacionados ao Porto de Santos. A experiência de Akio contribuiu para enriquecer o texto, que se segue:
Carlos Botelho, secretário de Agricultura do Estado de São Paulo, e Ryu Misuno, diretor da Companhia Japonesa de Imigração Kokoku, assinaram em 6 de novembro de 1907 o contrato que permitiu a vinda do Kasato Maru ao Brasil, mais especificamente a Santos, onde atracou no cais no Armazém 14, em 18 de junho de 1908.
Haruna Maru, da Nippon Yusen Kaisha Line, foi outro que conduziu japoneses e tinha capacidade de carga de 10.421 toneladas
Os imigrantes do Kasato Maru seguiram no mesmo dia para São Paulo, de onde foram encaminhados para as fazendas de café da Alta Sorocabana.
Épocas críticas para a economia de um país são fundamentais para determinar o fenômeno da imigração, a saída de cidadãos de uma nação, à procura de melhores oportunidades em terras estrangeiras e estranhas. Com os japoneses não foi diferente.
Rompendo o isolamento
O imperador japonês Meiji , após romper séculos de isolamento do país com o ocidente, detonou profundas mudanças administrativas, a partir de 1886.
Cartão-postal festivo do navio Seattle Maru, editado
nos anos 20 do século passado - Acervo - L.J. Giraud
Uma das transformações foi implementar uma reforma agrária, que deu aos camponeses direito ao acesso a terras, reformulando a legislação do imposto territorial rural. Outra media adotada provocou uma situação crítica para a economia interna do Japão.
A imigração era proibida pelo governo, que teve de rever a posição e aceitá-la, como necessária para reduzir as tensões sociais, agravadas pelo aumento da população.
Cartão-postal do Buenos Aires Maru, mostrando um de seus salões e
ao lado um Toril, que significa Portal dos Deuses - Acervo: L. J. Giraud
No Brasil, o país onde o sol se põe, a situação também não era das melhores, no final do Século 19 e início do Século 20. A Lei Áurea, de 13 de maio de 1888, que libertou os escravos, provocou séria crise agrícola.
Necessidade de mão-de-obra
Tanto que, em 5 de outubro de 1892, o presidente da florescente República, Floriano Peixoto, sancionou a Lei 97, que surgiu em decorrência das pressões de fazendeiros de café, que precisavam de mão-de-obra. A lei era o ponto de partida para permitir a vinda de imigrantes asiáticos.
Como conseqüência, em 5 de novembro de 1895, foi assinado o tratado de amizade, comércio e navegação entre o Brasil e o Japão, que abria portas das terras brasileiras aos japoneses.
Cabine imperial de luxo Nikko do navio Brasil Maru, que era
composta de salão, dormitório, varanda e banho. Acervo - L.J. Giraud
Superados numerosos obstáculos políticos para entrada dos primeiros imigrantes, ocorreu o início de uma nova era entre brasileiros e japoneses, com a vinda do Kasato Maru.
A segunda leva
No dia 28 de junho de 1910, chegou a Santos a segunda remessa de imigrantes japoneses: 906 pessoas, pelo vapor Royojun Maru. Elas seguiram para as fazendas da Alta Mogiana.
O Kasato Maru partiu para o Brasil uma segunda vez, em dezembro de 1916. Aportando em 1917, mas como cargueiro a serviço a Osaka Sosen Kaisha (OSK Line). Quando retornou, veio para fazer pesquisa de fretes com o objetivo de se instalar uma linha marítima comercial entre os dois países.
Anos mais tarde, em 1920, a OSK Line começou a receber subsídios do governo japonês para operar na linha para América do Sul. Na época, a armadora tinha 11 navios mistos (de cargas e de passageiros), que continuaram no tráfego até 1935, quando a companhia adquiriu novas embarcações.
Cartão artístico do navio Bokuyo Maru da N.Y.K. Line.
Acervo - L.J. Giraud
A frota da OSK Lines contou com navios como Buenos Aires Maru, Montevideo Maru, Santos Maru e Manila Maru.
Restabelecimento
Outro navio que marcou uma nova etapa entre os imigrantes japoneses foi o holandês Ruys, que restabeleceu o fluxo de entrada de cidadãos japoneses a Santos, que estava suspenso desde o início da Segunda Guerra Mundial.
O Ruys trouxe 112 pessoas, de 22 famílias que se estabeleceram na colônia agrícola federal de Dourados, em Mato Grosso, conforme noticiou A Tribuna, na edição de 9 de julho de 1953.
Foto das operárias da Fiação de Seda Bratac, de Bastos,
clicadas em 1960 - Acervo - FSB
Após a Segunda Guerra Mundial, surgiram em 1954 dois navios para passageiros, imigrantes e cargas, o Brasil Maru e o Argentina Maru, que partiram de Kobe, com escalas no Rio de Janeiro, Santos e Buenos Aires.
Uuma grande lembrança
Na passagem do 80º aniversário da imigração japonesa, o cargueiro Lloyd Gênova, da hoje extinta Companhia de Navegação Lloyd Brasileiro, teve o nome do casco alterado para Kasato Maru, com o objetivo de encenar a chegada dos primeiros 781 japoneses ao Brasil. Foi uma das mais belas celebrações vistas na cidade de Santos.
O Argentina Maru, gêmeo do Brasil Maru foi um dos navios
japoneses mais belos que vieram a Santos - Acervo - L.J. Giraud
Na comemoração do 90º aniversário da imigração japonesa, em 1998, o transatlântico Nippon Maru, da Mitsui Sosen Kaisha (fusão da Mitsui com a OSK), veio a Santos para comemorar a data. Não trazia imigrantes, mas sim 400 turistas, que faziam um cruzeiro de volta ao mundo.
Este artigo homenageia o Centenário da Imigração Japonesa, bem como tem o intuito de lembrar heróicos imigrantes que deixaram suas terras rumo ao desconhecido, em busca de um ideal.
Comemoração dos 80 anos da imigração japonesa, o navio
Lloyd Genova teve seu nome alterado para Kasato Maru para
a celebração. Arquivo: L.J Giraud
Assim, vamos lembrar Akira Taniguchi, Akiko Taniguchi, Takashi Taniguchi, Shizuko Taniguchi, Tsuneko Taniguchi, que deixaram Kobe, no navio Kamakura Maru, no dia 2 de agosto de 1927 e chegaram a Santos em 2 de outubro 1927.
Vamos lembrar também de Takashi Sakamoto, que veio no Manila Maru, chegando em 27 de julho de 1932; Tiyo Nakabayashi, que veio no Montevideo Maru, em 28 de fevereiro de 1937; Cho Otake, no Montevideo Maru, em 1.º de setembro de 1927; e Moyo Yonekub, que desceu do Sanuki Maru em 26 de outubro de 1918. Parabéns para todos os Nikkeis do Brasil, da primeira a 6º geração.
Fechando com chave de ouro, Tati Miura, filha
do casal Jorge e Regina Miura, representante da
3ª geração dessa família. Muitas famílias já estão
na 6ª geração. Acervo: Regina Miura
Uma saudação especial ao professor José Adelson de Souza, que leciona Língua Japonesa na Unisantos e na Unisanta e que possui certificado da Associação Internacional de Educação Japonesa. Ele é santista e grande admirador do Japão e de sua gente.
Banzai!