Editorial | Coluna Dia a Dia
Portogente
Aos poucos, o novo quadro da economia mundial vai sendo desenhado. E os Estados Unidos estão ficando de fora, pelas imposições que os isolam e pela bagunça que fazem, tornando-os não confiáveis. E pela arrogância sem limites de exigir “faça o que eu digo, não faça o que eu faço”. Forçaram a globalização dos mercados, agora não a querem. Autoproclamados pilares da política e da economia ocidentais pós Segunda Guerra Mundial, tentam agora destruir as organizações criadas para garantir essa visão de mundo.
Posam de xerifes da Democracia, mas tratam como ditaduras as nações que negociam com China, Venezuela, Rússia... (só os EUA podem negociar com ditaduras? A propósito: Putin quer o Alasca: Trump doará, dia 15/8?) Extrema hipocrisia de quem mente descaradamente sobre tudo. Como confiar em quem elege um autodeclarado incompetente para a presidência? (expliquemos: Trump criticou o tratado USMCA, perguntando quem o teria assinado pelos EUA – foi ele mesmo!).
Os movimentos internacionais para isolar Trump e “seu” país estão ficando explícitos. A cada ameaça de punir o mundo, cancelando acordos, impondo tarifas, restringindo acessos, surgem soluções que excluem os EUA. A última novidade responde à ameaça que Trump fez de usar a lei Magnitsky contra seus desafetos e punir instituições financeiras que transacionem com eles.
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O sistema interbancário SWIFT agradece a Trump pela rasteira nos bancos: neste semestre, como consequência também disso, a grande operadora chinesa de transações bancárias UnionPay expande operações e passa a operar no Brasil, parceira do cartão Elo, que é brasileiro. Visa e Mastercard sabem o quanto vão perder com isso. Como a China faz uso militar de sua economia, os EUA também perderão poder político.
O Tesouro dos EUA também agradece a Trump pela gentileza de quebrar as pernas desta instituição outra vez: as transações da UnionPay não passarão pelo dólar estadunidense. Economistas já notam no horizonte outra Bretton Woods, acompanhada de novo padrão monetário substituindo o dólar...
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Detalhe: o dólar depreciado torna inócua boa parte da política econômica de Trump. Deixa de atrair investidores externos para os EUA, pois a conversão do dólar resultará em menos reais, euros etc. Prevendo que essa tendência permaneça, preferirão investir em outros países, o que reforça a queda do dólar, em círculo vicioso.
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Internamente, o já extraordinário custo do serviço da dívida dos EUA em moeda estrangeira se eleva ainda mais, agravando a crise interna. E a queda do dólar costuma implicar em inflação maior nos EUA, que precisará pagar mais por petróleo, ouro, certos alimentos...
Claro, a desvalorização do dólar em tese estimularia as exportações dos EUA, mas até que eles produzam internamente (se as empresas levarem de volta suas fábricas para esse país!), precisarão importar insumos. Assim, o tarifaço encarecerá seus produtos no mercado internacional...
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Enfim: o que mais impressiona é a previsibilidade de Trump: vê-se bem pelos seus atos quando sente o tranco. O que não reduz a incerteza: o que ele fará a respeito? John Kenneth Galbraith saberia responder?
1) Trump vê o dólar cair, então volta suas baterias para quem diga algo contra "sua" moeda nacional. Aliás, Lula: “Por que não te calas?”, como diria o rei espanhol. Em boca fechada não entra mosca... Faça primeiro, conte depois.
2) Viu que os EUA estão cada vez mais endividados, o que atrapalha seus planos: então, enquanto aprova um plano fabuloso (em valores) de gastos internos, procura transferir para todo o planeta a conta do mau desempenho da economia americana, mesmo com desculpas esfarrapadas, como punir um país por aceitar a “Solução de Dois Estados” (Israel e Palestina), atrapalhando seus planos de fazer um ‘resort’ em Gaza.
3) Viu a globalização se voltar contra os EUA, então desesperadamente tenta revertê-la, mesmo sabendo que é praticamente impossível (o mundo mudou).
4) Viu os países avançarem sem a liderança dos EUA, então tenta freá-los para que seu país continue líder, mesmo que de um mundo mais atrasado. Trump tem instrução mínima, não entende sequer a regra de percentagem, então se apoia nos negacionistas que o bajulam. Nega economia sustentável, ambiente saudável, ciência, educação, saúde, por saber que “sua” economia é incompatível com tais mudanças, principalmente se tiver de fazê-las de repente para recuperar o atraso.
5) Trump sabe que mentiu aos seus eleitores, eles vão pagar a conta, então fala de reverter para benefícios sociais parte do valor arrecadado com seus tarifaços.
6) Percebeu que perderá as eleições 2026 para o Congresso, então corre a redesenhar o mapa eleitoral dos EUA para fabricar na marra novas cadeiras para os Republicanos.
7) E usa o país e o mundo em suas experiências. Washington DC é novo balão de ensaio para controlar marcialmente outras capitais estaduais; o Brasil é laboratório de como impor suas “decisões” ao mundo. Dentro ou fora dos EUA, quem capitula abre espaço para o ataque aos demais.
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Imagem: domínio público