As autoridades falam em trem-bala, ligando Rio de Janeiro, São Paulo e alguma cidade mais, de acordo com cada projeto e os interesses envolvidos. E isso "para ontem", o mais rápido possível, pois o país tem pressa, dinheiro e vontade de fazer. Um dos projetos, fazendo a bala, quero dizer o trem, chegar a Santos e à cidade de Americana, é tão irreal que prevê início das obras em 2014 e inauguração em 2016.
Pois é, os políticos não mudam mesmo. Continuam imaginando que o país é tão eficiente quanto sua cartola de mágicos, e que dessa cartola nunca sairão gatos pintados como lebres. Precisam fazer um passeio até o interior do Piauí, e conhecer a cidade de Eliseu Martins. Ali começa a ferrovia Transnordestina. Onde termina? Por enquanto, em lugar algum. Aliás, começa? Também não, porque se resolveu iniciar a obra pelo meio, em Salgueiro/PE, com uma das frentes de trabalho chegando a Eliseu Martins. Ainda não chegou.
Jornal mostra que concessionária exige o dobro da verba prevista.
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A ferrovia foi projetada (?!?) para ligar o cerrado piauiense ao litoral, permitindo levar soja até o porto pernambucano de Suape e numa segunda etapa com uma ligação também para o porto de Pecém, no Ceará. No início deste parágrafo, estranhei existir projeto porque, entre outros problemas, a ferrovia passaria sobre uma antiga igreja, em Custódia/PE, como relata uma reportagem especial publicada em 30/12/2012 pelo jornal O Estado de São Paulo.
Os fabulosos planejadores nem perceberam que ela estava ali desde o século 18! E com sua argúcia de gabinete com ar condicionado, logo resolveram: "Fácil! Construímos outra igreja do lado e demolimos essa que nos atrapalha!". Não contaram com a reação popular: depois de construída a nova igreja, tiveram que manter a antiga, patrimônio histórico e religioso, e fazer o que deviam ter feito antes, desviar a estrada nove metros para o lado e respeitar a população. Aliás, se estudassem o traçado in loco, já nem teriam feito tal besteira. E nove metros bastam? Bem, isso ainda está sendo analisado... pela Polícia Federal.
150 anos antes, quando as primeiras ferrovias foram projetadas no Brasil, os engenheiros se embrenhavam na mata, escalavam montanhas, atravessavam rios e lagos, enfrentavam mosquitos e malária, para definir o melhor traçado para a estrada, em termos econômicos e de viabilidade técnica. Hoje, traçam retas em mapas, apontam soluções inexequíveis, e os construtores depois que se virem para resolver os problemas que surgirem. Como a realocação de centenas de famílias que ocuparam o terreno de abandonada via férrea que se pensa aproveitar.
Tem mais, por incrível que pareça: será preciso construir barragens contra enchentes na Zona da Mata, por causa das cheias dos rios Ipojuca e Uma. Caso contrário, os trens provenientes do semi-árido terão de submergir, antes de chegar ao mar...