Sexta, 26 Abril 2024

Gosto de ver o otimismo do governo. Não vai apenas construir mais um aeroporto, faz a coisa por atacado, logo 800 de uma vez. Para que cada cidade com até 100 mil habitantes tenha um aeroporto. Fico até imaginando Borá/SP, com 805 habitantes (Censo 2010) ou Serra da Saudade/MG, com 810 habitantes. Em duas viagens, um Boeing 747/8 leva todos os habitantes de cada uma dessas cidades para outro lugar, para termos uma ideia.

Fico pensando, mesmo em se falando de aeroportos de porte médio: a cidade terá um aeroporto ou o aeroporto é que terá uma cidade? Estranha a pergunta? Verifique o número de funcionários do Aeroporto de Congonhas, que pode ser chamado de "porte médio": 7.539 credenciados, 323 empregados Infraero, 1.045 empregados terceirizados, 16 mil empregos diretos, 48 mil empregos indiretos. Compare também o tamanho desse aeroporto (1.647 km²) com a área do município de Poá/SP (17 km²). Só o terminal de passageiros (64,5 km²) abrigaria confortavelmente três municípios como este, sobrando espaço. Ok, Poá não conta, tem 106 mil habitantes e o plano da presidente é só para cidades até 100 mil...

Que venham os aeroportos, não é este o problema (melhor: deveria ser solução!). E. sim, o fato de que no Brasil se começa a casa pelo telhado. Como serão administrados esses 800 novos aeroportos, se a Infraero não se entende com os que estão sob seu controle, as companhias aéreas se misturam estranhamente com as de ônibus e com os políticos regionais, as agências reguladoras são politicamente reguladas e nada disso se articula sob um ministério dos transportes, ou com um mínimo plano de integração logística? Quantos são mesmo os irmãos Vieira, os "bebês" da Rosemary? Teremos Vieiras suficientes para todos os novos cargos?

Li atentamente o anúncio oficial dos 800 aeroportos. Falou-se em turismo, interiorização, até de um avião ferroviário (trem-bala), mas nem uma palavra sobre cargas, integração, matriz de transportes, logística, multimodalismo.

Serão beneficiados apenas os quatro grandes grupos de transportes - que hoje vencem qualquer concorrência para linhas de ônibus em suas respectivas áreas, apenas alternando o nome das empresas participantes (e a população que se dane, sujeita ao péssimo transporte público oferecido e à "fiscalização" de "entidades" como EMTU) -, ou haverá um fomento real na competitividade do setor?

Otimismo é ótimo, quando bem alicerçado. Telhado sem paredes, sem estrutura de sustentação, voa alto com o vento, ou desaba.

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