Iris Geiger da Silva é arquiteta e especialista em Gestão Ambiental e Patrimônio Cultural
“Toda boa dádiva e todo dom perfeito vêm do alto, descendo do Pai das luzes...”
(Carta de Tiago - 01:17 – Bíblia Sagrada - João F. de Almeida Atualizada)
O Conselho de Defesa do Patrimônio Cultural de Santos - CONDEPASA reconhece mais um patrimônio cultural do município. A edificação de arquitetura moderna, à rua Sete de Setembro nº 14, no bairro da Vila Nova, agora é também um bem tombado. No prédio funcionava a Escola Técnica de Comércio de Santos, desde o ano de 1970, denominada “Acácio de Paula Leite Sampaio”. Atualmente, existe projeto para a instalação da ETEC Santos III – Centro Paula Souza, que deverá ser a terceira Escola Técnica de Santos.
O pedido para o tombamento veio da Secretaria Municipal de Educação, que considerou importante preservar o edifício projetado pelos arquitetos Décio Tozzi e Luiz Carlos Ramos, no início da década de 1960, para abrigar a primeira escola profissionalizante da cidade – “Escola Técnica de Comércio de Santos”, também conhecida como Instituto Municipal do Comércio. A instituição destinava-se a atender às áreas administrativas portuárias e do setor de serviços.
O projeto, classificado como um exemplar da arquitetura modernista da Escola Paulista Brutalista, recebeu diversos prêmios em reconhecimento ao valor arquitetônico, sendo inclusive contemplado pelo Museu Nacional de Arte Moderna do Centro Georges Pompidou (Paris, França) para figurar com destaque no catálogo da exposição de obras modernas (“Modernités Plurielles de 1905 a 1970”).
O Museu Nacional de Arte Moderna (Pompidou), no ano de 2009, selecionou quatro obras do arquiteto brasileiro Décio Tozzi para seu acervo permanente: a Escola Técnica de Comércio de Santos, a Residência e a Capela da Fazenda Veneza (Valinhos/SP) e o Fórum Trabalhista Ruy Barbosa (São Paulo/SP). A curadora da exposição, arquiteta Valentina Moimas, buscou uma releitura da arte moderna, enfocando de forma original a relação entre a produção do Centro e de outras partes do mundo naquele período do século vinte. Mais informações sobre a obra do arquiteto Decio Tozzi em Paris, acessando aqui.
Criado em 1948, o Instituto Municipal do Comércio funcionou originalmente no prédio do então Grupo Escolar Olavo Bilac, no Campo Grande. Na segunda gestão do prefeito Silvio Fernandes Lopes (em abril de 1969), já com o nome do seu patrono, Acácio de Paula Leite Sampaio, o novo prédio foi inaugurado.
Acácio Sampaio, nascido em Capivari (SP), em 1904 e falecido em Santos (SP), em 1965. Bancário, formado em Contabilidade e Economia, mudou-se para Santos em 1942, passando a exercer o cargo de auditor da Fazenda na Prefeitura de Santos. Destacou-se por sua liderança na categoria, simpatia e capacidade de oratória. Ocupou também a posição de diretor do Conselho Regional de Contabilidade.
O prefeito Silvio Fernandes Lopes, falecido em 2005, tinha um perfil de administrador desenvolvimentista. Era engenheiro civil e nas suas duas gestões (1957-1961 e 1965-1969) implantou diversos equipamentos públicos seguindo o ideário de arquitetura moderna. Em 1965, fundou a Prodesan – Progresso e Desenvolvimento de Santos.
O arquiteto Décio Tozzi (São Paulo/SP, 1936) graduou-se em 1960 pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie (FAU-UPM). Em 1962, fundou o escritório Décio Tozzi Arquitetura e Urbanismo, recebendo desde então uma série de prêmios. Além da prática profissional como arquiteto, dedica-se também à atividade docente e de pesquisa.
A obra do arquiteto e professor Décio Tozzi está inserida no contexto de renovação da arquitetura moderna paulista, iniciada na década de 1950 pelo arquiteto João Batista Vilanova Artigas, principal expoente da Escola Paulista. Tozzi formou-se durante a construção de Brasília, no auge da afirmação do projeto nacional-desenvolvimentista. Compartilha a convicção de que os arquitetos devem contribuir para a transformação social do país, investindo na modernização da construção civil por meio da racionalização do desenho, da mecanização do canteiro de obras e da escolha do concreto armado aparente como sistema construtivo preferencial, tanto pela disponibilidade dos materiais que o compõem, quanto pelo conhecimento acumulado sobre a técnica desde o início do século vinte no Brasil.
A respeito da edificação tombada, o arquiteto Tozzi esclarece: “A leitura de sua arquitetura revela o desenho como resultado da intenção de domínio e transformação da natureza adversa da região, que apresenta excessiva luminosidade atmosférica e elevadas temperaturas. Conseguimos captar a luz solar zenital por planos de reflexão e tubos condutores de luz, transformando a luminosidade excessiva em luz difusa interior, própria para o ensino e leitura.”
No projeto original do ano de 1963, o edifício deveria estar inserido em um conjunto de escolas implantadas e a se implantar no “Centro Velho de Santos”, trazendo uma proposta de renovação urbana. A elevação do pátio do Instituto do Comércio, através de uma plataforma acima do nível da rua, sugeria a interligação das várias escolas através de planos elevados e passarelas. Criava-se um “campus” escolar com amplo convívio dos diversos cursos e a separação conveniente do trânsito de veículos do de pedestres.
Escola Técnica de Comércio - Croquis do Arq. Décio Tozzi.
Vista da Escola Técnica Acácio de Paula Leite Sampaio a partir do pátio da Escola Avelino da Paz Vieira. Os pátios interligados poderiam configurar o campus escolar. Foto: Julio Abe Wakahara.