Sexta, 13 Junho 2025

Editorial | Coluna Dia a Dia

Enquanto alguém brinca de ‘casinha branca’, outros países estão criando ou descobrindo formas de ignorar seus contraditórios anúncios diários, contornar efeitos nocivos, reordenar o comércio mundial pós-EUA (especialmente o marítimo, que movimenta 80% das cargas entre países), estabelecer parcerias confiáveis (sem os EUA).

Guerranomar Imagem gerada por IA

Esse movimento começa a apresentar primeiros e incertos reflexos nas estatísticas internacionais. Como as divulgadas neste dia 10 de junho (incluindo os cinco meses anteriores) pela UN Trade & Development (UNCTAD).

Veja mais: Maritime Transport – UNCTAD (10/jun/2025)

Os quatro relatórios analíticos ora divulgados trazem a participação anual no valor da frota mercante mundial por país e agrupada, considerando ainda propriedade efetiva, bandeira de registro e tipo de navio.

Em análise preliminar, observa-se a continuidade da forte concentração da frota mundial em países como Grécia, Japão, China, Alemanha, Cingapura etc. Esta última, merecendo destaque também pelo aumento de sua participação nesses totais (4,88% em 2019 para 5,58% em 2025).

Veja mais: Rethinking Maritime Trade in 2025: How Recent Disruptions Challenge UNCTAD’s 2024 Projections

A China, que tinha 8,92% de participação efetiva na frota mercante mundial em 2019, cresceu de modo consistente para 12,38% neste ano. Já os Estados Unidos baixaram de 9,69% para 7,26% nesse período. O Brasil, com 1,86% em 2019, veio caindo para 1,22% em 2022, quando entrou em rota ascendente para os atuais 1,65% – participação modesta, mas acima da maioria dos vizinhos latino-americanos. Como é relativa ao total, se o bolo mundial cresce e a fatia nacional em dados absolutos não acompanha, na prática o Brasil reduz sua participação.

Por blocos, a Ásia cresceu de modo uniforme de 40,51% para 48,39%, enquanto a Europa caiu de 40,97% para 36,38% e as Américas passaram por instabilidades: caíram de 15,68% em 2019 para 10,82% em 2022, chegaram a 12,45% em 2024 e agora registram 12,01%. Destaque para os BRICSs, com crescimento anual de quase 1%, passando de 14,80% em 2019 para 19,32% neste ano.

Veja mais: Review of Maritime Transport 2024 - Unctad

Analistas internacionais entendem que o Brasil, como grande exportador de ‘commodities’, se beneficiaria mais se tivesse uma frota marítima maior, por reduzir a dependência física dos navios estrangeiros e por obter mais controle sobre os fretes e seu impacto em nosso comércio exterior.

A atual “política”(!) comercial dos EUA gera pressão forte sobre navios chineses, afetando custos, rotas e estrutura de frota global. Mudanças na regulação e nos mecanismos de sanção influenciam diretamente composição, valor e controle de frotas, aspectos refletidos nos relatórios Unctad. Esses fatores podem criar janelas de oportunidade para frotas brasileiras e demandam atenção a ‘compliance’, padrões ambientais e movimentações geopolíticas.

Veja mais: Global Trade Update (June 2025): Sustainable ocean economy – UNCTAD

Enquanto os EUA fabricam seus problemas, outros fatores que impactavam o comércio mundial apenas se acentuaram. As empresas estão desacelerando, enquanto reavaliam suas cadeias internacionais de abastecimento, fragmentadas pelas medidas do governo norte-americano e pela insegurança no uso de rotas como a de Suez – registrou-se alta significativa nos fretes mundiais com a “instabilidade geopolítica” ao redor desse canal e o retorno dos cargueiros para a tradicional rota via sul da África.

Veja mais: 2025 Top Trends in Global Trade (Windward)

Em 2025, observa-se queda nos fretes transpacificos entre 8% e 11% nos EUA, embora isso misture fatores sazonais e reações antecipadas a políticas. A incerteza regulatória leva ao adiamento de exportações, principalmente de automóveis, e pressiona fabricantes a reavaliar rotas e investimentos. A volatilidade nos preços de frete afeta o valor da frota, especialmente para operadores de navios de carga especializada (como ro-ro e contêineres).

Veja mais: US against plan for levy on carbon emissions from ships, leak suggests (The Guardian, 9/abril/2025)

As altas taxas impostas pelos EUA a navios chineses ou construídos na China poderão ter impacto de 100 a 300 dólares por contêiner/escala para navios de 10.000 TEUs, conta que sobrará para os donos da carga pagarem. Essa medida visa justamente frear a construção naval chinesa, que já ultrapassa os 50% da construção global e 19% da frota mundial. Ao mesmo tempo, os EUA tentam frear a descarbonização, ao se oporem à taxa de carbono da Organização Marítima Internacional (OMI/IMO).

Veja mais: Amid global uncertainties, trade transparency gains heightened significance - UNCTAD

Claro que, por serem ajustes muito recentes e em meio à incerteza total sobre o que resultará de tantas imposições anunciadas/alteradas/canceladas, será importante agregar às análises outros relatórios que começam a ser produzidos/atualizados mundo afora. Por enquanto, dá para se dizer de onde vem a fumaça, mas não a extensão do incêndio visto no horizonte, nem o que está sendo efetivamente devastado ou apenas chamuscado.

A atenção precisa ser redobrada, com flexibilidade para reagir prontamente, tanto às curtas janelas de oportunidade que podem surgir, como aos impactos negativos do frenético reposicionamento global. Os EUA desligaram a globalização, mas a alta carga de energia estática continua dando choques perigosos.

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Participação brasileira na frota mundial se recupera de forte queda em 2022
Imagem: ChatGPT, sobre dados do relatório UNCTAD-2025 de fretes marítimos

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*O Dia a Dia é a opinião do Portogente

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