Criador e editor do site dos Usuários dos Portos do Rio de Janeiro
A diretoria da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) tem orgulho de afirmar que uma de suas grandes funções é a interpretação da Constituição e das nossas Leis, porém, deixando o efetivo cumprimento para segundo plano, de acordo com a sua conveniência. Em outras palavras, não vale o que a Lei determina, vale o que a Antaq interpreta e a tese que ela montará. O problema é que, curiosamente, essas interpretações e teses, produzidas por mentes brilhantes, elogiadas em Reunião de Diretoria, vão sempre em direção ao menor esforço regulatório, ou seja, rumo à omissão e em prejuízo ao Brasil, aos usuários e aos cidadãos. Por isso, podemos afirmar, sem margem de erros, que não temos regulação na Antaq. Ainda que a Agência tenha um corpo de servidores muito preparados, lamentavelmente, jamais conseguirão se sobrepor a politicagem que toma conta do setor através dos Amigos do Rei.
Estamos diante da Audiência Pública que trata da Resolução nº. 4.262-ANTAQ de 31 de julho de 2015, que dispõe sobre outorgas de autorização de armadores. Da leitura do normativo, nota-se que o regulador pretende continuar a exigir apenas das empresas nacionais, através de outorgas de autorização, uma série de requisitos técnicos, econômico-financeiros, jurídico-fiscais, dente outros, demonstrando o peso das mãos do estado sobre os nacionais para que possam participar da exploração da navegação de longo curso brasileira. E o que está sendo exigido dos estrangeiros? Nada, pois, segundo a interpretação omissa da Antaq, a nossa navegação de longo curso é aberta aos armadores, às empresas de navegação e às embarcações de todos os países, menos as do Brasil. Para garantir sua omissão toda uma tese foi montada entorno o Art. 5° da Lei nº. 9.432/97.
No entanto, cabe observar que a ANAC e a ANTT também abrem a exploração de seus seguimentos aos estrangeiros, mas, nem por isso, deixam de observar a legalidade e a moralidade e fazem com os de fora a elas se submetam para buscar suas autorizações, pregando respeito também aos princípios constitucionais da reciprocidade, garantindo, minimamente, igualdade aos nacionais. Enquanto isso, a Antaq pratica uma verdadeira covardia regulatória com as empresas nacionais.
Assim, como estamos aprofundando nossos estudos sobre as outorgas de autorização, decidimos buscar todas as informações sobre a Lei que a Antaq usa para garantir aos estrangeiros toda essa vantagem da abertura automática da nossa navegação de longo curso, enquanto os nacionais precisam fazer um esforço enorme para abri-la, vez que a eles, segundo a diretoria da agência, está automaticamente fechada. Qual foi a intenção do legislador com a Lei nº. 9.432/97? Seria, de fato, criar essa desigualdade produzida nas interpretações e teses da Antaq, que apenas favorece aos estrangeiros?
Bem, nossas pesquisas nos levaram ao Dossiê do Projeto de Lei n°. 1.125, de 1995, convertido justamente a Lei que a Antaq usa para pisar no principio da isonomia e favorecer empresas estrangeiras. Nas folhas 09 e 10 (clique aqui para ler o documento), em carta enviada ao Ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o legislador mostra quais foram suas reais intenções com a Lei que regulamentou o Art. 178 da CF/88. Não se assustem, mas o que o legislador desejou é bem diferente do absurdo que a diretoria da Antaq vem chancelando. Abaixo segue um pequeno trecho:
“Trata-se de iniciativa da maior significação, no sentido de obter a redução do custo do transporte aquaviário, uma vez que proporcionará substancial aumento da competitividade no setor, sem, contudo, expor a frota nacional a uma concorrência desequilibrada com as empresas estrangeiras. Ao abrir a exploração da navegação marítima e fluvial às embarcações de outros países, A NORMA PROPOSTA AS SUBMETE ÀS MESMAS EXIGÊNCIAS ESTABELECIDAS PARA AS BRASILEIRAS, ensejando o direcionamento dos esforços para a busca da eficiência, já que esta, no caso, passará a ser a determinante do sucesso nos empreendimentos do setor”
Notem que a verdadeira intenção do legislador seguiu o princípio da isonomia entre os nacionais e estrangeiros, quando ele afirma: “(...) A NORMA PROPOSTA AS SUBMETE ÀS MESMAS EXIGÊNCIAS ESTABELECIDAS PARA AS BRASILEIRAS (..)”. Embora fosse desejo do legislador submeter os estrangeiros as mesmas exigências dos nacionais, o destino foi cruel com as empresas brasileiras de navegação (EBNs), pois colocou em seu caminho uma agência reguladora que deu aos estrangeiros toda liberdade do mundo.
Perguntamos, então: E se uma empresa estrangeira que venha explorar a nossa navegação de longo curso estiver sem liquidez no mercado? E se não tiver condições financeiras de fazer frente aos riscos das suas operações no país? E se não preencher requisitos técnicos, econômico-financeiros, jurídico-fiscais exigidos pela Antaq dos nacionais? Como saberemos? A resposta é simples: jamais saberemos, pois quem tem o dever de zelar pelo cumprimento dessas garantias, assim como faz e exige dos nacionais, simplesmente, se omite. A omissão vem com tanta força, que nos causa estranheza, pois mais parece uma proteção.
Estamos apenas diante um resultado produzido pelo desrespeito à CF/88, a Lei nº. 0.233/2001, a própria Lei 9.432/97 e Código Civil. Como sempre diz o Advogado Osvaldo Agripino, nossa legislação é um motor de Porsche que a Antaq insiste em querer encaixar em um fusca. Simplesmente, essa gambiarra não funcionará. Todo arcabouço jurídico brasileiro não excepciona nacionalidades para obtenção das autorizações. Quem faz isso é a Antaq e para favorecer a armação estrangeira. Como não pensar em favorecimento?
Mais uma vez afirmamos que a Antaq produziu uma gambiarra, que se converte em ofensa aos direitos das EBNs explorarem a nossa navegação de longo curso. Esse é o preço caro que o Brasil paga por ter um regulador omisso e descomprometido com políticas de Marinha Mercante. Em qualquer país minimamente sério, jamais uma agência reguladora criaria entraves burocráticos para dificultar a entrada e a participação de nacionais na sua própria navegação de longo curso. Em um país sério, as empresas nacionais seriam apoiadas. No Brasil, o regulador prejudica os nacionais. Vergonha!
Basta ler a Resolução nº. 4.262-ANTAQ de 31 de julho de 2015 e constatar que, para a Antaq, os estrangeiros gozam do princípio de que todos os requisitos e exigências foram cumpridos. Para a Antaq, estrangeiros são bons e capazes, perfeitos para operarem aqui, inclusive os armadores trampse aqueles sediados em paraísos fiscais, as empresas de mala, etc. que não conseguem oferecer garantias mínimas. Já as empresas brasileiras, para o nosso regulador, gozam do principio da incapacidade e precisam lutar para provar que também são boas e capazes. Ai das nacionais, se não tiverem certidões negativas de débitos! E as estrangeiras possuem esss CNDs em seus países?
É nesse passo vergonhoso que se inicia a política de Marinha Mercante da Antaq. Ou seja, exigir tudo dos nacionais, dificultar a entrada deles na navegação de longo curso e arregaçar as porteiras aos estrangeiros, em ato de irresponsabilidade, ilegalidade e imoralidade. Para sustentar sua tese e garantir essa vantagem aos estrangeiros, a agência não mede esforços, prega o medo do isolamento do país e do aumento de fretes e demais cobranças, sem estudos técnicos, mente, etc.
Enquanto isso, acompanhamos as notícias do setor dando conta de que os diretores da Agência apoiando a cabotagem, quando, no segmento de contêineres, uma empresa para atuar nessa navegação, necessariamente, precisará da navegação do longo curso para dar eficiência aos seus fluxos. Qual cabotagem a Antaq deseja? A dominada por empresas estrangeiras, que continuarão fora da regulação, porém, no controle de empresas nacionais? Ou a que permita o surgimento empresas nacionais através de uma política setorial eficiente?