Quinta, 21 Novembro 2024

Adilson Luiz Gonçalves, engenheiro e professor universitário; pesquisador do Núcleo Brasileiro de Estudos Portuários, Marítimos e Territoriais da Universidade Santa Cecília (NEPOMT/Unisanta). Coordenador do Núcleo Avançado em membro da Diretoria da Association for Collaboration Between Ports and Cities – RETE, na Unisanta. Membro da Academia Santista de Letras (ASL)

Em 2016, a Rumo/Portofer apresentou proposta de revitalização do trecho entre os Armazéns 1 e 4, já desconsiderando o "Mergulhão". A iniciativa estava associada à proposta de implantação de uma terceira linha férrea e previa duas passarelas aéreas. Essa proposta não evoluiu, por não tratar da totalidade da área e contrariar algumas das premissas estipuladas pelo GTP e mesmo da PMS e Codesp.

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Posteriormente, a mesma empresa, por interveniência do escritório regional da Antaq, propôs nova passarela aérea em substituição à atualmente existente para travessia de usuários do sistema de barcas que liga o Centro de Santos a Vicente de Carvalho, em Guarujá. Tal solução atenderia à demanda da ANTT, que exigia a supressão de todas as passagens em nível existentes na área do Porto Organizado de Santos. Além de melhorar a acessibilidade, conforto e segurança na travessia de pedestres, essa passagem resultaria em eliminação do risco de acidentes (existe histórico de amputações e óbitos), aumento da velocidade das composições, melhorando a produtividade da matriz de transportes do porto; e redução do impacto ambiental do trânsito dos trens (não necessidade de emissão de sinais sonoros).

Embora a alternativa subterrânea tenha sido considerada a ideal, em função da obra ser implantada em Corredor de Proteção Cultural, ela foi considerada inviável, pois sua execução impactaria o tráfego ferroviário e rodoviário, inclusive desviando o tráfego de caminhões para áreas onde poderiam afetar edifícios tombados. Mesmo soluções "não destrutivas" (tunelamento) seriam de elevada complexidade e custo, além de gerarem manutenção constante (rebaixamento de lençol freático, segurança etc.).

No mais, existem exemplos de passarelas aéreas em áreas históricas de várias cidades do mundo e mesmo no Brasil. Esses exemplos incluem soluções em que o moderno realça o histórico, convivendo em perfeita harmonia.

Para mencionar apenas dois desses exemplos icônicos da convivência entre o moderno e o antigo: Paris, onde temos a pirâmide do Museu do Louvre e o Centro Georges Pompidou; e Barcelona, com as extensas passarelas que ligam o Museu Nacional de Arte da Catalunha à Praça de Espanha, passando pelo Palácio de Congressos, Centro de Exposições e Complexo da Feira de Barcelona-Montjuïc.

Ao que consta, essa proposta foi submetida à apreciação do Conselho de Defesa do Patrimônio Cultural de Santos - Condepasa, que não teria feito objeção à passagem aérea, mas que deveria ser buscada um solução estética que melhor se harmonizasse com o entorno histórico.

Essa solução harmônica pode ser o modelo a ser adotado para outras passagens aéreas a serem implantadas nessa área, lembrando que elas já estavam previstas no Programa Porto Valongo Santos, por conta da impossibilidade de execução de uma passagem subterrânea também ferroviária.

É certo que a inviabilidade de implantação do "Mergulhão" foi um duro golpe nas expectativas iniciais. Até poderia ser questionado o motivo da indisponibilidade de verba para sua execução, tendo em vista a ampla destinação de financiamentos do BNDES para obras no exterior, inclusive portuárias, feita em passado recente. Também é fato que os atores das partes conveniadas mudaram. Mas elas continuam a existir institucionalmente, originais ou suas sucessoras.

Soluções e propostas existem muitas, várias sem suporte técnico ou estudo de viabilidade.

A única certeza é que o convênio firmado entre a Prefeitura de Santos e a Autoridade Portuária, com a interveniência na Secretaria de Portos da Presidência da República, hoje Secretaria Nacional de Portos, estipula que seu encerramento só ocorrerá após a conclusão do processo de revitalização da área do Valongo.

Considerando que o "Mergulhão" não é mais uma condicionante, é necessário reformular o projeto.

Nada impede que o GTP seja retomado e que o principal porto do país e sua cidade-sede sejam tratados com a devida prioridade, sem necessidade de outras ações e acordos.

No mundo, questões como estas são tratadas no âmbito do que se convencionou chamar de "Relação Porto-Cidade", independentemente da natureza administrativa, institucional ou jurisdicional dos portos.

Assim, nenhuma solução pode prescindir desses dois entes, ainda mais no caso de Santos, onde porto e cidade nasceram juntos, siameses. Qualquer solução que não os envolva em igual nível e com a mesma filosofia e cumplicidade estará prejudicada de origem. Poderá ser um "frankenstein" urbanístico ou a perda de uma oportunidade "de ouro" para o resgate da identidade portuária do cidadão santista, de tornar esse empreendimento uma referência mundial, em vez do triste cenário de ruínas que inibe a revitalização do Centro Histórico e causa péssima imagem da cidade e do porto aos turistas que o visitam.

O que se espera, então, é que essas tratativas sejam reativadas com seriedade, objetividade e afetividade, no melhor interesse da relação porto-cidade, e sempre com a participação harmônica e proativa de ambos!

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