A proposta da Libra,apresentada na semana passada, de passar de 35 anos para 65 anos o prazo de arrendamento do seu terminal no Porto de Santos (SP) e a promessa de investir nesse período R$ 1,6 bi, tem uma dimensão tão magnética que parece uma dessas lorotas inseparáveis dos grandes golpes. Foram conversas cativantes que facilitaram George C. Parker vender a Estátua da Liberdade para um turista em Nova Iorque e Victor Lustig, em 1925, vender a Torre Eiffel para um ferro-velho, em Paris.
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O ímpeto investidor contrasta com a sua realidade. Desde o ano de 1998, quando ganhou uma concorrência controvertida para operar um terminal no Porto de Santos por 25 anos, a Libra Terminais não pagou ainda um real por esse arrendamento. Essa dívida já alcança o valor atual de R$ 2,5 bi e, apesar das sentenças proferidas em 23 de março de 2004 pela juíza da 4ª Vara Federal de Santos, não foi cobrada. Atualmente, viabilizada por expediente legislativo, prorrogou o contrato e a dívida está sendo negociada em juízo arbitral na Câmara de Comércio Brasil-Canada (CCBC). O criador desta mágica é o ex-presidente da Câmara dos deputados e hoje presidiário Eduardo Cunha, através da Lei nº 12.815/13. Passados dois anos, a Libra não investiu um centavo, dos R$ 360 mi que já deveriam ter sido realizados.
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Portos de Santos versus Libra Terminais
Sob a ótica financeira, segundo o Valor Data, o Grupo Libra apresenta seu Ebtida - indicador econômico da empresa - em queda desde 2013 e negativo em dezembro de 2016. Ou seja, situação financeira e referência insuficientes para aprovar uma proposta dessa magnitude e para essa operação ser financiada pelo BNDES. Considerando os três grandes terminais de contêineres que operam e concorrem no Porto de Santos, o da Libra tem baixíssima competitividade. E a empresa tem um grau de endividamento incompatível com a proposta financeira apresentada.
Tudo somado, incluindo as negociações nos bastidores da venda do terminal para a francesa CGM/MSC, fica evidente ser a proposta da Libra uma estratégia de marketing para valorizar a venda em curso do terminal e desviar a atenção da polêmica negociação arbitrada. Suas justificativas do atraso do investimento não realizado, são as mesmas que usou para o calote que tenta dar nos R$ 2,5 bilhões.
A desenvoltura do grupo Libra para circular pelos corredores palacianos em Brasília tem possibilitado transformar um terminal portuário com finalidade produtividade na operação de contêineres, em operador de especulação com áreas portuárias públicas. Entretanto, por princípio constitucional, na administração pública só pode ser feito aquilo que a lei determina, e não aquilo que não é proibido. Portanto, está mais do que na hora de dar um basta ao uso do dinheiro do povo para financiar a vida luxuosa do grupo Libra e a operação improdutiva do seu terminal.
A sociedade brasileira está cansada de espertezas que afrontam a Justiça e desajudam os interesses nacionais. Há capítulos dessa novela da dívida da Libra que chegam a desacatar princípios elementares de justiça. Como o do diretor Administrativo e Financeiro da Codesp, Alencar Severino Costa, que deve explicar porque extinguiu as ações judiciais relativas a esta questão já ganhas na Justiça Federal.
Sem sombra de dúvida, a atual conjuntura nacional é intolerante com a corrupção e o desmando. Sem dar trégua, na Internet e suas redes sociais, e nas ruas, o Brasil exige a apuração rigorosa das denúncias. Uma realidade difícil de rivalizar. É nesse clima que irá acontecer a judicialização da arbitragem da dívida da Libra. E promete ser renhida.