No artigo anterior foi mostrada a oportunidade perdida pelo Brasil em se tornar uma nação proprietária de navios de cruzeiros. Na matéria desta semana, vamos comprovar que poderíamos estar presentes neste setor do turismo e, para isso, vamos recordar um cruzeiro feito a bordo do navio de passageiros Almirante Alexandrino do Lloyd Brasileiro, no longínquo ano de 1950, conforme informações recebidas do amigo Julio Augusto Rocha Paes, que por sua vez, as recebeu do já falecido agente de viagem, Valdomiro Villaça Filho, com quem mantinha grande amizade.
O agente de viagem Valdomiro Villaça Filho (já falecido), foi um
dos muitos brasileiros que fizeram cruzeiros pelo Brasil em
navios do Lloyd Brasileiro, como o realizado em 1950 a bordo do
Almirante Alexandrino, aqui visto entrando em Santos no final
dos anos 40. Acervo: L. J. Giraud
O Famoso Almirante Alexandrino
Um cruzeiro marítimo é para sempre. Mesmo depois de meio século, as imagens permanecem na memória de quem já experimentou navegar em um transatlântico. Ainda mais se a viagem aconteceu na década de 50, época de ouro dos navios de passageiros, quando os grandes empresários dividiam espaço com políticos, artistas e outras personalidades.
O Almirante Alexandrino, um navio do Lloyd Brasileiro, que na metade do século freqüentava o Porto de Santos, fazia parte de uma série de navios alemães, apreendidos pelo Brasil em 1917, durante a Primeira Guerra Mundial. O seu nome anterior era Cap Roca e navegou sob a bandeira brasileira até meados da década de 60, quando as grandes excursões marítimas deram lugar, definitivamente, às viagens aéreas.
O Almirante Alexandrino, anteriormente foi o alemão Cap Roca,
O agente de viagem Valdomiro Villaça Filho, foi um dos muitos brasileiros que conheceram bem o Almirante Alexandrino. A sua primeira viagem, de Santos a Manaus, quando tinha 12 anos de idade, demorou nada menos do que 60 dias.
Ele recorda que as excursões da década de 50 eram bem diferentes dos cruzeiros de hoje, principalmente quanto à duração.
Naquela época, a viagem de Santos a Manaus chegava a demorar 60 dias, porque o navio fazia escalas em todos os principais portos da costa brasileira. Hoje, os cruzeiros demoram no máximo dez dias, e em regra, vão apenas de Santos a Buenos Aires (Argentina) ou de Santos a Salvador (Bahia).
A bordo do Raul Soares foram feitas muitas excursões organizadas
Nos últimos anos, justamente devido à falta de tempo dos passageiros, as operadoras também passaram a realizar minicruzeiros, com duração de três ou quatro dias, indo normalmente até Itajaí ou Florianópolis (Santa Catarina), ou até Búzios, no litoral norte fluminense. Acho que, embora o Lloyd Brasileiro possuísse vários transatlânticos em sua frota, tanto a companhia estatal como outras famosas armadoras estrangeiras, não sabiam explorar essa atividade, naquela época.
Seguindo uma tradição, que vinha do início do século e continua até hoje, de batizar suas unidades com nomes de cabos, rios e montes, o navio construído em 1900 recebeu o nome de Cap Roca. Ele transportava 80 passageiros em primeira classe e cerca de 500 na terceira.
O D. Pedro II, que fazia par com o D. Pedro I, também era
utilizado para excursões pela costa do País. Aqui vemos o navio
atracado no porto de Recife. – Década de 1930. Acervo: Edson Lucas
O transatlântico media 125,32 metros de comprimento; 14,72 de largura (boca), e 5,43 de calado; viajava a 12 nós (22,22 quilômetros por hora) e tinha arqueação bruta de 5.732 toneladas. Logo após a sua apreensão em território brasileiro, o navio recebeu o nome de Itu. Mais tarde, quando a posse se tornou definitiva, por indenização de guerra, foi rebatizado Almirante Alexandrino.
O mundo naquele tempo era uma festa, lembra Valdomiro Villaça. Em cada porto, havia recepções das autoridades e da própria população, orgulhosa de ver um transatlântico brasileiro, tripulado por brasileiros e com passageiros brasileiros passeando pelas costas do Brasil. Pois, no início da década de 50 o transporte de passageiros já era dominado por navios estrangeiros.
Por exemplo, não havia ar condicionado e, no Norte e Nordeste, o calor era tão insuportável que os passageiros faziam canudos de cartolina e os instalavam nas vigias (janelas), contra o vento, para aumentar a ventilação dos camarotes.
Às vezes, a viagem se tornava tão difícil que a escala se transformava em um oásis. O navio parava até 10 vezes antes de chegar a Manaus.
Foto dos alegres participantes,
Já o corretor de imóveis Julio Costa Paes, que morou em Santos trabalhando na importação de carvão, é um apaixonado por pintura e modelismo. E grande parte de sua arte está imortalizada em veleiros e navios.
Mas ele também é um colecionador de relíquias. Tem postais raros e um arsenal de histórias, como a de Villaça, retratando o esplendor da época, em que o transporte de passageiros era parcela muito importante do transporte marítimo.
Segundo Paes, os encontros informais, os seminários, feiras e leilões dos quais participa também servem para garimpar histórias.
Foto dos oficiais do Almirante Alexandrino, tirada durante a
E não existe nada mais obsessivo do que pesquisar os acontecimentos por intermédio de antigos álbuns fotográficos.
Colecioná-los, tem o seu lado positivo, entre eles o aumento do conhecimento e o abrir de um grande leque de amizades entre colecionadores, pesquisadores, historiadores e amantes das imagens que ficam congeladas no tempo.
No dia 27 de junho de 1900, o navio alemão Cap Roca, que viria a terminar os seus dias como Almirante Alexandrino, no Rio de Janeiro, saía do Porto de Hamburgo (Alemanha), em viagem inaugural para o Brasil.
O comandante e passageiros festejam o carnaval de 1950. No
O transatlântico pertencia à poderosa armadora Hamburg-Sud, que naquele ano colocou três navios semelhantes – Cap Verde, Cap Frio e Cap Roca – no serviço regular entre os países da Europa e os da América do Sul.
Esses navios reservaram grandes espaços no transporte de pessoas , tanto para atender aos mais afortunados, que descobriram os prazeres das viagens marítimas, mas também para atender à crescente demanda de imigrantes europeus, com destino à América.
Durante a Primeira Guerra Mundial, assim que o Brasil entrou no conflito, declarando guerra à Alemanha, o Cap Roca foi aprisionado no Porto do Rio de Janeiro, passando a fazer parte das forças aliadas, com o nome de Itu.
Fotografia do último navio de passageiros do Lloyd Brasileiro a passar
Mais tarde, em 1926, bem depois de terminado o conflito, o navio foi transferido para a frota do Lloyd Brasileiro e rebatizado de Almirante Alexandrino, sob o qual navegou até meados da década de 60.
Em 1966, finalmente foi desativado e desmontado por um estaleiro do Rio