Sexta, 29 Março 2024

Luiz Gonzaga Belluzzo é economista, professor, consultor editorial da revista Carta Capital

Em entrevista ao jornal Valor, Samuel Pessôa vergastou os equívocos difundidos pela turma “heterodoxa” (sic). A turma insiste em ilusões, tais como a ocorrência da Revolução Industrial no fim do século XVIII.

Esse acontecimento infausto para a humanidade, sossegada nos misteres do arado e do pastoreio, despertou os devaneios de Alexander Hamilton, nos Estados Unidos, com seu Relatório sobre as Manufaturas ou as truculências de Otto von Bismarck, encantado com os maquinismos e a ferrovia.

O capitalismo do comércio e da indústria cometeu, ademais, a insensatez da libertação dos subalternos (e de seus senhores) dos nexos da servidão, do isolamento da vida rural e dos confortos da dependência pessoal, quando os senhores se confraternizavam com as mulheres dos servos no jus prima noctis.

Desasossego! A libertação das cadeias da terra ensejou a divisão social do trabalho, a dominação do dinheiro no intercâmbio de mercadorias, o impulso privado ao ganho monetário. As regras do mercado, ou seja, da concorrência entre produtores independentes, impuseram às empresas e ao Estado os tormentos da racionalização burocrática e do registro sistemático de suas operações e de seus resultados em termos monetários, nos orçamentos e nos balanços.

Pior, a generalização do mercado supõe o assalariamento, ou seja, a livre contratação dos trabalhadores libertados, mediante o pagamento de uma renda monetária. No mesmo movimento, o capitalismo prosseguiu em sua fúria de insanidades ao promover o surgimento das forças produtivas apropriadas à sua expansão. Em seu desenvolvimento, foram gestadas técnicas e formas de produção e de uso de energia não humana que o diferenciam radicalmente de outras formações sociais e econômicas.

A divisão interna do trabalho na manufatura celebrada por Adam Smith suscitou a especialização das funções dos trabalhadores e abriu espaço para a mecanização do trabalho, ou seja, para a utilização crescente de máquinas cuja produção, também “industrializada”, promoveu a diferenciação e a especialização entre os elementos materiais que atendem aos requerimentos da acumulação de capital – bens de produção – e atendem às necessidades dos assalariados – bens de consumo.

A geração de valor e de mais valor, ou seja, a geração da renda e sua distribuição entre lucros e salários, impôs a diferenciação entre os valores de uso adequados à reprodução das classes sociais que contribuem para a criação da riqueza.

Por sua “natureza” material, os bens de produção, particularmente os bens de capital fixo, não podem ser consumidos, ou melhor, o seu “consumo” só pode ocorrer ao longo do tempo, quando mobilizados pelos possuidores de riqueza com o propósito de produzir outros bens, de consumo ou de capital.

Para mobilizar esse aparato produtivo e responder a seus impulsos expansionistas, o capitalismo, em sua dimensão fetichista e fundamental de economia monetária, incorporou à sua estranha dinâmica o sistema de crédito, outrora dedicado a financiar os desatinos das majestades do Medievo e do Ancien Régime.

Na economia capitalista entregue a seus desatinos, as decisões de gasto dos empresários nos setores de bens de produção e de meios de consumo são avaliadas pelo sistema de crédito. Para tanto, diante de um certo estado de expectativas a respeito dos rendimentos futuros, os empresários dos dois setores “financiam” nos bancos a aquisição dos meios de produção e a contratação de novos trabalhadores para conquistar lucros acrescentados.

Dos salários pagos e dos lucros realizados saem as poupanças privadas que vão liquidar as dívidas ou se juntar ao estoque já existente de riqueza financeira da sociedade.

Esse sistema, incluído o Banco Central, é incumbido de regular a expansão da moeda de crédito criada a partir dos empréstimos. Esses empréstimos geram depósitos que podem ser mobilizados como meios de pagamento. Corrupção! As virtudes da poupança foram vilipendiadas em proveito dos vícios do dinheiro criado do nada.

O sistema financeiro em sentido amplo inclui as bolsas de valores, os bancos de investimento e os mercados monetários atacadistas, onde famílias e empresas depositam seus saldos de curto prazo com direito a resgate automático.

As instituições que compõem o chamado mercado financeiro também são responsáveis pela avaliação diária do estoque de direitos de propriedade e de títulos de dívida nascidos dos fluxos anteriores de financiamento ao gasto em novos ativos reprodutivos ou acumulados a partir dos créditos destinado à compra de ativos já existentes.

Inimigo da poupança, o imoralista e antivitoriano Keynes concebeu as decisões de produção dos empresários de bens de consumo e de bens de produção como simultâneas, guiadas, em condições de incerteza radical, por expectativas a respeito de horizontes temporais distintos. As decisões de produção corrente informadas pelas expectativas de curto-prazo se combinam com as avaliações de longo prazo para determinar o ponto de demanda efetiva.

Desgraça! As decisões do conjunto dos empresários são, no entanto, tomadas a partir de avaliações efetuadas isoladamente por eles: fazem conjecturas sobre a avaliação dos demais. O conjunto das decisões de gasto determina, em cada momento, qual será o nível de renda da comunidade. Incerteza e insegurança!

Os empresários estão decidindo gastar agora na produção de bens de consumo e de bens de investimento. Nas mãos deles está o destino da comunidade. Essa hierarquia revela a decisão (a decisão de investir) fundamental para a determinação da renda e dos lucros agregados. Manda quem pode, obedece quem tem juízo. Juízo ou prejuízo.

A grande concentração de capital fixo e a dominância dos bancos na intermediação financeira ancoram a infernal dinâmica do capitalismo no aumento da produtividade social do trabalho, o que, por sua vez, impulsiona a competição entre as empresas pela inovação tecnológica.

A incorporação de novas gerações de insumos e equipamentos reduz, no mesmo movimento, o tempo de trabalho e o número de trabalhadores necessários para produzir bens e serviços. Nessa toada, aí vêm a automação, a inteligência artificial e a internet das coisas. A hiperindustrialização.
Por aqui, estamos fora. Yes!, nós temos bananas.

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*Todo o conteúdo contido neste artigo é de responsabilidade de seu autor, não passa por filtros e não reflete necessariamente a posição editorial do Portogente.

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