Causou grande impacto no universo portuário o pedido de recuperação judicial ajuizado pelo Grupo Libra nesta quarta-feira, dia 25 de julho. Não causou, todavia, espanto ou surpresa. A operadora de importantes terminais portuários em Santos e no Rio de Janeiro já foi condenada por não pagar à Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp) os valores referentes à exploração comercial do Terminal 35 do porto santista. O embate judicial é estimado em aproximadamente R$ 3 bilhões. A administração da Codesp resolveu não fazer valer as vitórias na Justiça e, "passando o chapéu com o dinheiro alheio", participa de uma nebulosa arbitragem na Câmara de Comércio Brasil-Canadá. Mesmo inadimplente, a Libra teve um plano de investimentos aprovado pelo Ministério dos Transportes, Portos e Aviação Civil em janeiro de 2017.
No final de março deste ano, as investigações da Operação Skala da Polícia Federal levaram a empresária Celina Torrealba, da família controladora do Grupo Libra, à prisão. Dentre as suspeitas investigadas estão doações feitas pela cúpula da companhia nas eleições presidenciais de 2014. Celina e Gonçalo Torrealba doaram, cada, R$ 250 mil para o então PMDB do Rio de Janeiro. Já o irmão Rodrigo fez um repasse de R$ 500 mil para o diretório nacional do Partido, à época comandado por Michel Temer. A Polícia Federal acredita que a empresa tenha sido favorecida pelo Decreto 9.048/2017, que regulamenta a atual Lei dos Portos (12.815/2013) e foi costurado no Congresso Nacional pelo atual presidente.
O pedido de recuperação judicial não interromperá a arbitragem da dívida com a Codesp. Porém, ainda que condenado judicialmente, o Grupo Libra provavelmente será obrigado a ressarcir a Codesp - empresa pública, importante ressaltar - em valor limitado ao que puder pagar e determinado pelo processo de recuperação, muito similar às antigas concordatas. No ar, fica o aroma de uma conduta duvidosa da companhia e, principalmente, a irresponsabilidade da direção do Porto de Santos de aceitar a arbitragem, mesmo tendo decisão judicial favorável. Desde 1998, a defesa da Libra justifica a sua inadimplência sem consistência técnica, cujos valores devidos se acumularam e foram corrigidos ao longo de todo contrato, sem que fosse pago um centavo sequer.
A arbitragem teve início em novembro de 2016. Mas antes disso a companhia teve três concessões renovadas no Porto de Santos. Incomoda saber que vários diretores da Companhia já atuaram no sentido de aliviar as ilegalidades da Libra Terminais. Além disso, é conhecida a atuação do hoje presidiário Eduardo Cunha, ex-deputado pelo PMDB, aprovando lei ligada ao setor portuário em 2013 que autorizou arbitragens na área portuária. O artigo n° 62 da Lei dos Portos (12.815) impossibilita o terminal inadimplente de prorrogar contratos de arrendamento. No entanto, em vez de exigir a cobrança dos valores que lhe são devidos, e sem dar bola à Lei, a Codesp ofereceu um gesto de bondade à Libra e passou a desenvolver com o arrendatário inadimplente a ampliação dos terminais, garantindo a continuação dos negócios estabelecidos de forma ilegal no porto santista.