* Advogada e CEO da Punder Advogados
A sociedade sempre precisou de regras que têm como objetivo contribuir para o bom funcionamento, a convivência harmoniosa e a proteção dos direitos e interesses dos seus membros. Regras estabelecem uma estrutura que permite as pessoas saberem como se comportar em determinadas situações, evitando o caos e a desordem, além de preservar a segurança e bem-estar dos indivíduos e da comunidade como um todo, prevenindo ações perigosas e danos desnecessários.
A necessidade de regras regulando sociedades tem sido essencial também para a proteção dos direitos individuais e fundamentais, impedindo o abuso do poder. Portanto, a palavra-chave seria ‘equilíbrio’, permitindo o desenvolvimento e aplicação das regras na sociedade, de maneira que não privilegie uma parte, nem prejudique a outra.
A sociedade é composta de indivíduos que devem seguir regras definidas, principalmente se o regime for a democracia, onde o poder emana do povo através de eleições livres. Sem regras, teríamos o caos. Com regras excessivas, teríamos o despotismo.
Como as empresas são entes ficcionais oriundas do Direito, temos indivíduos que gerem e trabalham nestas empresas para atingirem um propósito maior, mesmo que, infelizmente, em muitos casos, seja apenas o lucro pelo lucro.
As organizações empresariais são microssociedades e necessitam de regras para evitarem o caos e o abuso de poder. Alguns podem alegar que elas já seguem a legislação imposta pelo governo, e que nada mais deveria “atrapalhar” a forma destes indivíduos gerenciar os negócios. Mas, como alguém disse uma vez: nem tudo que é legal, é moral.
Temos a ética como vetor que visa guiar o comportamento, dos indivíduos das empresas e do próprio setor empresarial como um todo. Ela envolve a adoção de valores e regras que buscam promover a integridade, transparência, responsabilidade social e respeito em todas as atividades e decisões empresariais.
Pelos excessos cometidos pelos indivíduos e empresas no exterior, em 1977, o Departamento de Justiça dos Estados Unidos publicou o primeiro documento definindo Integridade, ou Compliance, como regra do jogo corporativo. Não basta mais seguir as leis dos países onde as empresas fazem negócios, as empresas devem atuar com uma ética global.
Os programas de Compliance foram evoluindo desde então, assim como o mercado, a forma de fazer negócios e a tecnologia. Entretanto, o princípio básico de agir com ética nunca saiu de moda. Claro que para alguns indivíduos, dentro das empresas, agir com ética é um fardo, pois buscam apenas saciar seus respectivos egos pessoais para subir na carreira e ganhar mais dinheiro. Então, ser ético virou sinônimo de chato para aqueles que buscam o lucro obsceno acima de tudo.
Surge, então, um pseudomovimento denominado “overcompliance”, que nada mais é do que a combinação das palavras “over” (excesso) e “compliance” (conformidade). Segundo alguns indivíduos e organizações, essa palavra tem sido utilizada para descrever uma situação em que uma empresa ou individuo adota medidas de conformidade, além das exigências regulatórias ou padrões estabelecidos. Interessante comentar que este movimento possivelmente tem como origem os mesmos que consideram ser ético como “chato”. Sem regras, mais dinheiro. Não importando como foi feito os negócios, mas o resultado. Afinal, “os fins justificam os meios”, frase atribuída ao filosofo italiano Nicolau Maquiavel.
Concluindo, é importante lembrar que a ética e os princípios morais são fundamentais em qualquer sociedade, e as ações humanas devem ser guiadas por considerações éticas que respeitem a dignidade e os direitos de todos os envolvidos.
Patricia Punder, é advogada e compliance officer com experiência internacional. Professora de Compliance no pós-MBA da USFSCAR e LEC – Legal Ethics and Compliance (SP). Uma das autoras do “Manual de Compliance”, lançado pela LEC em 2019 e Compliance – além do Manual 2020.