Domingo, 24 Novembro 2024

Creso de Franco Peixoto*

A onda de financiamento fácil de automóveis no biênio passado, com longo prazo de pagamento, onde a reduzida parcela mensal se contrapõe ao elástico prazo de 60 meses para pagar, soma-se ao quadro de desaquecimento da indústria, à carga tributária excessiva e aos elevados custos da energia elétrica, fatores de desaquecimento econômico. O resultado desta operação matemática tende a zero.

Automóveis desvalorizam com dois dígitos percentuais no primeiro ano e mantêm significativa taxa de desvalorização nos anos subsequentes, até a sua morte econômica, no final da vida útil. Ao término do primeiro ano de pagamento do longo e barato financiamento em ambiente de esfriamento de produção industrial, inadimplentes encontram valor residual do financiamento maior do que o valor real do bem.

Fica devedor se quiser devolver. Há veículos com depreciação de 40% no primeiro ano. Financiados em valor integral e linear por 60 meses, paga-se 20% do bem no primeiro ano. Uma diferença de 100% em relação ao valor do consumo veicular, na data do primeiro aniversário.

A baixa taxa de juros do financiamento se torna armadilha. Caso tivesse optado por leasing, arrendamento com direito de compra ao final, devolveria simplesmente o veículo e ainda não pagaria Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). Esta é a melhor solução?

A emoção incita compradores. Cases de marketing automobilístico exultam beleza enquanto esquecem custos. Financiadoras mostram felizes compradores assinando contratos. Não há propaganda que cite custos anuais ou que apresente o risco da prestação vencida, tal como ocorre em propaganda de cigarros, que deixam claros os riscos do tabagismo. Carro deve ser comprado após se avaliar custos e necessidade. Muitos compram gigantescos veículos para levar a família em raro passeio anual enquanto usam o produto de forma solitária, nas cotidianas viagens casa-trabalho-casa.

Há outro cenário. O da leitura das viagens necessárias associada à disponibilidade do transporte urbano e ao custo de táxis ou veículos alugados. Sim, é possível não precisar ter carro! Infelizmente, a típica oferta brasileira do transporte público ainda não premia esta possibilidade. O dinheiro do carro poderia ser aplicado no mercado financeiro. Imóveis, bens efetivos de aplicação de capital, que desvalorizam menos de 2% ao ano, seriam ideais para o longo prazo e com risco baixo. Minimizaria a deseconomia popular do consumismo desenfreado.

A política de financiamento veicular fácil se mostra, portanto, insustentável. Alie-se ao quadro da forte motorização e de insuficientes recursos e ineficientes programas de implantação e ampliação do transporte público. Projeta cenário de congestionamento urbano sob modelo de saturação, quando os atrasos nas viagens evoluem geometricamente.

A estratégia de venda veicular sob conceito de que, para classes socioeconômicas D e E, basta buscar viabilizar o valor da prestação, tirando o foco do valor final e da taxa de juros, gerou quadro de excepcional inadimplência. Carro sem entrada, carro sem saída.

(*) Creso de Franco Peixoto é professor do curso de Engenharia Civil do Centro Universitário da FEI (Fundação Educacional Inaciana), engenheiro Civil e mestre em Transportes

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