* É presidente do Grupo Fiorde, constituído pelas empresas Fiorde Logística Internacional, FTA Transportes e Armazéns Gerais e Barter Comércio Exterior (trading company), todas com matriz em São Paulo e filiais em vários Estados brasileiros.
Em artigo que escrevemos em 2004 e que consta do livro Logística: os desafios do século XXI (São Paulo, Fiorde Logística Internacional, 2005), às páginas 188/190, sob o título “Negligenciar a Alca, um erro”, deixamos claro que o governo brasileiro de então falhava ao negligenciar e até mesmo tripudiar a formação da Aliança de Livre-Comércio das Américas (Alca), proposta do presidente norte-americano George Bush (1924-2018) que incluía Canadá, México e os demais 32 países das Américas, com exceção de Cuba. Afinal, ao esgrimir a desga stada bravata contra um possível domínio dos Estados Unidos na América Latina, o Brasil estaria, isso sim, permitindo que outros países viessem a ocupar um espaço que poderia ser seu no mercado norte-americano. E finalizávamos: “As consequências desse erro o tempo mostrará”.
Infelizmente, o tempo acabou por mostrar que este articulista tinha razão. Basta ver que o volume das exportações da China para os Estados Unidos cresceu de forma exponencial, enquanto as vendas brasileiras para aquele país se estabilizaram em patamares modestos e até decresceram. Obviamente, se a Alca tivesse saído do papel, hoje a corrente de comércio entre as duas nações seria muito alta e o País estaria em melhores condições para enfrentar o período de dificuldades que enfrenta.
Mas, seja como for, com a pandemia do coronavírus (covid-19) e a taxa de câmbio do real subvalorizada, tudo leva a crer que este pode constituir um bom momento para que o fluxo de comércio com os Estados Unidos seja retomado com maior vigor. Até porque a política de Cooperação Sul-Sul, que privilegiava negócios com nações do Hemisfério Sul e tantos prejuízos causou ao erário brasileiro, está definitivamente enterrada. Hoje, ainda que o governo não tenha uma política de comércio exterior digna desse nome, segue, embora de maneira empírica, o ensinamento deixado por um antigo secretário de Estado norte-americano, John Foster Dulles ( 1888-1959), segundo o qual “não há países amigos, mas interesses”.
Assim, sem desprezar ou afugentar os negócios com a China, o Brasil pode muito bem concorrer de maneira mais intensa com aquele país oferecendo ao mercado norte-americano produtos com baixa e média tecnologia, para os quais teria boa capacidade de produção. Essa política de reaproximação com os Estados Unidos poderia resultar num reavivamento da indústria nacional, o que significaria também dar condições e renda ao exército de desempregados que ficará ainda maior até o final da pandemia de coronavírus.
É de se ressaltar que a quantidade de multinacionais que abriram unidades na China, para usufruir de mão-de-obra barata, é enorme, mas já se detecta certa insatisfação por parte dos investidores. Portanto, seria o caso de atrair boa parte desses investidores, pois, aparentemente, os efeitos da pandemia causarão sérios transtornos à economia chinesa. Por outro lado, seria este também o momento de o produto made in Brazil garantir parte dos mercados que até agora foram majoritariamente atendidos pela China, principalmente o norte-americano.
Num primeiro momento dessa retomada, o País deveria focar, por exemplo, em vestuários em geral, confecções e sapatos, que constituem um mercado gigantesco, assim como nos setores de eletroeletrônicos e artefatos de plástico, que são produtos de baixa e média tecnologia, além, é claro, de continuar a expandir as vendas de commodities agrícolas e minerais, que mantiveram até aqui a estabilidade da economia nacional.
Para tanto, o governo federal, em vez de ficar distribuindo dinheiro aleatoriamente, deveria oferecer mais apoio às iniciativas focadas no comércio exterior, estimulando também a importação de insumos, de forma que o setor industrial possa vir a ampliar o número de vagas, pois, afinal, é o emprego que dá dignidade ao trabalhador. Como se sabe, são nos momentos de dificuldades que aparecem as grandes oportunidades.
Exportar mais é a saída
- Detalhes
- Milton Lourenço
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