Recordar é sempre bom, pois nos faz ver acontecimentos em perspectiva, suas causas e consequências, rever os caminhos percorridos, corrigir rotas, traçar cenários possíveis e formas de alcançar as metas desejadas.
Isso nos traz de volta ao ano de 1981, especialmente o dia 7 de novembro. Transcorria na Faculdade de Ciências Econômicas e Comerciais de Santos um seminário sobre o desenvolvimento da Baixada Santista. Nesse dia, o caderno ‘Marinha Mercante’ do jornal ‘O Estado de São Paulo’ destacava a frase: “Falta um plano global para o desenvolvimento da Baixada Santista e seu Estuário”. Quem a proferiu foi o então superintendente de Transportes da Companhia Siderúrgica Paulista (Cosipa, atual Usiminas), Sérgio Mattos.
Um recorte no tempo. Imagem: reprodução de jornal
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Passaram-se 520 meses. Reflita: nesses mais de 43 anos, o que mudou? Essa frase pode ser hoje repetida, continua válida? Com ou sem alterações? Talvez as respostas percorram todos os matizes entre ‘Sim’ e ‘Não’.
Muitas obras foram propostas e até iniciadas com bilionários auxílios estrangeiros. Quem não lembra da retificação do cais Valongo-Paquetá, que os santistas logo apelidaram de ligação entre dois cemitérios (homônimos das pontas da obra, por sinal)?
Deu no que deu: enterrada boa quantia em dinheiro, para servir de base ao avanço no pier, repentinamente tudo parou, nunca mais foi retomado; vieram outros projetos – e continuam vindo – para a ocupação desse espaço.
Para situar no tempo: a obra começou a ser pensada em 1985, os trabalhos começaram em 1987, tudo foi sepultado pela Lei de Modernização dos Portos (8.630, de fevereiro de 1993), com a privatização das operações portuárias... Foi melhor parar? Pior? Que a História julgue...
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Voltemos àquele seminário de 1981. Quem também falou dos problemas decorrentes da falta dum planejamento globalmente integrado para a região foi o então superintendente de Desenvolvimento da mesma Cosipa, Gunther Bantel, que continua atuante nas causas portuárias, marítimas e de logística em geral.
Acertadamente, ele já se ressentia da limitação ao crescimento portuário pelas inúmeras pontes baixas construídas nos canais ao redor da Ilha de São Vicente, impossibilitando seu uso para navegação comercial: “Ironicamente, o viaduto na Via Anchieta, sob o qual passam apenas carros, tem gabarito maior que as pontes sobre o Casqueiro, por onde poderiam passar navios, se isso fosse previsto”.
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Gunther também recorreu à História, ao citar como a falta de planejamento global permitiu que parte da margem esquerda do Estuário fosse ocupada por habitações, onde hoje se situa Vicente de Carvalho. Lembrou que isso começou em 1926, quando para ali foram transferidos os moradores dos morros santistas, após vários desbarrancamentos. E citou: “Esta é uma área de alto valor, que deveria ser utilizada para porto, numa faixa de terra de 100 a 200 metros de largura ao longo do estuário”.
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Citando as consequências futuras (hoje) de não se pensar hoje (em 1981) na preservação de reservas naturais, Gunther comentou também como Guarujá, excelente região para moradias, pensava na instalação de indústrias; Cubatão, melhor região para indústrias, pensava em planos habitacionais; São Vicente e Praia Grande estudavam polos industriais. “Ou seja, todos os municípios fazem projetos urbanos individuais, quando estes projetos deveriam ser integrados”.
Quanto dessa mentalidade mudou desde então?
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Não há intenção e nem seria possível, neste curto espaço, abarcar mais que um recorte do tempo e do pensamento de uma época, levando o leitor a pensar: o melhor caminho é produzir montanhas de documentos, debater infinitamente projetos que não serão executados – seja por falta de consenso, de viabilidade técnica/financeira, ou falta de alinhamento a uma diretriz geral que dê um Norte a tudo isso?
Atualizando a fábula: se um rebocador puxa para um lado e outro para o lado oposto, para onde vai o navio?