Durante pesquisa no arquivo do jornal A Tribuna de Santos, me deparei com um anúncio de 25 de setembro de 1938, da armadora American Republic Line, de página inteira, que informava o novo serviço de navios de passageiros entre as Américas pelos luxuosos navios Brazil, Uruguay e Argentina.
Anúncio publicado em A Tribuna do domingo 25/09/1938, informando
da inauguração da nova linha entre Nova York (Estados Unidos), Brasil
e Argentina, da armadora American Republic Line, com os navios
Brazil, Uruguay e Argentina. Mais tarde, esses navios passaram
para a Moore-McCormack Line. O primeiro navio a inaugurar essa linha
foi o Brazil.
Esses navios foram representados pela agência Moore McCormack (Navegação) S/A. O texto, com a grafia original, segue abaixo.
Para Breve
Sahidas quinzenas de Nova York, a partir de 8 de Outubro – estabelecendo uma linha de luxo entre os Estados Unidos e as republicas irmãs da costa oriental da América do Sul.
Dentro de poucos dias, os brasileiros, uruguayos, argentinos e norte-americanos terão um novo incentivo para satisfazer o seu desejo de se visitarem reciprocamente. É assim que, partindo de Nova York a 8 de Outubro, o transatlântico “Brasil”, da FROTA DA BÔA VIZINHANÇA, vai inaugurar o mais luxuoso serviço de viagens regulares para a costa oriental da América do Sul.
O transatlântico Brazil quando transpunha na manhã de
22/10/1938 a barra de Santos sob o comando do capitão Harry
Sadier, ex-comandante do Southern Cross. O transatlântico
atracou no Armazém 17 da Companhia Docas de Santos, e deixou
o porto às 22 horas, com destino a Montevidéu e Buenos Aires.
Reprodução: Jornal A Tribuna de 23/10/1938
E cada duas semanas os modernos navios “Brasil”, “Uruguay” e “Argentina” farão pontualmente escalas nos portos do Rio de Janeiro, Santos, Montevidéo e Buenos Aires, collocando Santos a 14 dias dos Estados Unidos, 14 dias maravilhosos de travessia.
Calcule, pois, as deliciosas férias que lhe offerecem esses sumptuosos navios. Quer passar alguns dias repousantes em alto mar? Attrahentes tombadilhos, elegantes salões, e uma biblioteca em inglez, portuguez e castelhano – lhe asseguram um ambiente ideal para a sua tranquillidade.
E para os seus momentos de expansão, encontrará movimentados tombadilhos de esporte, um gymnasium, piscinas ao ar livre, um convés-Lido e uma varanda-café – e, nem seria necessário dizer, danças ao som feiticeiro de musicas fascinantes.
Para o seu conforto, todos os camarotes dão para fora, dispõem de camas espaçosas, água corrente quente e fria, ventilação natural e exhaustores de ar.
Na foto reproduzida de A Tribuna, o comandante do Brasil
ao lado do embaixador dos Estados Unidos e do contra-almirante
Cone da Comissão Marítima dos Estados Unidos – 1938.
A maior parte dos camarotes de primeira classe é provida de banheiros próprios. Seus dias serão admiráveis. Suas refeições serão servidas por uma requintada cosinha. E sempre à sua disposição encontrará uma tripulação diligente e um pessoal cortez, adivinhando os seus gostos e desejos.
Resolva, desde já, figurar entre os que primeiro visitarão os Estados Unidos na FROTA DA BÔA VIZINHANÇA, ponto em prática o sábio conselho: “Visite as Américas primeiro”.
Uma viagem de Santos a Nova York, ida e volta, custa somente $470.00 = Rs. 8:319$000 em camarotes de primeira, (preços fora da temporada) e $370.00 = Rs. 6:549$000 na classe de turismo. Para mais informações, dirigir-se à American Republics Line, MOORE McCORMACK (NAVEGAÇÃO) S.A., Agentes em Santos.
Essa linha marítima entre as Américas foi um grande sucesso, tanto que esses serviços vigoraram por 31 anos, o que tornou a Moore McCormack a mais famosa companhia estadunidense. Em 1958, o Brazil e o Argentina foram substituídos pelos novos navios que receberam, os mesmos nomes Brasil (agora com “s”) e Argentina. O antigo Uruguay deixou de navegar em 1954.
Belíssima imagem do Brazil, com as cores da Moore-McCormack
Line, passando pelo Pão de Açúcar, no Rio de Janeiro, reproduzida
do livro US Merchant Ships, de 1950 Reprodução do livro integrante
do Acervo L. J. Giraud
O pesquisador e historiador, Sergio Ribeiro, gentilmente me fez o envio de informações de grande valia que, com toda a sinceridade eu desconhecia, e aqui repasso aos leitores.
“Ao contrário do que muitos afirmam, a grande crise econômica foi de fato entre 1937/1938, quando diversas empresas quebraram, inclusive várias automobilísticas.
A companhia de navegação Munson Steamship Line, desde os anos 20, fazia a ligação entre os Estados Unidos e a América do Sul, com quatro navios: American Legion, Southern Cross, Pan American e o Western World. A situação dos Estados Unidos se agravou e ela faliu. A United States Maritime Comission foi obrigada a assumir os navios para que a ligação não fosse interrompida. A preocupação era também dos países latinos, que tinham receio da interrupção das comunicações marítimas com os Estados Unidos.
Cabe ressaltar que a Munson, era a única empresa norte-americana, a transportar passageiros e carga regularmente entre as Américas.
O transatlântico American Legion, aqui convertido como transporte
de tropas durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945) que
anteriormente fazia parte da frota da Munson Steamship Line que
navegava juntamente com o Southern Cross, Pan American e o
Western World. Com a falência da Munson Line, entrou no cenário
a American Republics Line / Moore-McCormack Line.
Foto acervo: Julio Augusto Rocha Paes
O governo dos Estados Unidos, que já acompanhava a crise da Munson, resolveu adquirir pela Comissão Marítima, os navios da Panamá Pacific Line que estavam parados desde que essa empresa também entrou em crise, com a depressão que assolou os norte-americanos em 1937/38. Os navios foram a toque de caixa, reformados e rebatizados com os nomes dos três países sul-americanos que escalariam: S.S. Brasil (Virginia), S.S. Argentina (Pennsylvania) e S.S. Uruguay (Califórnia). Esses três navios formaram a chamada The Good Neighbor Fleet.
A proprietária dos navios, a Comissão Marítima dos Estados Unidos, criou a American Republic Line (no singular), uma empresa de navegação, para ficar legalmente com as embarcações, mas sendo delegada a Moore-McCormack Lines, Inc., a administração, pois tinha a experiência necessária no transporte marítimo, inclusive para a América Latina, com seus cargueiros, além de possuir escritórios de representação nos portos de escala. Posteriormente essa semana foi absorvida, com a devida autorização, pela própria Moore-McCormack, por questões de marketing.
Em 1958 chegaram os novos navios Brasil (com “s”) e Argentina.
Deslocavam 22.690 tons e tinham a velocidade de 23 nós, possuíam
duas piscinas e ar-condicionado em todas as dependências. Em 1969
a Moore-McCormack, encerrou a linha dos transatlânticos devido à
queda do número de passageiros. Foto: Internet
A Moore-McCormack recebia subsídios do governo norte-americano para realizar as viagens, logo ela nunca teria (ou teve) prejuízo na sua empreitada, e isso ocorreu até 1969”.
A primeira viagem foi do S.S. Brasil, que partiu de Nova York em 8 de outubro de 1938, chegou ao Rio de Janeiro em 20 de outubro, e saiu no dia seguinte. Atracou em Santos em 22, Montevidéu, 25, Buenos Aires 26 a 29, retornou a Santos em 1 de novembro, partindo no dia seguinte. No Rio 03; Trindad 10 e 11 e chegando de retorno a Nova York em 15 de novembro.
Quando da chegada do S.S. Brasil ao Rio (em 20 de outubro), foi oferecido um almoço às autoridades brasileiras a bordo do navio. Compareceu o presidente Getúlio Vargas, sua esposa dona Darcy, o ministro das Relações Exteriores, Oswaldo Aranha, além de outras autoridades brasileiras e americanas.
Fechando com chave de honra, o S/S Argentina, ex-Pennsylvania
(atracado no Porto do Rio de Janeiro), foi um dos mais conhecidos
navios que passaram pelo Brasil – década de 1950. Reprodução: Internet
O segundo navio foi o S.S. Uruguay – saída de NY em 22 de outubro de 1938, em Santos em 5 de novembro; e o S.S. Argentina o último, partiu de NY em 5 de novembro de 1938, em 19.
Nunca estive a bordo dos navios que inauguraram a Frota da Boa Vizinhança, mas conheci alguns que tiveram o privilégio de viajar nesses transatlânticos. No momento, lembro de Gerson da Costa Fonseca e sua esposa Arlete, como também o advogado santista Carlos Maia e o advogado carioca Kepler Alves Borges.
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