Costuma-se dizer que os tempos atuais são bem mais agitados que os vividos por nossos bisavós. Que antes a vida era pacata, o tempo sobrava, chegava a ser monótono, enquanto hoje o tempo voa, fazemos mil coisas. Será mesmo? Descobri que não. Produzimos muito calor e pouca luz. Mesmo com toda a tecnologia e os avançados equipamentos, fazemos muito menos que nossos antepassados.
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Seria covardia compararmo-nos ao tempo das pirâmides, que demoraram gerações para serem construídas (mas estão lá até hoje, enquanto certas obras atuais desabam antes da conclusão). Volto no tempo apenas ao início do século passado.
Em quatro anos (1902-06), o prefeito Francisco Pereira Passos mudou totalmente o Rio de Janeiro, saneando e urbanizando, criando avenidas, passeios e jardins: de um amontoado de cortiços fez a Cidade Maravilhosa. Em Santos, Saturnino de Brito construiu a rede de canais que transformaria a cidade. São Paulo também mudou drasticamente então. Ferrovias eram criadas aos milhares de quilômetros por ano. Portos surgiam e cresciam rapidamente. Mesmo em meio às crises do café, havia muitos outros exemplos assim.
Hoje, o dinheiro sobra nos cofres oficiais e nos bancos, temos centenas de universidades, ensino via Internet, moderna rede de telecomunicações (em 1960, era preciso encomendar um telefonema interurbano, e a ligação poderia demorar 24 horas ou mais) e o mundo quer investir no Brasil.
Foto: Bobby Fabisak/ JC Imagem
Obras da transposição do Rio São Francisco têm ritmo muito
mais lento do que o anunciado pelo Governo Federal
E o que temos, entretanto? Andamos de PAC em PAC, mal saímos do lugar. Festeja-se estrondosamente o início de uma obra, e dez, vinte anos depois, comemora-se a retomada dos trabalhos. Todas as previsões de término falham espetacularmente: qualquer obra a ser entregue no próximo semestre, temos que nos felicitar se vivermos para vê-la concluída.
Faltam projetos, empresas e profissionais habilitados, vontade política de completar o que é iniciado. Obras que com a tecnologia de 1913 estariam prontas em dois anos, hoje demoram décadas só para chegar ao projeto final. A ser alterado...
Alguns exemplos, só no entorno do porto santista: o túnel entre Santos e Guarujá, sob o estuário do porto, tem projeto de 1927, dezenas de promessas solenes, maquetes (virou ponte várias vezes), mas não sai do papel. O Veículo Leve sobre Trilhos (VLT), na Baixada Santista, é planejado há mais de uma década, consumiu toneladas de papel, mas nenhum passageiro foi transportado.
Imagem: Divulgação
Ponte Santos-Guarujá só existe em projeções
Nesse mesmo tempo, o complexo rodoviário Anchieta-Imigrantes permanece um caos, prejudicando o porto: há dias, festejou-se muito o início de uma obra pontual de interligação, que sequer resolve 5% do problema, e para o resto nem há previsões. Em termos ferroviários, existem planos de ampliação, as eternas promessas, mas...
Até poucas décadas atrás, só se festejava a entrega da obras (se não atrasasse). Agora, festeja-se até maquete, outra assinatura ou nova carimbada, marcando o avanço de um passo na longa caminhada até que algo comece. Não se faz mais um projeto global, a ser cumprido. Agora, ele é retalhado infinitamente, e com esse fatiamento, também se fatiam carimbadas, financiamentos, responsabilidades, inaugurações... e nada sai, nada anda. Apenas o dinheiro segue... para os bolsos dos infinitos projetistas, consultores, facilitadores, especialistas...
Isso, no Brasil. Porque, no Japão em crise, as estradas já foram consertadas e as cidades refeitas, após o terremoto-maremoto-tufão-tsunami-desastre nuclear que atingiu aquele país. Lá, o tempo continua acelerado, não é como aqui...