Maria Domingues, portuguesa da Ilha da Madeira, 39 anos de Macuco, afirma que é difícil o dia em que não aparecem corretores, interessados não propriamente no amplo chalé da Rua Rodrigo Silva nº 239, construído há mais de 60 anos, mas no terreno de 15 metros e meio de frente por 50 de fundos. Já ofereceram até cinco apartamentos em troca. Mas, eles não valem o quintal onde Maria colhe bananas, fruta-do-conde e figo, cria galinhas e cultiva uma infinidade de plantas.
Última modificação em 11/06/02 15:06:29
Publicado em 6/5/1982 em A Tribuna e reeditado em 2002
http://www.novomilenio.inf.br/santos/h0100b01a.htm
Será que até agora, no século XXI, Dona Maria (ou sua descendência) resistiu às ofertas do mercado imobiliário? Fiquei com esta dúvida enquanto escrevia mais um capítulo sobre nossa protagonista – a Hospedaria dos Imigrantes.
A construção da Hospedaria dos Imigrantes na cidade de Santos teve início em 1910, sendo parcialmente ocupada em 1912. Atribui-se o projeto ao arquiteto Nicolau Spagnuolo da “Commissão de Saneamento de Santos”, mas houve alterações ao plano original. O prédio imponente, de estilo eclético, está num retângulo de 110 x 87 metros. Compõe-se de duas alas com um pátio central. Chama atenção a generosidade de suas dimensões. O pé-direito (altura do compartimento) no pavimento térreo mede 6,20 m e no andar superior alcança 7,00 m.
Nas suas duas primeiras décadas de existência, a Hospedaria pode ter recebido e abrigado grande parte dos 2,5 milhões de imigrantes que desembarcaram no Porto de Santos. A historiadora Wilma Therezinha Fernandes de Andrade, doutora em História pela USP (Universidade de São Paulo), afirmou que ainda há dúvidas sobre sua utilização. "Eu nunca consegui encontrar uma prova documental, uma referência, mesmo literária, que o prédio tenha sido utilizado para abrigar os imigrantes", afirmou Andrade.
Foto: www.dw-world.de
A professora achou, em um jornal da época, que os imigrantes chegavam de navio e eram imediatamente levados para a estação da estrada de ferro. Lá, eles embarcavam para São Paulo, onde realmente ficavam na Hospedaria dos Imigrantes da capital.
Ao certo, sabe-se que com a diminuição do fluxo migratório, o edifício foi entregue à Secretaria da Fazenda para ser usado como depósito de café.
Em 1968, uma reforma interna adaptou o prédio para funcionar como o Entreposto de Banana. O tempo se encarregou de castigar o imponente edifício, que insiste em ainda mostrar a mescla de suas características clássicas e neocoloniais. Com vocação, mas em desvio de função, depois de guardar as saborosas bananas, passou a abrigar veículos, funcionando como garagem da Secretaria de Segurança Pública.
Como dissemos, na semana passada, o antigo prédio já tinha entrado em processo de decadência desde os anos 30. Em 1995, passou-se a considerar a possibilidade de um projeto tripartite (Estado, Município e Instituto Herbert Levy) para revitalizar o edifício. Tomaram à frente das discussões, o então prefeito David Capistrano, o vice-prefeito e secretário de Indústria, Comércio e Turismo, Carlos Lamberti, o chefe de gabinete da Secretaria Estadual de Agricultura e Abastecimento, Luiz Carlos Panunzio e o diretor do Instituto Herbert Levy, Reinaldo Paes Barreto.
No início da gestão Beto Mansur (1997), houve negociações na tentativa de transferir o imóvel da Secretaria Estadual de Agricultura para o Município. O D.O. de Santos, datado de 07/05/97, registrava a mensagem do prefeito: “O que pretendemos é que essa transferência possibilite o uso pelos empresários, já que o local tem grande potencial de utilização e pode ser explorado por diversos tipos de atividades”.
O Conselho de Defesa do Patrimônio Cultural de Santos – Condepasa - reconheceu a importância do imóvel como exemplar arquitetônico do período da Primeira República. A resolução de tombamento em 1998 somou-se aos esforços para preservar o patrimônio edificado, mas sua eficácia, como se pode constatar pelo aumento da deterioração física, revelou-se pequena.
E, na próxima semana, o que mais nos revela esta testemunha de alvenaria e ferro?