Há um estranho confronto de informações entre a diretoria da Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp) e a Granel Química envolvendo a capacidade de movimentação de líquidos no Porto de Santos. Vencida em leilão pela firma Ageo Norte Terminais na disputa da área do terminal, cujo contrato expirou após 27 anos, a Granel está desmontando sua estrutura especializada para a movimentação de produtos químicos na Ilha Barnabé, na Margem Esquerda do porto. O gerente geral da Granel, Marcelo Schmitt, informou à imprensa que a movimentação de importantes produtos pode ficar impossibilitada por até cinco anos. A Codesp nega.
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O gerente também sustenta que a Codesp poderia e não fez, como em situações similares, ter considerado no valor da outorga a indenização de tanques e tubulações instalados como benfeitorias na área arrendada. Toda essa infraestrutura será desmontada no prazo de cem dias e vendida como sucata. Já a diretoria da Autoridade Portuária garante que não haverá descontinuidade na movimentação de líquidos na Ilha Barnabé, pois será absorvida pelo parque de tancagem instalado no complexo portuário. Não foram, porém, esclarecidas questões pontuais relacionadas à ameaça ao mercado.
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Cabe à Codesp explicar se foi previsto no processo de licitação o fato de a Granel Química ser a única empresa no complexo portuário com estrutura para movimentar cargas especializadas como o caulim – matéria-prima para o papel e celulose –, depositado em seus tanques agitadores dinâmicos, bem como na armazenagem de gasolina de aviação civil para jatos particulares, cujos tanques são homologados pela Agência Nacional do Petróleo (ANP). Há que se provar que não haverá descontinuidade dessas operações até que a Ageo esteja em condições de operar.
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Caso as explicações não sejam consistentes, a Codesp promoveu um grave desinvestimento no negócio do mais importante complexo portuário do País. Será como jogar gasolina no fogo que arde o desempenho da indústria nacional, com queda mensal de 1,3% e anual de 6,1%. Este fato é mais um alerta da ameaça que persiste com as tomadas de decisões sobre o destino dos portos a partir de Brasília. Tal linha, aliás, já foi rejeitada, inclusive nas urnas.
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Parodiando velho adágio, o negócio portuário também engorda com os olhos dos interessados diretos. Isso implica perceber e valorizar os fatores impulsionadores e as funções do porto. Como ensina o professor de Harvard Michael Porter, a essência da formulação estratégica consiste em enfrentar a competição. Situação inviável em um regime de decisão centralizada, gestores atendendo aos interesses políticos ou corporativos desalinhados do negócio e planejamento montado a quatro mãos, como sustenta o secretário de Portos, Diogo Piloni, bem como sem referencial consistente.
Daí o imbróglio do terminal de líquidos no Porto de Santos, por total ausência do papel harmonizador da Autoridade Portuária. É de gestão técnica que precisamos, não de "gestão" político-partidária.