O plano de ocupação da cidade de Santos, denominado “Planta de Santos” e projetado pela Comissão de Saneamento (sob a presidência do engenheiro Saturnino de Brito), na primeira década do século XX, previa a expansão da urbanização em longo prazo. O Plano conservava os arruamentos já abertos nas vilas Macuco e Mathias, não interferia na porção edificada e propunha um desenho harmônico para a malha urbana.
Era necessário remodelar o antigo berço colonial com obras de esgotamento sanitário e de drenagem. A expansão do núcleo apoiou-se numa rede de nove canais, de suma importância para o saneamento dos alagados. Os brejos e valas mantinham a área insalubre e dificultavam a formação de novos loteamentos. O Plano previa a execução de grandes avenidas, parques, praças, um jardim público ao longo da orla, além de ajardinamento das margens dos canais. Na Avenida do Saneamento (Francisco Glicério-Afonso Pena), Saturnino propunha minimizar a linha férrea, inserindo-a num bosque, distanciando a ferrovia a cerca de 60 metros das habitações.
Conjugando fatores de natureza sócio-econômica, estética e ambiental, o engenheiro descreve a Planta de Santos:
“As grandes e largas avenidas, com um bosque na faixa central, cortando a planície em diagonais que facilitarão o trânsito, atenuarão o rigor dos ventos fortes, abaixarão a temperatura das correntes aéreas, para elas atraídas e por elas distribuídas pelas outras ruas em situação favorável. Duas delas, com a base curvilínea da praia, formam um polígono mistilíneo, com cerca de 14 km de extensão; oferecerão um passeio de utilidade e de beleza não vulgares se forem dotados dos atrativos e das vantagens com que o sentimento e o engenho humanos se vêem exercitando na arte moderna de melhorar e construir as cidades.”
(Saturnino de Brito – “A Planta de Santos” - Typographia Brasil de Rothschild e Co., 1915, p. 85)
Imagem: www.novomilenio.inf.br
Planta de Santos de 1910, de Saturnino de Brito
O engenheiro sanitarista imprime de modo precursor a tese do planejamento urbano no Brasil e assim “... se aproxima, senão se adianta às mudanças ocorridas na Europa dos anos 1910, em que o objeto das intervenções urbanísticas passou a ser a cidade em sua totalidade e sobretudo extensão.” ( Carlos R. M. de Andrade, em “De Viena a Santos: Camillo Site e Saturnino de Brito – A construção das cidades segundo seus princípios artísticos”, S. Paulo, Ed. Ática, 1992, p. 211)
Passados 35.800 dias, continuamos a observar que a cidade é um organismo vivo, muda todo dia. Nossa missão agora é descobrir como melhor agir para que este ser não se transforme num monstro de sete-cabeças auto-destruidor.
Foto: www.egov.santos.sp.gov.br
Os canais de Santos passam por obras diversas, que incluem troca de piso, reparos nos taludes e recuperação das muretas dos guarda-corpos das pontes. A proposta da administração municipal é adotar o modelo da orla da Ponta da Praia, de modo semelhante à reforma do fechamento ao longo da faixa da via férrea (vias Francisco Glicério e Afonso Pena). Algumas árvores também estão sendo substituídas. Os serviços incluem o plantio de 280 novas árvores, a poda de raízes e galhos e a construção de covas em forma de trapézio.
Será que, após as alterações projetadas, continuaremos a identificar facilmente os já tombados canais – patrimônio cultural e urbano santista?
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