Sexta, 26 Abril 2024

Foram os manifestos da Semana de Arte Moderna de 1922 e da Antropofagia de 1929 que deram o tom da vanguarda literária brasileira nos anos 20. No mesmo momento no Peru é um livro mesmo, explorado como objeto poético, que cristaliza o avanço vanguardista. Estou falando de 5 metros de poemas, de 1927, de Carlos Oquendo de Amat (1905-1936), um livro acordeão que se desdobra até atingir cinco metros, cheio de imagens e uma diagramação inovadora.

 

Oquendo tomou parte do mais expressivo grupo da vanguarda literária peruana, ao lado de César Vallejo, Martín Adán e César Moro. Nos 5 metros de poemas encontramos algumas imagens portuárias, como em Porto, escrito, assim como todo o livro, sob a influência dos movimentos ultraísta, que Borges levou da Espanha para a Argentina, e surrealista. A seguir, a primeira tradução do poema no Brasil.

 

Porto


O perfume virou uma árvore

e voam as cores

dos transatlânticos

        
                   No cais

                   de todos os lenços se fez uma flor

 

Vai cantando a música linear de um barco

e o calor pasta a lua

 

De uma taverna

um marinheiro

tira das garrafas filmes projetados da infância

Ele á agora Jack Brown que persegue o cowboy

e o assovio é um cavalo do Arizona.

 

UM SUSPIRO ATRÁS DA MONTANHA

E para que ria

 

a brisa traz

as cinco pétalas uma canção

 


Na imagem, é possível notar a diagramação inovadora

 

Outro achado é Antuérpia, poema que leva o nome da cidade portuária Belga.  Abaixo, a parte final do poema em que o porto é chamado de “envelope postal do mundo”. A diagramação, assim como em Porto, segue a da coletânea onde os poemas foram encontrados.

 

         Antuérpia

 

O  c a l o r  é  c o m o  u m  p e n s i o n i s t a

 

                   Antuérpia


         É A CIDADE LÍRICA             É A CIDADE ELÁSTICA

 

                            É a cidade sem distâncias

                            as ruas são suspensórios de borracha

 

As crianças no primário aprendem o problema da locali-

(zação

         e assim como por um chapéu

                                      (ato mecânico)

         basta esticar uma esquina

         para se sentir projetado da escola para a porta das

(docerias

 

Antuérpia

 

                                                        é um vinho de amizade

                                               é o envelope postal do mundo

 

         agora

 

         Os navios educados           e há saudações para América

         regressam a seus ninhos              nas fontes de água.

 

Encontrei os dois poemas na coletânea Vuelta a la otra margen (Volta à outra margem), editada em 1970, que, além de Oquendo, Moro e Adán, traz também poemas de Emilio Adolfo Westphalen, Jorge Eduardo Eielson e Leopoldo Chariarse. De acordo com os selecionadores Mirko Lauer e Abelardo Oquendo, o motivo da coletânea foi que naquele momento não se editavam mais esses poetas. E agora eles chegam aqui neste Porto Literário.

 

Pós escrito

Agradeço publicamente o poeta Óscar Limache, que me levou ao Paraíso dos Livros, reunião de bancas de livros usados no centro de Lima onde pude conseguir estas e outras jóias da literatura peruana, sem contar uma edição em espanhol de La Barcarola, de Pablo Neruda, com o poema Santos Revisitado, que até o momento só conhecia na tradução da editora LP&M.

 

Referência

Carlos Oquendo de Amat. Puerto e Amberes. In: Vuelta a la outra margen. Seleção de Mirko Lauer e Abelardo Oquendo. Lima, Peru: Casa de la Cultura, 1970.

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