Domingo, 14 Setembro 2025
Opinião | Antonio Mauricio Ferreira Netto
engenheiro mecânico e de produção. Especialista em Planejamento e Gestão Pública; Transportes; Transportes Urbanos; Portos; Desenvolvimento Urbano e Políticas Públicas
Antonio Mauricio Ferreira Netto

Recentes movimentações nas últimas semanas reviveram a questão da concessão, pela privatização, do controle dos portos administrados pela CODEBA. Esta ação, de certa forma, dá sequência à iniciativa de 2022, ocasião em que foram iniciados estudos para a concessão integral da companhia, sob o pretexto de que os portos eram ineficientes.

Essa situação foi recentemente desmentida de forma enfática pelo presidente da CODEBA, Antonio Gobbo, que afirma que "nesta gestão a CODEBA não será privatizada". Ele destacou a mudança de cenário da companhia, que hoje se apresenta como lucrativa e distribui dividendos para seus acionistas. Outra consideração levantada por Gobbo é que "a orientação estratégica do governo federal não tem nada a ver com privatização", estando os estudos oferecidos em Consulta Pública atualmente sendo retrabalhados e revisados para que se enquadrem nessa nova diretriz. Em Audiência Pública realizada no dia 26 de agosto, representantes do Ministério de Portos e Aeroporto MPOR e do BNDES deixaram claro que a modelagem para a concessão parcial dos portos de Salvador, Aratu-Candeias e Ilhéus pode ser revista.

A trajetória do Estado da Bahia é inextricavelmente ligada ao seu litoral e às suas portas para o mar. As águas da Baía de Todos-os-Santos, desde o primeiro contato dos portugueses, passando pelo emblemático decreto de "Abertura dos Portos às Nações Amigas", não foram apenas cenário, mas o principal condutor da história econômica e cultural da região. Pela atual situação, corroborada com os indicadores de desempenho dos portos, o futuro do estado continua a ser escrito a partir de seus cais. Um futuro que não repete o passado, mas que pode reinventá-lo com inteligência, sustentabilidade e equidade, reposicionando a Bahia como um estado na vanguarda do desenvolvimento portuário nacional.

A Tese Central: A Visão Estratégica, e Não a Privatização, Define o Sucesso

A crença de que a privatização é o único remédio para a ineficiência portuária, tão celebrada nos leilões e comemorada com simbólicas quebras de martelo, ignora a principal tese do setor: o sucesso de um porto não é determinado por ser público ou privado, mas sim por sua visão estratégica, sua capacidade de articulação regional e local e seu compromisso em atuar como um vetor de desenvolvimento integrado.

A experiência dos portos de Suape e Pecém são os melhores exemplos dessa premissa no Brasil. Ambos são frequentemente citados como modelos de sucesso, mas o que muitos não sabem é que são geridos por empresas públicas, ligadas aos seus respectivos governos estaduais. Seu sucesso é fruto de um modelo de governança estratégica e de longo prazo que a CODEBA pode e deve replicar.

O Roteiro da CODEBA: A Oportunidade Estratégica da Gestão Pública

As experiências de Suape e Pecém oferecem o roteiro perfeito para a CODEBA, em contraposição à privatização de sua gestão. Afinal, a gênese corrente dos processos de terceirização, na sua grande maioria, se concentra em maximizar o lucro de ativos existentes no curto prazo, sem o compromisso com o desenvolvimento regional e local de longo prazo.

Para desbancar essa narrativa, a CODEBA pode apresentar um plano que demonstre sua capacidade de se reinventar e liderar a transformação dos seus portos em verdadeiros “Portos 4.0”, sendo estes verdadeiros vetores de desenvolvimento local e regional.

Potencializar o Modelo Porto-Indústria: A CODEBA, com o vasto potencial do Porto de Aratu-Candeias, pode seguir o modelo de Suape, atraindo cadeias produtivas de alto valor agregado, como a indústria da Economia Verde e o Complexo Automotivo Elétrico. Liderar a Inovação em Energia Limpa: Assim como Pecém, a CODEBA pode posicionar os portos da Bahia na vanguarda da transição energética, atraindo investimentos em Hidrogênio Verde (H2V) e biocombustíveis, aproveitando o potencial de energia solar e eólica do estado. Reforçar o Papel de Gestor Estratégico: A CODEBA, com o apoio de investimentos em tecnologia (PMS, PCS, IoT), certamente conseguirá demonstrar que é capaz de articular políticas públicas, atrair investidores e gerir os ativos com eficiência, por meio de um modelo de governança transparente e participativo. Promover o Desenvolvimento Equânime e Sustentável: Consiste oportunidade estratégica para o Estado a reativação do potencial logístico e histórico do Recôncavo, isto de forma a mitigar a ruptura econômica e cultural ocorrida nas décadas de 50 e 60 e abrir novas oportunidades de desenvolvimento. Esta região foi no passado o sistema circulatório que abastecia Salvador através de uma rede de portos e saveiros. Adequar o Tratamento da Relação Porto Cidade/Região: Uma visão ampla, metodológica e tecnicamente adequada, com integração interinstitucional e intersetorial, e com caráter holístico, certamente contribuirá para a produtividade dos portos, reduzindo os impactos e as interações negativas, com um impacto na saúde e na qualidade de vida da população e daqueles que trabalham no porto.

Conclusão: Portos da Bahia — Herança Atlântica e Futuro Estratégico

A Bahia nasceu voltada para o mar. Desde o desembarque dos portugueses em 1500, os portos baianos foram protagonistas da formação econômica e cultural do Brasil. Salvador, Aratu-Candeias e Ilhéus não são apenas estruturas logísticas: são testemunhos vivos de ciclos históricos, da economia colonial à industrialização, e agora, da transição para um modelo sustentável e integrado.

A conclusão é que a solução para os portos da Bahia não está em ceder o controle a um agente privado, mas em investir na capacidade de sua própria gestão pública estratégica.

Suape e Pecém provam que, com uma visão estratégica, a atuação pública pode ser mais inovadora, mais sustentável e, sobretudo, mais alinhada com os interesses de desenvolvimento local e regional. A CODEBA tem a oportunidade de seguir de novo este mesmo caminho, promovendo o amplo desenvolvimento com ações inovadoras e limpas, com equidade e justiça social, provando que o futuro da gestão de seus portos (atuais e outros que venham a ser agregados) é transparente, pública, tecnológica e próspera.

O mar que trouxe o passado é o mesmo que pode levar a Bahia à frente, desde que comandado por uma visão tão grandiosa quanto o próprio oceano.

Antonio Mauricio Ferreira Netto
engenheiro mecânico e de produção. Especialista em Planejamento e Gestão Pública; Transportes; Transportes Urbanos; Portos; Desenvolvimento Urbano e Políticas Públicas
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