Sexta, 27 Dezembro 2024
escrito por André de Seixas, editor do site dos Usuários dos Portos do Rio de Janeiro

Um país que não tem a capacidade de escoar as suas riquezas para o mundo, pode se dizer soberano? Um país cujas autoridades permitem que empresas de navegação estrangeiras entrem aqui e façam o que bem entendam, pode ser dizer soberano? Um país que favorece empresas estrangeiras de navegação com todos os benefícios que a falta de regulação pode proporcionar, pode ser dizer soberano? Um país cujas autoridades confundem a abertura da navegação com a baderna, pode se dizer soberano? 

Um país que favorece empresas estrangeiras em detrimento das nacionais e que não incentiva a criação de uma frota nacional de navios mercantes e que não tem uma política de Marinha Mercante, pode se dizer soberano? Um país sem Marinha Mercante, que é a 6ª economia do mundo, mas não tem infraestrutura no seu comércio exterior, pode se dizer soberano? Um país cujas autoridades tratam a navegação mercante como coisa marginal, pode se dizer soberano? Um país onde o órgão regulador descumpre a Constituição, pode se dizer soberano?

Foto: Reprodução Internet

Brasil cambaleante no setor de navegação

É muito triste ver um país com dimensões continentais, com mais de 8.000 km de costas muito bem alinhadas, que tem toda condição natural de possuir uma navegação forte, entregar tudo que temos em troca de ganhos particulares de alguns poucos. Empresários que tentam entrar no setor, como a Maestra, quebram em menos de cinco anos e desistem do modal aquaviário, por falta de regulação eficaz. A quem interessa o Brasil não ter uma política para fortalecimento da sua armação? A quem interessa a fuga de mais de 20 bilhões de dólares todos os anos sem controle? A quem interessa o enfraquecimento da nossa Marinha Mercante? A quem interessa o descontrole e a falta de regulação sobre as atividades de empresas de navegação estrangeiras? 

Tudo no Brasil funciona a base de voto e de eleição. A nossa navegação mercante não é algo que preocupe tanto assim o nosso povo e, por isso, não está inserido em um dos programas do governo. Se navegação desse voto e o povo acompanhasse de perto o setor, com certeza, já teríamos um programa do Governo Federal com nomes bem populistas e sugestivos, tais como: “meus navios, minha soberania”, “navegar é preciso”, “navegando para o futuro” etc. 

Navegação pode não dar votos, mas, de certo, propicia a conquista de votos através de campanhas e eleitorais bem abastadas, que visam tão somente ludibriar o povo. Nossos governantes e políticos não dão ponto sem nó. A captura do Estado pelos interesses de poucas empresas com capital transnacional, muito bem organizadas, em detrimento de milhões de usuários desorganizados, é uma das características do setor. Por isso a falta de incentivo do poder concedente para a criação de associações de usuários, embora seja uma obrigação da Lei de Concessões. Alguém está ganhando e muito com a nossa falta de soberania. Alguém está ganhando muito com baderna e a falta de controle sobre a nossa navegação de longo curso, cuja impossibilidade de se ter uma empresa brasileira atuando no setor é tão grande, que afeta, até mesmo, o desenvolvimento da cabotagem. Alguém está ganhando muito com a degradação e extinção da nossa Marinha Mercante, que agoniza em berço esplêndido. 

Não, o Brasil não é soberano. Isso pode estar na nossa Constituição e nas nossas Leis. Contudo, soberania não é algo que se tenha no papel, ou que se tenha pela metade. A propósito, a obrigatoriedade das outorgas de autorização para armadores estrangeiros também está na Constituição e na Lei. Regulação de empresas de navegação estrangeiras também está em letra de Lei. Mas, no mundo do politicamente viável, leis são usadas ao bel prazer dos interesses de poucos. 

Não existe aquela regra de que para alguém ganhar, alguém tem que perder? Logo, podemos concluir que a perda da nossa soberania esteja significando o ganho de alguém que se diz brasileiro, político e íntegro. 

Investimos bilhões de dólares em refinarias sucateadas, investimos no porto de um país governado por ditador, mas não investimos um centavo sequer na criação de empresas brasileiras de navegação fortes e na construção de uma frota de navios porta-contêineres.

A falta de cultura marítima contribui para esse enorme déficit de maritimidade. Isso também é fruto de um isolamento que o nosso setor passa há anos. Esse isolamento interessa a pequenos grupos que querem manter suas galinhas dos ovos de ouro bem guardadas, para que não sejam vistas e não atraiam os olhos gordos de outros iguais.

Enquanto diversos países estão atentos ao problema das suas navegações, nós ainda estamos discutindo com o órgão regulador o cumprimento da Constituição de 1988 e de uma Lei de 2001. 

Em nome dos votos e do politicamente viável, nossa navegação já afundou e a soberania do Brasil foi para o espaço.

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