Recentemente, recebi do despachante aduaneiro e amigo Antonio Carlos Martins um antigo cartão-postal do navio de passageiros francês Brésil, adquirido numa feira de antiguidades na cidade holandesa de Amsterdã, durante recente viagem pela Europa.
Cartão-postal da volta ao mundo com os navios franceses e as
bandeiras de armadoras, sendo que a Messageries está à direita.
Acervo do autor.
Depois de examinar detalhadamente, o referido cartão-postal, o que aguçou sobremaneira a curiosidade de shiplover, resolvi procurar maiores informações sobre o navio e sua armadora, que foram encontradas nas obras “Navios e Portos do Brasil – Nos Cartões-postais e Álbuns de Lembranças”, dos autores João Emílio Gerodetti e Carlos Cornejo, editado pela Solaris Edições Culturais, em 2006, e “Rota de Ouro e Prata”, de José Carlos Rossini, lançado em 1995.
Diga-se de passagem, para os apreciadores dos paquetes de outrora, recomendo as duas obras, que além do agradável texto são recheadas de belas imagens de navios das principais armadoras nacionais e internacionais. Abaixo repasso texto e informações encontradas nos referidos livros.
Imagem do postal do Brésil, presenteado pelo amigo Antonio
Carlos Martins, que deu origem a este artigo sobre a legendária
armadora francesa.
A Compagnie de Services Maritimes dês Messagerie Nationales foi fundada em Paris, em 06 de agosto de 1851, pelo armador M. Rostand e o empresário Ernest Simons, tendo entre suas funções o serviço postal marítimo. Em 9 de setembro daquele ano, o Hellespont foi o primeiro navio da companhia.
Com o retorno da monarquia à França, em 1853, sua denominação passou a ser Compagnie dês Services Maritimes Imperiales e sua frota foi ampliada. Em 1857 tinha 57 navios. Nesse mesmo ano a companhia obteve concessão oficial dos serviços postais para América do Sul e estabeleceu uma linha regular para os portos do Brasil e Rio da Prata. Assim, encomendou a construção de sete unidades, entre elas o vapor La Guienne, que inaugurou em 1860 a rota para o Brasil. Sua primeira viagem foi entre Bordeaux e Rio de Janeiro, seguido dos navios Aunis e Saintonge.
O Brésil visto por boreste (lado direito), durante sua construção
recebeu a visita do Imperador Dom Pedro II, tinha capacidade para
1.014 passageiros, media 146 metros de comprimento, navegou pela América do Sul até 1902 quando passou a servir a linha da Austrália.
Acervo do autor.
Em 1871 após a Guerra Franco-Prusiana e a abolição da monarquia. A denominação da armadora passou a ser Compagnie dês Messageries Maritimes.
Já em 1866, a companhia possuía 58 vapores. Na linha da América do Sul os navios escalavam Portugal, Senegal, Brasil e Rio da Prata. Os navios que operavam nessa linha eram: Congo, Équateur, Orénoque, Niger, Sénegal, Girond, Médoc, Matapan e Ortégal.
O vapor Cordillère era semelhante ao Ernest Simons e ao Brésil, que começou a navegar em 1896. Acervo do autor.
A companhia mantinha linhas para Austrália e Nova Caledônia, Índia, China, Índia, Japão, Cingapura, Tonkim e Manilha, Meditrrâneio e Mar Negro.
Em 1887, entrou em serviço o vapor Portugal, de 5.540 toneladas, e capacidade para 915 passageiros, que serviu os portos brasileiros por dois anos. Foi substituído pelo navio Atlantique.
Embarque de passageiros com destio à América do Sul, em 1905
no porto francês de Bordeaux. Acervo do autor.
A frota foi acrescida pelo Guadalquivir e o Guadiana, em 1888, seguidos pelos vapores, Adour, Charente, Dordogne, Douro, La Plata e Brésil, em 1889. O Brésil de 5.876 tons foi visitado durante a sua construção por Dom Pedro II. O Brésil media 146 metros de comprimento e podia transportar 1.014 passageiros. Em 1902 foi reformado e passou a ser o Dumbea, e foi utilizado na linha da Austrália.
Entre 1894 e 1896 entram em serviço três navios similares, o Ernest Simon, Chili e Cordillère.
Cartão-postal do belo paquete (navio de passageiros) Tonkim, 1902.
Acervo do autor.
Em 1912 expirou o contrato de serviço postal subvencionado pelo Governo da França e a linha para América do Sul foi suprimida, passando a ser servida por outra armadora a Sud-Atlantique pertencente à Chargeurs Reunis.
Em 1914 a frota era de 60 navios, mas durante a Primeira Guerra Mundial foram perdidos 22 navios, sendo 13 de passageiros. Os demais serviram como transporte de tropas e navios-hospitais.
Navio de passageiros francês típico dos anos 20.
Acervo do autor.
Em 1919, foi inaugurada a rota de volta ao mundo, sendo o El Kantara o primeiro navio francês a utilizar o Canal do Panamá. De 1929 a 1930 foi um período de progressos técnicos e luxo na decoração dos navios, como no caso dos transatlânticos Mariette Pacha e Felix Roussel.
Com a chegada da Segunda Guerra Mundial (1939/1945), a frota foi parcialmente dizimada, metade da qual foi perdida.
Cartão-postal do L´Atlantique, o mais
suntuoso transatlântico francês da
linha sul-americana. Sua viagem
inaugural se deu em 1931. O paquete
teve curta duração, pois sofreu incêndio
em 1933. Media 226,7 metros de
comprimento. Acervo do autor.
No pós-guerra novos navios foram incorporados e foram restabelecidas as linhas de navegação. Em 1949, entrou em serviço na linha do Extremo Oriente o La Marseillase, o primeiro navio construído depois da Grande Guerra.
Somente em 1962 foi retomada a linha da América do Sul, que passou a ser servida elos transatlânticos Laennec e Charles Tellier. Da extinta Sud-Atlantique. E Louis Lumière da Chargeurs Reunis. Em 1966 foi lançado ao mar o último transatlântico da armadora, o Pasteur. Mas, entre 1967 e 1972, a independência das colônias francesas e a popularização do transporte aéreo acabaram por determinar o fim da frota de navios de passageiros da armadora. Em 1977, a Messageries Maritimes e a Compagnie Générale Transatlantique, CGT, fundiram-se na nova Compagnie Générale Maritime.
Vista da chamada "Wall Street santista", a Rua XV de Novembro,
no reduto das agências de navegação, bancário e do comércio cafeeiro,
nos anos 20 do século passado, quando inúmeros navios franceses escalavam em Santos. Acervo do autor.
Durante minhas pesquisas, consultei o livro “O Brasil na Rota da Navegação Francesa”, de autoria de Júlio Bandeira, o qual me foi oferecido pelo Grupo Rodrimar. Mostra claramente que sempre existiu um grande relacionamento entre o Brasil e a França, o que contribuiu com grande relevância na importação e na exportação para o desenvolvimento econômico brasileiro.
Merci et au revoir.
A Praça Tiradentes, no Rio de Janeiro no início do século XX.
O Porto carioca era escala das armadoras francesas.
O paquete francês Cordillère, durante manobra de atracação no
Porto de Santos no início da primeira década do século XX, no Estuário, proximidades da Alfândega. Acervo do autor.
O último transatlântico da armadora, o
Pasteur, lançado em 1966. Acervo do autor.