Prezados leitores,
Nesta coluna, o advogado Rafael Pereira Cardoso, pós-graduado em Direito Marítimo e Portuário pela Universidade Católica de Santos (UniSantos), analisa o BL eletrônico, traçando significativas considerações a respeito do tema que ganha ainda mais relevância na iminência de aprovação dos textos das Regras de Rotterdam.
Saudações maritimistas,
Eliane Octaviano
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B. L. ELETRÔNICO - O CONHECIMENTO DE EMBARQUE MARÍTIMO NA MODALIDADE ELETRÔNICA
por RAFAEL PEREIRA CARDOSO, pós-graduado em Direito Marítimo
e Portuário pela UniSantos [1]. E-mail: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.
INTRODUÇÃO
A rápida evolução da humanidade, notadamente a partir do século XX, que nos foi imposto um mundo globalizado com a implantação de novas tecnologias, muitas delas essenciais para o comércio internacional, faz que seja necessário um estudo mais aprofundado sobre os documentos eletrônicos.
O BL eletrônico, vem se mostrando uma alternativa segura, moderna, rápida e econômica para a evolução natural dos meios de transação de mercadorias.
Não se deve negar, que se trata de um caminho sem volta. A utilização do dinheiro eletrônico, os contratos eletrônicos, certificações digitais, são tecnologias que aos poucos vão ganhando embasamento jurídico para sua legalidade, e, futuramente farão parte do cotidiano de todos.
Tudo isto, fruto de um mundo globalizado, que requer uma constante e acelerada evolução para dinamizar o atual modelo econômico mundial. Assim, uma melhor análise sobre as mudanças e evolução nos procedimentos que norteiam o transporte marítimo se faz necessário. No assunto em tela, o BL eletrônico.
O conhecimento de embarque eletrônico, sem dúvida nenhuma vai substituir o atual formato, confeccionado em papel, de forma gradativa até que toda a negociação e documentação necessária para o comércio internacional será realizada de forma eletrônica. É o que se espera.
OS DOCUMENTOS ELETRÔNICOS
Os documentos digitais, no intuito de se zelar pela confiabilidade e segurança das informações contidas no mesmo, podem ser criptografados.
A criptografia nada mais é que um processo que codifica a informação de tal maneira que somente a pessoa (ou o computador) com a chave pode decodificá-la.
A criptografia não é uma tecnologia recente, recente é a sua aplicação em computadores. A existência de mensagens codificadas foram encontradas desde a época do império romano, e foi muito utilizada por militares durante a primeira e segunda guerras mundiais.
Nos dias atuais, a criptografia é massivamente utilizada em computadores de forma digital.
O BL ELETRONICO
O BL eletrônico, ou conhecimento de embarque na modalidade eletrônica, nada mais é do que um arquivo digital, codificado, que contém as mesmas características e informações do BL convencional, de papel. Tem a mesma função e a mesma validade. Mudando somente sua forma de confecção, a forma de armazenamento e a forma de transporte.
Sua grande vantagem além da segurança de ser um arquivo codificado e criptografado é a agilidade e facilidade para a sua confecção, reduzindo a chance de erros, a economia de papel, de tinta, de espaço e ganha com sobras do papel no quesito durabilidade.
Ao contrário que muitos pensam o BL eletrônico não é impresso em nenhum momento. Se fosse, não seria eletrônico. Ele é sim, um arquivo digital, que pode ser enviado por sistemas ou email. É armazenado em dispositivos de armazenamento como CD´s, disquetes, Pen Drives e Hard Disk´s, assim como um arquivo de texto comum.
A LEI MODELO DA UNCITRAL
O Grupo de Trabalho em Comércio Eletrônico Eletrônico da UNCITRAL, já vislumbrando o crescimento do comércio eletrônico e a falta de normas para regulamentar este tipo de comércio, elaborou uma lei modelo que visa dar suporte legal aos documentos eletrônicos, tendo em vista o grande crescimento do comércio eletrônico no mundo.
A Lei Modelo da UNCITRAL foi criada em 1996 pelo referido Grupo. Em simples palavras, ela defende o princípio da equivalência funcional, ou seja: não deve haver nenhuma discriminação sobre um documento eletrônico se ele cumpre exatamente as mesmas funções de um documento de papel, o referido assunto é tratado com especial atenção nos artigos 16 e 17 da Lei Modelo.
Tem como objetivo facilitar e incentivar o comércio eletrônico elaborando regras que tem como objetivo ser internacionalmente aceitas e assim ser usadas pelas nações para que criem uma legislação específica para regulamentar a legalidade do uso de meios eletrônicos de comunicação e transação dentro do comércio internacional.
A Lei Modelo também provê todas as diretrizes aos comerciantes individuais, na preparação de seus acordos contratuais, bem age com o fim específico de remover algumas barreiras legais do comércio eletrônico.
O PROJETO BOLERO - EUROPA
O projeto BOLERO foi criado em Londres no ano de 1999 e é um investimento conjunto de empresas de logística, navegação e agentes financeiros.
O projeto que se encontra em fase de implantação e testes, visa desenvolver e transmitir documentos relativos às exportações por meio eletrônico.
O Sistema funciona com base numa plataforma de infra-estrutura, onde os usuários enviam informações de transações para os demais usuários do sistema, sendo todas as informações enviadas transmitidas de maneira incorrupta e confidencial, todas dentro do sistema.
Com a implantação deste projeto, vislumbra-se uma grande melhoria na eficiência operacional e principalmente nas reduções no capital de funcionamento.
Em simples palavras, o projeto Bolero, foi elaborado na intenção de retirar o papel do processo que envolve as transações de comércio internacional.
Espera-se que brevemente, grande parte da Europa já esteja utilizando a plataforma do Projeto Bolero.
O DOCUMENTO ELETRÔNICO NO BRASIL
No que se diz respeito à eficácia legal dos documentos eletrônicos no Brasil, temos que fundamentalmente nos referir ao ICP-Brasil, criado pela Medida Provisória 2.200/2001.
A medida Provisória 2.200/01 instituiu a ICP-Brasil (Infra Estrutura de Chaves Públicas Brasileira), assim veio a regulamentar a utilização da Certificação Digital no Brasil.
Em seu artigo 10, §1, consta: “as declarações constantes dos documentos em forma eletrônica produzidos com a utilização de certificação disponibilizados pela ICP-Brasil presumem-se verdadeiros em relação aos signatários”.
Ela regulamenta também os documentos eletrônicos criados sem a ferramenta da certificação digital, como se pode observar em seu artigo 10º, §2º:
“Não obsta a utilização de outro meio de comprovação da autoria e integridade de documentos em forma eletrônica, inclusive os que utilizem certificados não emitidos pela ICP-Brasil, desde que admitido pelas partes como válido ou aceito pela pessoa a quem for oposto o documento”
Interessante salientar, que todos os documentos eletrônicos não certificados, mas que sigam os parâmetros legais, assim como nos documentos em papel, gozam de veracidade e validade, aplicando-se o Princípio da Equivalência Funcional.
Porém não há como negar que no aspecto da segurança e confiabilidade, ou seja, a veracidade do seu conteúdo se enfraquece, dando margem para discussões futuras sobre sua validade.
Questão interessante, é a indagação do por que a assinatura digital ou certificação digital, ainda é tão pouco usada no Brasil e no mundo?
Isto se deve ao fato da falta de uma norma uniforme para dar diretrizes ao uso dos diferentes softwares de diferentes desenvolvedores de certificação digital. Ou seja, existem diversos softwares certificadores, porém nem todos são aceitos pelas empresas, por quase sempre adotarem somente um padrão.
Sendo assim, para fechar contrato com empresas, o comerciante teria de comprar diferentes softwares para se ajustar ao padrão utilizado por cada empresa.
Por fim, vale fazer referência ao projeto de Lei 4906/2001, que é um projeto concebido com base em todas as diretrizes da Lei Modelo e que ao ser aprovada trará uma grande evolução no comércio digital no Brasil.
CONCLUSÃO
O mundo trilha a passos largos para um caminho sem volta, em direção ao mundo digital.
A comunicação instantânea já faz parte dos lares no mundo inteiro. A informação do outro lado do mundo que à 50 anos atrás demorava semanas para chegar aqui, hoje chega em segundos por cabos submarinos de fibra óptica ou por satélites de alta tecnologia para a transmissão de dados e voz.
Um mundo globalizado exige celeridade e um aumento cada vez maior do consumo mundial. E consumo mundial envolve notadamente as transações internacionais de mercadorias.
Desta forma, mostra-se que tudo o que norteia o transporte de cargas por via marítima deve ser ágil, seguro e econômico. É assim que se enquadra o BL eletrônico, é um instrumento digitalizado para a celeridade das negociações e o aumento do consumo e consequentemente do comércio.
A facilidade em sua confecção e a agilidade que ele provê nos dá uma grande expectativa de que daqui mais alguns anos, não só o BL, mas toda a negociação e contratos poderão sim, ser feitos por via eletrônica seguramente.
[1] A opinião esposada no presente artigo não reflete necessariamente a opinião da colunista e é de inteira responsabilidade do (s) autor (es).