Criador e Editor do Site dos Usuários dos Portos do Rio de Janeiro
Foram, no mínimo, seis teses desenvolvidas pela Antaq para fugir do seu dever constitucional de outorgar autorizações aos armadores estrangeiros. Citaram tratados internacionais inexistentes e/ou inaplicáveis, criaram diversas interpretações legais, sempre com o intuito de chegar ao Art. 5° da Lei 9.432/97, que sequer é cumprido, pois, ao contrário do que prega o nosso órgão regulador, o fato de a nossa navegação de longo curso ser aberta aos estrangeiros, não a torna uma porteira escancarada. Simplesmente, a Agência se vale da existência de míseros 13 acordos bilaterais que o Brasil tem celebrado e os usa como mecanismo legal para afirmar que existe controle, quando, na verdade, esses acordos respeitam a Constituição e não tratam de outorgas de autorização, sequer cobrem os países sedes dasmega carriers e sequer abrangem os paraísos fiscais que fornecem bandeiras de conveniência (atualmente, segundo dados da ITF - International Transport Workers' Federation (www.itfglobal.org), cerca de 70% da tonelagem mundial está registrada em 34 paraísos fiscais). A Lei 9432/97, usada pela Antaq como justificativa legal para não outorgas as autorizações aos estrangeiros, determina no Inciso III do Art. 1° que a navegação de longo curso brasileira é aberta apenas para embarcações e empresas de países que possuem acordos bilaterais com o Brasil. Ou seja, existe ilegalidade até na tese do regulador. Por isso, não é exagero afirmar que estamos no fundo do poço na navegação de longo curso, que pode ser explorada por qualquer um, uma porteira escancarada, sem fiscalização, regulação e supervisão da Agência Reguladora.
O fato é que, em mais de 13 anos de existência, a ANTAQ, diante de sua interpretação (omissão) histórica, ainda se recusa a outorgar as autorizações aos estrangeiros, não regulou a navegação de longo curso, não controlou as rotas de linhas regulares, não fiscalizou e autorizou as joints ventures entre armadores estrangeiros, não fiscalizou a qualidade da prestação de serviços dessas empresas, não acompanhou os preços de fretes, THC, demurrages e taxas extrafretes (surcharges) impostas aos usuários. Em mais de 13 anos nada foi feito e não temos sequer uma resolução da Agência que trate da armação estrangeira. Não temos sequer Regulamento Marítimo.
Dentre as diversas teses desenvolvidas pela ANTAQ, duas em especial, que não são jurídicas e que também não podem ser consideradas técnicas, chamaram muita atenção pela gravidade das alegações e pelo fato de terem sido elaboradas através de ofício. Trata-se da “Tese do Isolamento do Brasil” e do “Aumento de Frete”, caso o país (que hoje é área de serviço do mundo), ouse a autorizar empresas estrangeiras a explorarem sua navegação de longo curso e tenha a petulância de Organizar o Estado e assumir a sua competência exclusiva de autorizar empresas estrangeiras a explorarem um setor extremamente estratégico para o país.
A “Tese do Isolamento do Brasil”, ou de Brasil-Antaq-Ilha, tenta nos induzir a acreditar que o Brasil sofreria um verdadeiro embargo econômico, se outorgasse as autorizações, afirmando que os armadores estrangeiros perderiam interesse pelo país e não mais trariam seus navios para cá - “A outorga de autorização a empresas estrangeiras, sob o ponto de vista prático, esbarra na inviabilidade (...), sob pena de inviabilização da navegação brasileira a outros países, e nesse particular, com o risco de o País se isolar, de maneira contrária à teologia da Lei n° 9.432, de 08 de janeiro de 1997 – lei específica e marco regulatório do setor – o que não se mostra viável dado o estágio de globalização atingido, devendo viger a liberdade de tráfego de embarcações estrangeiras no País para a navegação de longo curso - Ora, como a ANTAQ chegou a essa conclusão? Existem estudos técnicos, ou análise de impacto regulatório que confirmem essa tese de isolamento? Foram os armadores estrangeiros que alegaram isso? Uma ameaça? A Agência precisará comprovar essas alegações e os usuários cobrarão os estudos. Aliás, não é estranho a Agência ter medo de fuga de armadores estrangeiros e nada fazer para fomentar a entrada de armadores brasileiros no mercado de longo curso, criando uma política de Marinha Mercante eficiente, propondo ao governo soluções?
A tese do “Aumento de Frete”, talvez, seja a mais grave e, com certeza, é a que causa maior indignação, porque o regulador admitiu tratar-se de “um mercado naturalmente oligopolístico, com um potencial aumento no preço do frete”. Não pode a Agência Reguladora de um país admitir a existência de oligopólio em um setor e, simplesmente, permanecer inerte na regulação, na fiscalização e na supervisão das atividades dessas empresas estrangeiras no Brasil. Não pode o órgão regulador de um país admitir a existência de um oligopólio e, simplesmente, não priorizar a edição de um regulamento marítimo que contemple a regulação 360°do setor. Não temos legislação para fiscalizar, regular, supervisionar e punir a armação estrangeira? Por que, a ANTAQ, ao saber que temos menos de 1% do nosso comércio exterior transportado em bandeira brasileira, e que deve fazer estudos e política de Marinha Mercante, permite o oligopólio? Por que ela, como determina os arts. 31 e 32 da Lei n. 10.233/2001 não comunicou o CADE, já que o cartel é uma infração à ordem econômica? O que justifica essa omissão? Qual o impacto do cartel do armador estrangeiro na atividade dos terminais portuários, especialmente os sem poder de barganha? Qual o impacto do cartel do armador estrangeiro nos terminais verticalizados, tais como os Portos de Itapoá e Itajaí, dos quais são sócios armadores estrangeiros?
Não admitiremos a imposição do terror e do medo. Exigiremos estudos técnicos que comprovem tais alegações e cobraremos responsabilidades. Estamos perto da revisão da Resolução 2.389/12-Antaq, que trata do THC. Independente de ser submetida à Audiência Pública, estamos prestes a dar continuidade ao escárnio de permitir que despesas portuárias, tarifas portos organizados, continuem em poder da armação estrangeira, que está fora da regulação setorial, interferindo ainda mais na concorrência entre terminais. Não basta os armadores estrangeiros escolherem os terminais que seus navios atracarão e, consequentemente, ter o poder de definir aquele que receberá cargas para movimentar e armazenar? Se a revisão do normativo trouxer em seu texto a autorização para a continuidade do THC, exigiremos que a ANTAQ explique tecnicamente a sua decisão, com o agravante de estar entregando a um mercado “naturalmente oligopolista” as cobranças de serviços prestados por empresas operadoras portuárias brasileiras. Será que um mercado oligopolista, sem regulação no Brasil, permite ao usuário redução de custos com o THC?