Quinta, 25 Abril 2024

O texto apresentado por esta coluna na semana passada produziu um debate rico e interessante. A idéia apresentada pelos comentadores, independente dos pontos de vista, é que o sindicato atual não se relaciona com a base, tornou-se distante e seus dirigentes foram cooptados pela atual estrutura, distanciando-se não apenas corporalmente, mas ideologicamente.

 

Neste sentido, vale a pena retomar a questão e apresentar um livro que nos auxilia na compreensão da atual estrutura sindical. A obra O Sindicalismo de Estado no Brasil: Uma análise crítica da estrutura sindical, do Prof. Dr. Armando Boito Jr., foi publicado em 1991, logo após a promulgação da Constituição de 1988, o que não interfere na análise de Boito, que faz um breve parêntese sobre a questão sindical na Constituição Cidadã.

        

O objetivo da obra é analisar a estrutura sindical existente no Brasil, “da particularidade dessa estrutura e da função política que desempenha” (p. 11). Para isso, Boito apresenta 5 teses, as quais buscará, através da matriz teórica do marxismo estrutural[1], aquele que busca compreender o conflito através da análise das estruturas jurídico-políticas e de como as ideologias determinam a prática dos agente sociais, demonstrar ao longo do trabalho. São elas:

 

1) a estrutura do sindicato de Estado fixa limites intransponíveis à prática sindical, e o faz de tal modo que esse aparelho acaba por desempenhar a 2) função exclusiva e permanente de desorganizar o movimento sindical das classes trabalhadoras. Nessa análise, uma função precisa é atribuída à ideologia sindical própria do sindicalismo de estado: 3) é essa ideologia que permite a reprodução do sindicato oficial e que torna eficiente os seus mecanismos desorganizadores, na medida em que induz todas as correntes sindicais nacionalmente representativas a aderirem ao sindicato oficial e 4) a aspirarem, mesmo quando no plano do discurso afirmam o contrário, a tutela do Estado sobre a organização sindical. Tal aspiração é, com forme procuraremos argumentar, a característica básica da ideologia do sindicalismo de Estado e nada mais significa do que 5) uma manifestação localizada da ideologia populista (p. 12-13)

 

Segundo as teses apresentadas por Boito Jr., a ideologia populista, que teve grande força durante as décadas de 1950 e 1960 e rendeu vários estudos [2] é responsável pelo atrelamento dos sindicatos ao Estado. Para Boito Jr., essa ideologia coopta o sindicato ao Estado em uma relação que não é apenas legal, mas tornando o sindicato parte da estrutura do Estado. Isto, pois, o sindicato, como conhecemos até hoje, só existe porque o Estado determina. Cabe ao Estado, através da investidura sindical, determinar qual instituição é válida e “merecedora” das benesses trazidas pela investidura, como o famoso imposto sindical. Ou seja, cabe ao Estado dizer qual o sindicato que ele quer oficializar, aquele que para ele e para os empresários estará mais firmemente ligado aos interesses capitalistas.

 

Desta forma, diz Boito Jr., o sindicato é legal, pois possui a carta sindical que o permite atuar em sua base territorial, porém, ele não é legítimo, pois em muitos casos, a relação entre o sindicato e os trabalhadores que os representam é praticamente nula, tal como vimos nos comentários expostos sobre o texto da semana passada. E para Boito Jr., a Constituição de 1988 só aumentou mais a relação de dependência entre sindicato e Estado, visto que alça o sindicato a matéria constitucional e em seu artigo 8º assegura a existência de um único sindicato por base territorial e garante a estabilidade de emprego aos dirigentes sindicais. A investidura sindical, além do imposto, garante o monopólio da representação aos sindicatos legais.        

 

Para Boito Jr., é a investidura e o imposto sindical que atrapalham o fim da unicidade sindical. Isto, pois, como poderá ser feita a partilha dos dividendos resultantes do imposto? A quem será destinado? Como será destinado? A investidura sindical e o imposto sindical “castram” a liberdade, a representatividade e a combatividade dos trabalhadores. Enquanto o modelo do sindicalismo de Estado resistir, é praticamente impossível conseguirmos sindicatos combativos, pois estes estão preocupados apenas com a manutenção das benesses proporcionadas pelo sistema.

 

Não estou dizendo que não existam sindicatos combativos, bem relacionados com a base, que buscam a melhor forma de representar seus filiados e conseguir melhores condições de vida para seus trabalhadores. Porém, o quadro geral é composto por sindicatos de carimbo, que possuem a legalidade, mas não a legitimação. No domingo, 28/09/2008, o Jornal o Estado de São Paulo [3] publicou um breve artigo falando da distância entre os sindicatos e a base e como a legislação atual é responsável por esse fator. Apresentou dados da Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios que mostram que ao mesmo tempo em que aumenta o emprego formal, diminui o número de trabalhadores filiados aos sindicatos. Também coloca que com a automação eletrônica, grande parte dos empregos migrou do setor fabril, velho conhecido das lutas sindicais, para o setor de serviços, onde a tradição sindical é baixa. Mas, como lembra Boito Jr em outro texto [4], trabalhadores como portuários, ferroviários e bancários mostram que o setor de serviços também possui tradição de luta. Mas, cadê a luta? Cadê o conflito? Onde estão os sindicatos para auxiliar a base? E onde está a base para impulsionar os sindicatos ao fortalecimento?

 

Caso queiramos um sindicato que realmente represente os direitos dos trabalhadores devemos lutar pelo fim da atual estrutura sindical, devemos pedir o fim do sindicalismo de Estado e de todas as suas conseqüências e claro, devemos nos aproximar de nossas instituições, ir para assembléias, formar chapas, votar nas eleições sindicais, lutar pelos seus companheiros. Afinal, a estrutura não se modifica sozinha, ela precisa que os agentes não se mantenham de braços cruzados. Afinal, como diria Marx, os homens fazem a sua história. E a história do movimento sindical brasileiro não é feita pelo Estado, mas pelos trabalhadores que diariamente lutam por uma vida melhor e mais justa.

 

Referência bibliográfica

BOITO JR. Armando. O Sindicalismo de Estado no Brasil: uma análise crítica da estrutura sindical. São Paulo/Campinas: Hucitec/Editora da Unicamp, 1991

 

Leia também

* Por um sindicato menos burocrático

* Trabalho e sindicato: metamorfoses de uma relação



[1] Para saber mais sobre o marxismo estrutural ver as obras de Louis Althusser, Nicos Poulantzas, Maurice Godelier e Etienne Balibar.

[2] Cf. IANNI, Octavio. O Colapso do Populismo no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1971; BOITO, Jr. Armando. O golpe de 1954: a burguesia contra o populismo. São Paulo: Brasiliense, 1982 WEFFORT, Francisco. O populismo na política brasileira.3ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1986 , entre outros.

[3] CALDAS, Suely. Sindicatos ricos e fracos. In O Estado de São Paulo. 29.set.2008. p. B2

[4] BOITO JR., Armando. O sindicalismo tem futuro? In Revista PUCviva. São Paulo: ano 3, n. 11,  jan-mar 2001. p. 12-17

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