A equipe de jornalismo do Portogente investigou o processo de decisão que ensejou o primeiro aditamento, no valor de R$ 18.000.000,00 (dezoito milhões de reais), ao contrato DIPRE 98/2016, de 10 de outubro de 2016, entre a Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp) e a Dragabrás Serviços de Dragagem Ltda., empresa brasileira controlada pelo grupo belga Deme, para o aprofundamento do canal de acesso ao Porto de Santos. Cada vez que se analisa este caso fica mais difícil aceitar a correção dos conceitos e resultados que balizaram o pagamento dos serviços. Para que não paire qualquer dúvida, a sociedade exige, conforme o artigo 37 da Constituição Federal, os esclarecimentos devidos pela Codesp.
A solicitação do aditamento por parte da Dragabrás é fundamentada em três itens: tempo de paralisação da unidade de produção Pearl River, custos indiretos pela paralisação e sedimentação natural do canal de acesso. O setor jurídico da Companhia, entretanto, afastou cabalmente a responsabilidade pelos dois primeiros quesitos, o que deveria anular também o terceiro item, uma vez que o mesmo está pautado e totalmente vinculado aos problemas oriundos da paralisação da draga Pearl River. Ou seja, tecnicamente o pedido de aditamento do contrato deveria ser rejeitado.
Leia também
* Dragagem do Porto de Santos: pagamento a esclarecer
* Caixa-preta da dragagem dos portos brasileiros
* Dragagem no Porto de Santos: perguntas que exigem respostas
1. Aditamento
O primeiro aditamento ao contrato DIPRE 98/2016 ocorreu em face à carta Dragabras-5391-COR-LET-1-01-02-327 sob protocolo Codesp/34067/18-69, reclamando compensação financeira por fatos não imputáveis à Dragabrás, nos termos do item 9.1.2 do Termo de Referência do Edital.
2. Reclamação e compensação financeira
A reclamação é fundamentada em três itens:
1- Tempo de paralisação da unidade de produção Pearl River - valor reclamado: R$ 10.190.133,33;
2- Custos indiretos do tempo de paralisação - valor reclamado: R$ 497.158,38; e
3- Sedimentação natural dos trechos I e IV do canal de acesso - valor reclamado: R$ 4.744.801,47.
Destes, em decisão amparada nas análises da área gestora, a Gerência do Consultivo Contencioso Cível e Instrumentos Contratuais conclui não serem pertinentes os itens 1 e 2 supramencionados, ficando, portanto, passível de ser acolhido apenas o item 3.
E o que diz o item 3: "De modo a determinar a sedimentação natural observada nas diferentes áreas, a Contratada refere-se à página 33 do documento intitulado "Estimativa da taxa de dragagem anual de manutenção de Canal de acesso e Bacias de evolução do Porto de Santos após a obra de dragagem de aprofundamento -15m e alargamento [...] Foi tomada em consideração a pior situação prevista durante essa avaliação de modo a salvaguardar a Contratada de eventuais danos". Com essas considerações e com vistas às paralisações reclamadas, a Dragabrás apresentou cálculos de valores de assoreamentos nos trechos I e IV do canal de acesso, cujos volumes multiplicados pelos respectivos valores por metro cúbico atingem o total de R$ 4.744.801,47.
1ª observação - Em seu pedido, o setor técnico da Dragabrás concentrou-se apenas nos períodos de paralisação da draga e nos possíveis intervalos entre o término dos serviços e as respectivas sondagens pós-dragagem. Porém, considerou a pior situação de assoreamento no referido “documento de estimativa da taxa de dragagem”, no qual registra:
Tabela 10: Estimativa superior das taxas volumétricas anuais de dragagem (“m3 situ”). Trecho 1: 2.500.000m³ e Trecho 4: 2.600.000m³;
Tabela 11: Estimativa média das taxas volumétricas anuais de dragagem (“m3 situ”). Trecho 1: 2.200.000m³ e Trecho 4: 1.600.000m³.
Com base nestes dois valores chegaríamos facilmente às “estimativas mínimas” relativas ao Trecho 1: 1.900.000m³ e ao Trecho 4: 1.000.000m³. Assim, a solicitação da contratada poderia variar entre aproximadamente R$ 2.700.000,00 a R$ 4.744.801,47, obtendo um valor médio ponderado em torno de R$ 3.730.000,00. Diante desses cálculos, o valor sugerido pela área técnica da Codesp, de R$ 22.744.000,00, é muito estranho.
2ª observação - No Termo de referência de contratação de serviços de dragagem de manutenção dos trechos 1, 2, 3 e 4 do Canal de Acesso e dos acessos aos berços de atracação do Porto de Santos consta:
Item 12.1: Os preços deverão ser cotados em conformidade com a Planilha de Serviços, Quantidades e Preços cuja quantidade total é de 4.300.000 m³. A área técnica da Codesp admite como valores iniciais para os trechos 1, 2, 3 e 4 os volumes de: 2.200.000m³; 500.000m³; 600.000m³ e 1.600.000m³ respectivamente, totalizando 4.900.000m³, o que contraria frontalmente o Edital. Mais ainda: ao admitir o pagamento de 733.333m³; 83.333m³; 100.000m³ e 533.333m³, dispensando a medição nos termos do Edital e do Termo de Referência, acresce 1.449.999m³ no contrato em vigor, correspondente a 33,72% do seu objeto, o que desrespeitaria a Lei 8.666/1993, que regulamenta as normas para licitações e contratos da Administração Pública.
3ª observação - A mesma Lei 8.666/1993 determina que o limite para acréscimos em obras públicas deve respeitar o limite de 25% do valor inicial atualizado do contrato. Por isso, apesar do cálculo da Codesp sugerir o pagamento no estranho valor de R$ 22.744.000,00 à Dragabrás foram pagos "somente" R$ 18.000.000,00. Como caracterizar essa suposta perda de recursos pela empresa contratada? Em quais trechos ocorreu dragagem maior como sugere a área técnica da Codesp? E por que a Companhia pagou R$ 18.000.000,00 se era solicitado, já que os itens 1 e 2 foram invalidades, R$ 4.744.801,47?
4ª observação - Independente das incoerências apontadas nas observações anteriores, a Companhia Docas, ao não aceitar os dois primeiros quesitos propostos pela contratada, deveria igualmente desconsiderar o terceiro, uma vez que o mesmo está pautado e totalmente vinculado aos problemas advindos das paralisações da draga Pearl River.
Com tantas questões pairando no ar, cabe à diretoria-executiva e ao Consad esclarecer as divergências apontadas e conseguir fazer prevalecer a sua verdade.