A última vez que me deparei com uma catraia, despontando do pequeno túnel da Bacia do Mercado e atravessando corajosamente o Estuário de Santos, tive a nítida noção de que algumas coisas parecem ignorar o tempo.
Quando acompanhei o processo de revitalização da rua XV de Novembro, no centro da cidade e finalmente vi o espaço com as luminárias de ferro estilo republicano e diversos edifícios restaurados, também me admirei. Pude recordar que, há menos de cinqüenta anos atrás, um cheiro de grãos de café torrados inebriava mais do que hoje. Acho que aquela menina de estômago frágil não apreciava o cafezinho como agora.
A antiga “rua dos bancos”, ou a “Wall Street”, em meados do século XX, abrigou dezenas de instituições bancárias. Entre elas o Comind, no prédio onde hoje está instalada a Câmara Municipal de Santos. No mesmo terreno, também existiu outra edificação singular – a residência do Patriarca da Independência, José Bonifácio de Andrada e Silva.
Em 21 de novembro de 1889, homenageando a Proclamação da República, a rua Direita passou a denominar-se rua XV de Novembro. Na época, o logradouro já concentrava grandes negócios internacionais do café – o ouro verde brasileiro.
Em 1909, o Brasil registrou através do Porto de Santos, o recorde de exportação de café – 788 mil toneladas de grãos. Naquele ano, o cais tinha apenas 4700 m de extensão e o “ouro verde” fluía pelos trilhos da SP Railway, enchendo os navios.
Quase um século depois, neste ano de 2005, está previsto um novo recorde de movimentação do produto. No primeiro semestre, foi registrado o dobro do ano passado, cerca de 345 mil toneladas. Entretanto, o burburinho dos corretores, as latinhas de amostras do grão ou os alinhados senhores com seus ternos de linho branco já não fazem parte do ambiente local.
Foto: Ademir Henrique
Carroças, burros e carregadores foram substituídos por caminhões, guindastes e esteiras automatizadas. Muitas firmas exportadoras e operadoras do mercado transferiram suas sedes para outras cidades. O cheiro nas ruas do Centro é quase imperceptível porque o café segue acondicionado em contêineres.
Apesar de tudo, no próximo dia 24, última 5ª feira de novembro, será o Dia Universal de Ação de Graças e podemos agradecer por ainda ser possível apreciar um delicioso cafezinho na Cafeteria do Museu dos Cafés do Brasil, no prédio da Bolsa, à rua XV de Novembro.