No período compreendido entre 1905 e 1915, foram construídos nove transatlânticos para a mais famosa armadora britânica que operou na costa Leste da América do Sul, a Royal Mail (Mala Real). Eles ficaram conhecidos como embarcações da série “A”, por razões óbvias: o Aragon (1905); o Amazon (1906), o Araguaya (1906), o Asturias (1907); o Avon (1907); o Arlanza (1912), o Andes (1913), o Alcantara (1914) e o Almanzora ( 915). O único que possuía nome inglês era o Avon.
Esses navios possuíam uma estrutura avante onde ficavam situados a ponte de comando e o alojamento dos oficiais e era separada da superestrutura central. Possuíam vários guindastes, porão de carga geral e câmara frigorífica para transporte de carne argentina. Os ingleses possuíam fazendas de gado e frigoríficos naquele país.
Belíssimo cartão-postal, em pintura Oilette, mostrando
o elegante RMSP Aragon, passando nas proximidades da
Península de Lizard - Reino Unido.
Esses belos navios eram maiores que os seus antecessores, o Magdalena (1899) e o Danube. Este último foi construído em 1894 e deslocava 5.140 toneladas de arqueação bruta.
Na rota da África do Sul, Austrália e Nova Zelândia (colônias do Império Britânico) já navegavam navios de 12.000 toneladas. A rota da América do Sul já estava merecendo navios de maior tonelagem. Merecimento que foi realizado com as chegadas dos classes “A”.
Assim o Aragon foi o primeiro da série, construído pelo famoso estaleiro Harland & Wolff - Belfast lançado em 23 de fevereiro de 1905, e com viagem inaugural em 14 de julho desse mesmo ano, na linha Southampton/Buenos Aires, com os seguintes portos de escala: Cherburgo, Vigo, Lisboa, Tenerife (Canárias), Recife, Salvador, Rio de Janeiro, Santos e Montevidéu.
O elegante hall social do Aragon.
Suas principais características técnicas eram as seguintes: Comprimento: 156,41 m; boca (largura): 13,13 m. Deslocava 9.588 toneladas de arqueação. Passageiros: 305 na primeira classe, 66 na segunda classe, e 632 na terceira classe.
O Aragon possuía um porte elegante, o que diferenciava dos paquetes de outras nacionalidades. Sua primeira classe era muito luxuosa, com dependências decoradas com requinte, conforme mostram os cartões-postais originais do navio de passageiros, impressos na primeira década do século passado. Foram presente do colega e diretor do Sindicato dos Despachantes Aduaneiros, Carlos Alberto Giusti. Vale dizer que os cartões-postais eram um importante meio de publicidade da época.
O majestoso salão de jantar do paquete britânico
A Royal Mail, funcionou com o nome, Royal Mail Steam Packet Company de 1851/1932, e como Royal Mail Lines Limited, de 1932/1969. Nesses 118 anos ligando a Europa a América do Sul (costa leste).
Vieram 73 transatlânticos diferentes. Os mais lembrados são o Alcântara de 1927 e o Andes de 1939, logo comissionado pelo almirantado britânico para servir como transporte de tropas, durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945). A viagem inaugural foi em 1948, e navegou até o final da década de 1950, quando começaram a navegar os novos e modernos navios de passageiros, Amazon, Aragon e Arlanza.
O salão de fumar era normalmente só frequentado por cavalheiros
Outro transatlântico da Royal Mail Lines sempre lembrado pelos que apreciam o tema navios foi o Magdalena (o terceiro a receber o mesmo nome), que na viagem inaugural, em 1949, partiu seu casco em duas partes, após sofrer acidente, no Rio de Janeiro. Antes o navio passou por Santos, onde pegou carga e passageiros, com destino à Europa. Há artigo sobre o navio nesta coluna.
Uma coisa é certa: a Royal Mail Lines foi uma das armadoras mais conceituadas, que passaram pelo Brasil. Não Havia quem não conhecesse a Mala Real Inglesa, sua agência marítima funcionava, na Rua XV de Novembro, Centro de Santos.
Varanda, um dos locais a céu aberto frequentado por fumantes
Como os ingleses mantinham várias empresas na América Latina, seus diretores e altos funcionários procuravam viajar com seus familiares em navios de boa qualidade. Esses diferenciais encontravam não só na Royal Mail, como também nas concorrentes Blue Star Line e Lamport & Holt, que também gozavam de grande prestígio.
Aspecto luxuoso da cabine de primeira classe
Em Santos funcionavam várias empresas britânicas, como a São Paulo Railway, Companhia City de Santos (transporte coletivo e eletricidade), dirigida por muitos anos pelo Dr. Bernard Browne, que tem rua com seu nome, na Ponta da Praia, várias firmas exportadoras de café, agências marítimas, o Banco de Londres, que funcionava, na Praça Mauá esquina com a Rua Cidade de Toledo, e a Wilson,Sons - agência marítima e serviços de rebocadores, a única que ainda continua na ativa.
Ainda, não querendo fugir ao tema navios, era comum vermos cidadãos ingleses circulando pela cidade. Diga-se de passagem, trouxeram para cá vários dos seus costumes, como o hábito de passear (antes as pessoas não saíam de casa), convescotes, esportes, a semana inglesa (aos sábados, trabalho só até ao meio dia) e muitas outras coisas que fazem parte do nosso cotidiano, como o hábito de freqüentar clubes. O Santos Atlhetic Club, o conhecido Clube dos Ingleses, no seu início, era só freqüentado por membros da colônia britânica.
Fica aqui uma saudação da coluna Recordar ao Cônsul da Grã Bretanha em Santos, David Anthony Walton, pessoa de grandes qualidades e simpatia.
O transatlântico Araguaya, da classe "A", passando pela Ponta da
Praia, Santos, nas proximidades do local onde fica situada a linha das
balsas. 1907. Os classe "A" homenageavam os países por onde
passavam. Assim, Aragon-Espanha; Alcantara-Portugal; Araguaya-
Brasil (Rio Araguaia). Acervo: L.J.Giraud.
Fontes bibliográficas
South Atlantic Seaway (1983), de N. R. P. Bonsor
Rota de Ouro e Prata (1995), de J. C. Rossini