Terça, 07 Janeiro 2025

No jornal A Tribuna de Santos, na edição de 8 de agosto de 1953, saiu, na seção Porto e Mar, criada pelo jornalista Francisco de Azevedo, uma interessante matéria, intitulada: “Um navio emoldurado na Ponta da Praia”.

A matéria mostra um homem com capa, fotografado por Rafael Dias Herrera, observando - da antiga Ponte dos Práticos, que hoje recebe o nome de Ponte Edgard Perdigão - a passagem do transatlântico francês ‘Charles Tellier’, rumo ao antigo cais do Armazém de Bagagem – ao Cais do Armazém 15. Por ser interessante, reproduzo cópia da imagem e o texto:

 

Um navio emoldurado na Ponta da Praia

Na moldura da Ponte dos Práticos da barra, projetou-se o ‘Charles Tellier’ à passagem pela Ponta da Praia, em demanda do canal do porto.

 


O transatlântico francês ’’Charles Tellier’’, passando

pela antiga Ponte dos Práticos, em fotografia de

Rafael Dias Herrera – 1953. (Reprodução)

 

À hora matutina, apenas um enamorado de navios está ali, à espreita, talvez experimentando o prazer de ser o único a gozar do nosso fotógrafo Rafael Dias Herrera, também já andava à mesma hora rondando o local, como outro enamorado de quadros iguais, na sua busca incessante, não só por motivo de ser repórter fotográfico de PORTO & MAR, como também por ser bom artista, desejoso de mostrar onde se situa “a grande atração da Cidade”.

Sua bela fotografia, publicada, deverá - ao lado de representar, pela imagem impressa, a verdade desse enunciado - surpreender o observador matinal embevecido diante do panorama traçado pelo homem e a natureza.

Aproveitamos para dizer que o ‘Charles Tellier’ é um moderno transatlântico francês, da frota da Chargeurs Reunis, em serviço regular na linha para o Brasil e o Rio Prata.

Seu nome é homenagem à memória do grande engenheiro que foi o precursor das instalações frigoríficas, o que lhe valeu ser chamado “Lê pere du froid”. Faleceu o sábio francês em 1913


Rafael Dias Herrera (à esquerda), o inesquecível fotógrafo de

A Tribuna, ao lado do supervisor do antigo Armazém de Bagagem,

Pascoalino Romano (da Alfândega), na ocasião em que foram

entregues dois painéis com imagens de transatlânticos antigos

que escalavam no Porto de Santos, painéis oferecidos pelo autor.

(Reprodução: Foto Laire José Giraud - 1996)

 

Vale lembrar que Rafael Dias Herrera, já falecido, era irmão dos grandes fotógrafos Paco Herrera (também já falecido) e de José Dias Herrera, que, aos 85 anos, ainda atua na profissão.

Cerca de oito anos atrás, adquiri várias das fotografias de Rafael, clicadas na década de 1950, a maioria mostrando navios. Entre as que mais me agradam, destaco duas. Uma do ‘Conte Grande’, da Italia Di Navigazione, passando pela amurada da Ponta da Praia, com algumas pessoas acenando para a bela embarcação. Para melhor idéia do que falo, reproduzo a do ‘Conte Grande’.

Na outra, há uma imagem do antigo Parque Balneário Hotel - por volta de 1969.

 


O transatlântico ’’Louis Lumiere’’, que navegava juntamente com o

’’Charles Tellier’’, o ’’Lavoisier’’ e o ’’Laennec’’, fazia a linha Brêmen,

Hamburgo, Antuérpia, Le Havre, Vigo, Lisboa, Las Palmas, Rio de

Janeiro, Santos, Montevidéu e Buenos Aires. Começaram a navegar

no início da década de 1950 e foram até os Anos 60. Pertenceram à

armadora Compagnie Maritime des Chargeurs Reunis, que tinha

agência marítima em Santos, na Rua Quinze de Novembro, 186, com

um telefone que guardei nos meus registros: 22-009. (Reprodução:

Acervo: Laire José Giraud)

 

Naquele sábado, 8 de agosto de 1953, estavam atracados 41 navios no Porto de Santos. Eis alguns: 

  • Passageiros – os americanos ‘Uruguai’, da MooreMcCormack (Mooremac) Line, e ‘Del Sud’, da Delta Line, o holandês ‘Tjitjalengka’, da Royal Interocean Line, o espanhol ‘Cabo de Hornos’, da Ybarra.
  • Cargueiros – ‘Cabo de Hornos’, ‘Lóide Canadá’ e ‘Lóide México’, do Lloyd Brasileiro, ‘Itaquatiá’, da Companhia Costeira, ‘Aurea Conde’ e ‘Mormacdove’, da Mooremac, entre outros, que também marcaram época em Santos.

Na época faziam parte da Praticagem de Santos práticos da barra como: Edmar Botto de Melo, Salvador da Costa Godinho, Afonso da Costa Godinho, Stein, Aquiles Tacão, Silveira, comandante Quirino, já falecidos, além de Raul Mesquita e Gerson da Costa Fonseca, que ainda vivem.

 

Relação dos navios atracados

no cais de Santos, no sábado,

8 de agosto de 1953. (Reprodução)

 

Lembro também que, naqueles anos dourados, pouco antes das 7 horas da manhã, o movimento de trabalhadores no porto era intenso.

Os bondes, principalmente o 19, ficavam apinhados de doqueiros, como eram chamados os trabalhadores da concessionária particular Companhia Docas de Santos. Isto sem deixar de lembrar o elevado número de bicicletas que circulavam na faixa portuária.

As cantinas do cais vendiam uma delícia que era conhecida como Peru Enfeitado - na realidade, não passava de sanduíche de mortadela acompanhado de uma folha de alface. Saboreei o sanduíche algumas vezes. São coisas específicas do Porto de Santos.

Retornando à Ponta da Praia, mais precisamente ao calçadão, que não perdeu a majestade. Continua a ser passarela dos navios, com a antiga Ponte dos Práticos (apenas relembrando: atual Ponte Edgar Perdigão, em reformas), o Deck dos Pescadores e outras coisas interessantes.

Mas, de certa forma, perdeu o charme do passado - como a vista total da amurada, hoje limitada pelos píeres onde estão os restaurantes e pela nova Ponte da Praticagem, bem como a ausência do famoso trampolim da Ponta da Praia, local de onde a Dona Dorotéia (personagem dos antigos carnavais) pulava com o noivo, isto é, sempre no domingo anterior ao do Carnaval.

As pessoas na casa dos 30 anos e com mais idade lembram perfeitamente o famoso banho, em que os noivos pulavam do trampolim.

A Ponta da Praia - apesar do progresso que alterou o cenário das décadas passadas - continua sendo a rainha, como sempre, ou seja, o local onde os navios desfilam diariamente, em paisagem que ganha glamour especial na temporada de cruzeiros marítimos: as pessoas se aglomeram no calçadão para assistir à passagem dos belos transatlânticos, a maioria com o casco branco a dar um brilho ao estuário.

A propósito, a próxima temporada de cruzeiros marítimos será a maior de todas, pois começará em 11 de outubro de 2006 e terminará em 15 de abril de 2007, com 10 navios regulares, totalizando o recorde de 204 escalas de navios de turistas, que passarão pelo Terminal Marítimo de Passageiros do Concais, no Cais do Armazém 25 do Porto de Santos.

Este artigo, portanto, é homenagem à memória de Rafael Dias Herrera, sensível e brilhante fotógrafo que registrou, através das lentes da câmera, inesquecíveis imagens, que eternizaram acontecimentos, personagens e cenários da Cidade, do Porto e da Praia de Santos...

Veja mais imagens


O ’’Lóide Canadá’’, da série Nações (foram construídos 20 navios com o nome

das nações das Américas), navegou de agosto de 1947 até março de 1970,

quando chegaram os novos navios regulares para o Lloyd Brasileiro. Em 8 de

agosto de 1953, o ’’Lóide Canadá’’ estava atracado na curva do Cais do Armazém

23 da antiga concessionária do Porto, a CDS – Companhia Docas de Santos.

(Imagem do livro Bandeiras nos Oceanos, de autoria de José Carlos Rossini)


Na Década de 1950, era comum ver navios do começo do século, como o ’’Wisla’’,
no porto santista. Eram utilizados mais na cabotagem. (Reprodução: Acervo
Laire José Giraud)



A configuração dos cargueiros construídos após a Segunda Guerra Mundial
era do estilo ao do ’’Eemland’’, da Koninklijke Hollandsche Lloyd: tinham
superestrutura a meia nau, além de castelo de proa e tombadilho. (Reprodução:
Acervo Laire José Giraud)


O transatlântico holandês ’’Tjitjalengka’’, daRoyal Interocean Line, era
representado em Santos pela Agência Marítima Martinelli, que ficava na Rua do Comércio, na esquina com a Quinze de Novembro. Outros navios da companhia
eram: ’’Boissevain’’, ’’Ruys’’ e ’’Tegelberg’’, que navegaram de 1948 a 1968.
Faziam a linha Shangai, Hong Kong, Kobe, África do Sul, Rio de Janeiro, Santos, Montevidéu e Buenos Aires. (Imagem extraída da Revista Docas de Santos,
do acervo do Complexo Cultural do Porto de Santos)


Imagem do pujante e laborioso Porto de Santos na Década de
1950: composições férreas, os antigos guindastes de construção
inglesa para carga geral, um  sugador de trigo na altura do cais
do Paquetá, próximo ao escritório do Tráfego  da Companhia
Docas de Santos. (Imagem extraída da Revista Docas de Santos,
do acervo do Complexo Cultural do Porto de Santos)


Na imagem, vemos um cargueiro da antiga Ivaran Lines, passando na altura
do antigo trampolim da Ponta da Praia, durante a comemoração carnavalesca
do banho da Dona Dorotéia. Início da Década de 1950. (Reprodução do livro comemorativo da Ivaran Lines)

Curta, comente e compartilhe!
Pin It
0
0
0
s2sdefault
powered by social2s

topo oms2

Deixe sua opinião! Comente!