Um dos primeiros grandes empreendedores brasileiros no setor de Transportes, Irineu Evangelista de Souza, o barão de Mauá, tinha grandes planos. Um deles, interligar a malha ferroviária de todo o País. Ou melhor, naqueles tempos pioneiros: construir uma malha ferroviária que interligasse as diferentes regiões do Brasil, do extremo Norte ao extremo Sul, bem como de Leste a Centro-Oeste ou de Nordeste a Sudoeste.
O outro plano era criar canais entre as grandes bacias hidrográficas brasileiras, ligando-as e permitindo que uma embarcação, saindo de Manaus, por exemplo, pudesse chegar à capital paulista e mesmo às imediações da então capital federal, o Rio de Janeiro, apenas navegando pelos rios. Século e meio depois, os raros navios que ligam Manaus ao Rio de Janeiro fazem isso enfrentando mar aberto. E as mercadorias manauaras só chegam a São Paulo por via aérea ou se, desembarcadas em Santos, subirem a serra do Mar, por rodovia ou ferrovia. Se bem que existe a possibilidade, pouco usada, de levar a mercadoria por mar até a Bacia do Prata e lá fazê-la subir, pela hidrovia Tietê-Paraná-Paraguai, até São Paulo...
Vale recordar, por curiosidade, que em 1913 quase foi colocado em prática um plano para uma super-eclusa que permitiria a um navio de alto-mar, logicamente com o porte dos navios de então – escalar a Serra do Mar a partir de Santos e chegar à capital paulista, onde haveria um porto para carga e descarga direta de suas mercadorias. Não foi avante esse projeto, ousado mesmo para os padrões modernos, quanto mais para os daquela época pré-Primeira Guerra Mundial. Se bem que a engenharia de transportes já havia vencido as dificuldades em meados do século XIX e conseguia que locomotivas e seus vagões de carga e passageiros escalassem diariamente esse mesmo paredão montanhoso...
Enfim, sabem as autoridades que o transporte hidroviário é economicamente vantajoso para o Brasil. Sabem exatamente o que precisa ser feito para que ele entre em operação, e que é relativamente bem pouco: instalar as eclusas quando construir barragens nos rios, aproveitando para tornar navegáveis os pontos hoje interrompidos por quedas-d’’água, e melhorar a sinalização náutica, diurna e noturna, para aumentar a segurança das embarcações. Além de disciplinar a instalação de atracadouros particulares, pois a simples existência da hidrovia tenderá a incentivar o empresariado a construí-los ao longo desses rios...
O transporte hidroviário, como na hidrovia Tietê-Paraná, pode
proporcionar melhorias na eficiência logística das operações no País
Sabem também as mesmas autoridades que as pontes sobre os rios e canais precisam ter altura suficiente para que embarcações passem eventualmente sob seus arcos, transportando passageiros e cargas. Mas, quantas pontes rodoviárias ou ferroviárias deixam vão suficiente para que uma simples canoa passe sob elas?
Da mesma forma que o fenômeno da piracema é cada vez mais raro, também o sistema hidroviário continua lutando com as mesmas dificuldades conhecidas há décadas. E que há muito tempo poderiam estar resolvidas ou pelo menos equacionadas para diminuição paulatina do problema, com o cumprimento de normas que assegurem a navegabilidade presente e futura nos rios e lagos.
Parece, entretanto, que o som da curuca será cada vez menos ouvido nos rios brasileiros, abafado pelo clamor mais alto de interesses imediatistas, talvez mesmo de cunho pessoal...