Os acontecimentos dos últimos dias deveriam servir como alerta para empresários e autoridades irresponsáveis, que acreditam poder perpetuar as práticas do velho capitalismo selvagem e do coronelismo, ignorando as comunidades em que estão inseridos. O cidadão comum está saindo da apatia, pressionado por situações extremas causadas pelo desleixo e desprezo com que os velhos atores da política e da economia tratam a população.
Foto: Prefeitura de Cubatão
Vias públicas de Cubatão foram transformadas em estacionamento
Ninguém aceita mais como "normal" que estradas e avenidas sejam transformadas em depósitos de carga e silos, apenas para que as empresas lucrem mais. E o governante que não agir rápido para forçar o empresariado a um patamar mais digno de atuação vai ter de se explicar nas urnas, pois as pessoas esquecem muitas coisas, mas não os transtornos causados à sua vida diária.
Assaltos a motoristas parados nos congestionamentos, acesso prejudicado de ambulâncias, polícia e bombeiros aos lugares onde são chamados emergencialmente, a agenda diária dos cidadãos comprometida pelo caos nas estradas, criam imagens fortes demais para serem apagadas da memória, mesmo do mais desmemoriado dos brasileiros. Responder a isso com vãs promessas de investimentos futuros, ignorando soluções imediatas que deixam inexplicavelmente de ser adotadas, é cometer suicídio político. Ou não? O tempo dirá.
Nestes dias, enfim, o bode foi colocado na sala. Já que as multas em Santos não corrigiram os empresários irresponsáveis, um decreto em Cubatão fez o Brasil acordar para o problema que já não deixa a Baixada Santista descansar. Depois de tanto apelo à inexistente sensibilidade das velhas raposas, o caos entrou à força em suas agendas: terão de lidar com ele, por mais que berrem, esperneiem e xinguem quem enfim teve a coragem de chamar o bode para a sala de visitas. O bode até pode sair, como saiu, mas o cheiro continua e não dá para esquecer.
Todos viram, foi pífia a resposta do governador paulista. Aquele tom de voz "Eu faço!" e o velho soco no ar são efeitos teatrais que já não enganam ninguém. Alckmin perdeu a oportunidade histórica de tomar decisões, e ainda deixou que um secretário saísse falando abobrinhas. Preferiu anunciar investimentos futuros de infraestrutura, que se alinham à desacreditada ponte que virou túnel (Santos-Guarujá), e ao Veículo Leve sobre Trilhos (VLT) enrolado por quinze anos e que justamente naquele dia teve o teatral início de obras ofuscado pelo caos reinante.
Foto: Governo do Estado de São Paulo
Alckmin em escavadeira durante lançamento de obras do VLT da Baixada
Mais efetivo teria sido ordenar que os pátios de contêineres controlem desde o planalto paulista o acesso dos veículos com cargas e contêineres a eles destinados. Como é feito em Paranaguá. Como os pátios já fazem ao enviar suas carretas aos navios. Como as empresas já fazem para rastrear suas frotas. Como os despachantes aduaneiros já fazem para tramitar seus documentos no Siscomex.
Para acabar com o caos, há soluções tão simples como o cidadão usar celular e GPS para saber a melhor rota no complexo trânsito paulistano, prever o horário de chegada usando ônibus comuns no Rio de Janeiro ou decidir o melhor caminho por entre ruas inundadas em Santa Catarina.
O governador ignorou o senso comum. Azar dele, e dos maus empresários que vão sentir cada vez mais o custo de desprezarem as comunidades ao redor. Aliás, será interessante ver os malabarismos que farão para explicar aos acionistas o caos que causam, nos enfeitados e assépticos balanços sociais de suas empresas. Eles, que falam em "missão", "valores", "visão de futuro"... blábláblá...