Muita coisa cresceu e foi construída na cidade durante esse período, mas uma coisa literalmente “sumiu do mapa” desde essa época. Foram os pátios ferroviários que atendiam a cidade, nos quais eram realizadas carga e descarga de mercadorias transportadas por via ferroviária. Presidente Altino, Lapa, Barra Funda, Pari, Brás, Moóca, entre outros. Uns viraram espaço para oficinas dos trens metropolitanos, outros Memoriais, alguns Feirinhas da Madrugada e outros estacionamento de sucatas ferroviárias.
Imagem: Google Maps
O Pátio do Pari em 1958 (fonte: Geoportal) e o mesmo local em 2013, com os boxes da Feirinha da Madrugada
Ou seja, não se transporta mais nada por ferrovia dentro da área metropolitana de São Paulo, com algumas exceções, como areia, ainda descarregadas na Água Branca e Moóca, bobinas de aço, também na Moóca e alguma coisa em moinhos em São Caetano e Santo André. E o governador já declarou que não quer mais trens de carga circulando na área da CPTM.
Isso se deveu por dois fatos: O primeiro pelo gradual e progressivo abandono das ferrovias para o transporte de carga geral, já que em nosso país priorizou-se este modal para o transporte de gêneros unitários de grande volume e baixo valor agregado. O segundo, mais recente, foi a decisão do Governo do Estado, após a criação da CPTM, em melhorar a qualidade das linhas metropolitanas, com mais trens e menor “headway” (intervalo entre trens). Iniciativa louvável, sem dúvida, mas da forma que vem sendo executada, com efeitos que afetaram e ainda afetarão a vida das cidades por onde passam as ferrovias, sem contar o que implica tal fato no acesso ao Porto de Santos.
Os que ainda se lembram das ferrovias até meados dos anos 80, quando ainda existiam alguns desses pátios, certamente recordam que os trens metropolitanos de então conviviam com os cargueiros (e também trens de passageiros que ainda eram frequentes) e no caso das linhas da Santos-Jundiaí, os “trens de subúrbio” (assim chamados) circulavam diretamente de Francisco Morato a Paranapiacaba.
Ainda existiam diversos armazéns à beira da linha, bem como desvios ferroviários atendendo indústrias e terminais diversos. Locomotivas manobreiras eram comumente vistas andando para lá e para cá nas vias laterais.
Como exemplo, ao longo da Avenida Presidente Wilson, a qual corre paralela à ferrovia, da divisa de São Caetano à Moóca, existem vários armazéns, os quais tem acesso tanto para a avenida como para a ferrovia. Do lado da ferrovia não há sequer um trilho para acesso aos armazéns (e onde existem trilhos, existem vagões apodrecendo em cima). Do lado da avenida, frequentemente carretas enormes interrompem o tráfego para poderem entrar nos armazéns para carga e descarga.
Atualmente, além de cada vez menos circularem trens de carga, as linhas de passageiros foram seccionadas, mesmo se investindo pesadamente em novos sistemas de sinalização. É muito mais difícil hoje ir do ABC à Lapa por trem do que há 20 anos. 2 baldeações são necessárias, antigamente os trens eram diretos.
Em outros artigos já fiz críticas à nossa perda da cultura ferroviária, o que implica na falta de conhecimento da operação ferroviária. Como podíamos fazer conviver trens cargueiros e trens de passageiros enquanto hoje, com tecnologias de controle e de sinalização muito superiores, não conseguimos mais fazê-los conviver?
Não seria possível a construção de trechos paralelos às linhas metropolitanas para que trens cargueiros voltassem a circular em condições razoáveis de operação, para atender potenciais clientes que ainda teriam interesse no transporte ferroviário, ao invés de simplesmente jogá-los ao modal rodoviário, com o consequente aumento do tráfego nas já congestionadas ruas e avenidas da cidade? Isso sem falar no aumento do tráfego do Sistema Anchieta-Imigrantes e as implicações que o Portogente reporta quase que diariamente.
Infelizmente neste caso, vestiu-se um santo e desvestiu-se outro. O investimento no transporte metropolitano de passageiros por ferrovia é realmente necessário para São Paulo e suas cidades vizinhas, mas infelizmente se esqueceram de que as ferrovias também transportam cargas com mais vantagem que qualquer outro meio de transporte terrestre. O certo era investir de forma que a ferrovia continuasse atendendo, dentro da região metropolitana, tanto cargas quanto passageiros.
No próximo artigo voltaremos a abordar este assunto.