Terça, 19 Março 2024

Demurrage é termo relacionado ao Direito Marítimo e sinônimo de sobre-estadia, tanto de navio como de contêiner. Originariamente utilizado para se referir à contraprestação devida em razão de se ter extrapolado o prazo acordado em contrato para as operações de embarque e desembarque da carga do navio, com objetivo minimizar o prejuízo daí advindo.

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Ao se falar sobre a natureza jurídica da demurrage de navio, é possível vislumbrar dois posicionamentos conflitantes, sendo para uns multa e para outros suplemento de frete. Entretanto, frete não pode ser confundido com sobre-estadia, na medida em que aquele é cobrado em razão do deslocamento de mercadoria de um local para outro, e a sobre-estadia tem seu fundamento na não liberação do navio devidamente carregado ou descarregado no prazo estipulado.

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Foto: Harumaj/PixaBay License

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No transporte internacional de cargas, na modalidade de afretamento por viagem, o contrato firmado entre as partes é denominado charter party (carta partida). No bojo deste contrato estará estipulado o valor do hire (frete), e o prazo, sem custo adicional, dentro do qual o afretador deverá realizar a carga ou descarga das mercadorias do navio. Ultrapassado o referido prazo, que pode ser contado em dias (layday) ou em horas (laytime), haverá a incidência da demurrage, cujo valor estará expresso em dólar na charter party.

Como designativo da sobre-estadia de contêiner, que é verificada na importação quando o consignatário ou importador extrapola o prazo livre de cobrança estabelecido no Bill of Lading – BL (conhecimento de embarque marítimo) para que o cofre de carga seja desovado e devolvido, vazio e limpo, pronto para uso ao transportador; e na exportação quando o exportador ultrapassa o lapso temporal gratuito destinado à entrega do contêiner devidamente estufado (carregado com a mercadoria) ao transportador.

Relativamente ao contêiner, o prazo disponibilizado para o esvaziamento (na importação) e para a estufagem (na exportação), é chamado de free time. Na maioria das vezes tanto prazo do free time como o valor da sobre-estadia vem estipulado no BL (conhecimento de carga). Entretanto, quando o tempo livre para a operação não estiver descrito, deverá ser aplicado o prazo de acordo com os usos e costumes do porto em e encontrar o navio.

Até bem pouco tempo, não havia no Brasil legislação que tratasse especificamente das questões relacionadas à sobre-estadia, entretanto em 21 de dezembro de 2017, a Agência Nacional de Transportes Aquaviários – ANTAQ, editou a Resolução de nº 18 “que dispõe sobre direitos e deveres dos usuários, dos agentes intermediários e das empresas que operam nas navegações de apoio marítimo, apoio portuário, cabotagem e longo curso, e estabelece infrações administrativas”.

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A citada Resolução nº 18 no Capítulo II se ocupou Das Definições, trazendo no artigo 2º o significado de livre estadia e de sobre-estadia de contêiner:

Art.2º ...
XIX – livre estadia de contêiner (free time): prazo acordado, livre de cobrança, para uso do contêiner, conforme o contrato de transporte, conhecimento de carga ou BL, confirmação de reserva de praça (booking confirmation), ou qualquer outro meio disponibilizado pelo transportador marítimo;

XX – sobre-estadia de contêiner: valor devido ao transportador marítimo, ao proprietário do contêiner ou ao agente transitário pelos dias que ultrapassarem o prazo acordado de livre estadia do contêiner para o embarque ou para devolução;

Nos artigos 19 a 21 a Resolução trata dos parâmetros que devem ser utilizados para fixação dos valores da demurrage, para a contagem do prazo de livre estadia na importação e exportação; delimita a responsabilidade do usuário, do embarcador/consignatário, do transportador marítimo e do proprietário do contêiner.

Não resta nenhuma dúvida quanto ao avanço conquistado a partir desta RN, que apesar de não esgotar as necessidades, é de suma importância para a contínua evolução da legislação pátria no que diz respeito ao transporte marítimo como um todo.

Imperioso destacar, em relação à sobre-estadia que tanto na doutrina como na jurisprudência não há consenso no que tange à sua natureza jurídica. Há quem diga que tem natureza de cláusula penal, e os que defendem a natureza jurídica de indenização pré-fixada. Esta última é a corrente seguida pelo direito inglês, e que tem se mostrado como tendência entre os operadores do direito no Brasil.

Para considerar a demurrage uma cláusula penal, seria necessário a comprovação do dano sofrido, e isto não é necessário para a cobrança.

A sobre-estadia é entendida como tendo natureza jurídica de indenização pré- fixada uma vez que o valor atribuído a cada dia de atraso na devolução do cofre de carga é conhecido no ato da contratação do transporte marítimo, tanto é que consta do BL. A importância paga em razão da demurrage tem o condão de repor a perda, o prejuízo experimentado pelo transportador por não poder dispor do contêiner para uma nova operação, contudo não é necessária a demonstração do deste prejuízo.

Em que pese a característica de indenização ou de cláusula penal; o fato é que os valores pagos a título de demurrage tem alcançado cifras consideráveis e que não raras vezes ultrapassa inclusive o valor do frete; o que induz à conclusão de que a taxa da sobre-estadia vem sendo utilizada como forma de enriquecimento do transportador ou do proprietário do contêiner. O que deve ser coibido quiçá através da fixação de um teto para cobrança.

Outro ponto controvertido relacionado à demurrage de contêiner, é o relativo ao prazo prescricional de sua cobrança. Os operadores do direito marítimo levantam a possibilidade de prescrição ânua, trienal, quinquenal ou decenal. A prescrição anual é defendida pelos que entendem que após a revogação parcial do Código Comercial, incluindo o artigo 449 que tratava do assunto, é aplicável o artigo 22 da Lei 9.611/98 que dispõe sobre o Transporte Multimodal de Cargas, na medida em que o contêiner é parte integrante do navio, portanto integra o transporte multimodal. Quando não existir estipulação expressa do pagamento da demurrage em contrato, é levantada a hipótese de aplicação da prescrição prevista no artigo 206, § 3º, inciso V do Código Civil.

O prazo prescricional de cinco anos, é argumentado com base no Código Civil, em seu artigo 206, §5º, inciso I, que diz ser este o prazo para cobrança de dívidas líquidas fundadas em instrumento público ou particular. Consideram o lapso temporal de dez anos para prescrição os que entendem que tendo em vista a revogação parcial do Código Comercial, não havendo previsão expressa a este respeito relacionado à sobre-estadia, inteligência do artigo 205 Código Civil. De se notar que grandes controvérsias permeiam este tema, e para chegar a uma conclusão serão necessárias aprofundadas discussões.

Autora: Júnia Belizário dos Santos é advogada maritimista graduada em Direito e especialista em Ciências Criminais pela Universidade Estadual de Montes Claros - Unimontes, com vários cursos na área de Direito Marítimo pela Maritime Law Academy

Revisor: Profa. Dra. Eliane M. Octaviano Martins, pós-doutora pela Universidade Autônoma de Barcelona. Doutora pela USP. Professora da Maritime Law Academy. Autora do “Curso de Direito Marítimo”, volume I, II e III

 

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