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O Curso de Dragagem Marítima e Portuária, que acontece em Santos nos dias 26 e 27 de outubro e coordenado pelo engenheiro Ricardo Sudaiha, objetiva habilitar talentos para esse novo cenário da dragagem portuária. O curso será no Hotel Mercure, na Avenida Washington Luiz, 565, Boqueirão, em Santos (SP). Mais informações sobre o evento clique aqui. Segundo Ricardo Sudaiha, a intenção é transferir para os gestores e técnicos dos portos e das instituições que precisam de dragagem, tudo que o engenheiro aprendeu nos 40 anos de vida empresarial, estratégica e técnica em dragagem. “Na realidade, é aquele último punhado de sementes que se lança na terra secam na esperança de acordar o país e regatar a tecnologia nacional de dragagem”, afirma o especialista. É sobre o atual panorama que o engenheiro falou em entrevista ao Portogente.
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Dragagem tem pressa
Portogente - A complexidade do processo licitatório e a morosidade burocrática são tidas como os grandes entraves para as atividades de dragagem no Brasil. Qual seria a solução para agilizar esses processos, sem prejuízo de obediência aos critérios ambientais e jurídicos?
Ricardo Sudaiha - Sem duvida, qualquer licitação realizada pelo Poder Público sofre todas as contingências das normas regulatórias e da preocupação dos seus responsáveis em atender, á exaustão, á legislação vigente. A consequência disso é uma enorme burocracia, na qual o 'fazer como'' tornou-se mais importante do que o '' fazer ''.
A solução, que se formalizaria através de uma legislação específica para esse fim, é serem desvinculadas do Poder Público a arrecadação da taxa portuária e a gestão das concorrências de dragagem, que passariam a ser realizadas pelos maiores interessados, que são os terminais privados formalmente organizados para esse fim em cada porto ou região.
Portogente - Como está o Brasil em termos de tecnologia em dragagem?
Ricardo Sudaiha - O País já esteve atrasado em tecnologia de dragagem. Hoje estamos muito pior. Regredimos! Não dispomos de praticamente nenhuma tecnologia, pois 99% das obras no Brasil são realizadas por dragas e tripulações estrangeiras.
Portogente - Há falta de trabalhadores qualificados para o setor?
Ricardo Sudaiha - Sim, antes da atual crise econômica, o país já carecia de marítimos e tripulantes para as suas dragas. Atualmente esse contingente praticamente se perdeu e somente um esforço dirigido do governo, para formar novos tripulantes em dragagem, poderá resgatar a mão de obra do setor.
Portogente - Quando presidente da Bandeirantes, empresa nacional de dragagem, o senhor defendia a participação das empresas estrangeiras nas licitações para dragagem dos portos brasileiros. O senhor mantém essa opinião?
Ricardo Sudaiha - Não é questão de defender ou contestar a participação das dragas estrangeiras, pois não há como negar a expressiva participação das empresas dos Países Baixos em todo o mundo e, por conseguinte, aqui também.
Como o país nunca estimulou as empresas nacionais de dragagem e também não manteve uma parte do controle dessas dragas nas suas mãos, não há contestação que, sem a participação das dragas estrangeiras, não haveria como dragar os nossos portos.
Portogente - O senhor defende que a responsabilidade da contratação dos serviços de dragagem saia do governo e passe para os terminais portuários, sejam públicos ou privados. No caso, os terminais pagariam pelos serviços, uma vez que são os maiores interessados? Quem fiscalizaria as operações?
Ricardo Sudaiha - Sim, com a mão direita os terminais controlam a receita da taxa portuária e com a mão esquerda pagariam pela dragagem. Quanto à fiscalização, se for feita pelo governo ou uma de suas agências, voltaríamos á estaca zero. De alguma forma os usuários dos portos teriam que se organizar para fiscalizar essas operações, cujo o principal objetivo deve ser o de manter o canal dragado, com o menor custo possível da taxa portuária. No primeiro momento, nas concorrências a serem feitas pelos terminais, as empresas estrangeiras poderiam baixar violentamente os seus preços - como já está ocorrendo agora.
Na ultima licitação em Santos, a empresa belga Deme/Dragabrás ofertou um desconto de 40% sob os preços básicos da CODESP, que já vinham sendo balizados pela empresa holandesa Van Oord.
Posteriormente, caso elas conseguissem desestimular a criação de empresas nacionais a serem formadas pelos Terminais ou por terceiros interessados, os seus preços voltariam a subir rapidamente. Uma estratégia inteligente, que infelizmente os nossos governos até o momento não adotaram, é o país deixar de ser refém dessa desconfortável situação, abandonando essa politica de estreita visão que é a de se preocupar apenas com formalidades, burocracias e preços teoricamente baixos. O maior custo é sempre o da dependência, que gera subserviência. Um País com 8.200 km de costa marítima não pode ficar refém de dragas estrangeiras controladas por empresas privadas internacionais. Nenhuma Dragagem é ambientalmente sustentável se não houver controle do Governo por pelo menos parte da frota nacional de dragagem. Portanto, essa discussão exige uma abordagem mais profunda e mais ampla da questão, envolvendo o governo e os terminais interessados, mas certamente com a participação da inteligência estratégica do país.
Portogente - O senhor propõe que os terminais formem, de maneira cooperativa, empresas para dragar os portos que utilizam. Uma vez que as operações de dragagem seriam dos terminais para os próprios terminais, essa é uma proposta de autogestão?
Ricardo Sudaiha - Os terminais ou outras empresas poderiam, seja através de seus acionistas, ou em condomínio ou cooperativa, formar empresas de dragagem que visassem competitividade e lucro, sem obrigação do ''Chico trabalhar para o Francisco''. Não se deve esperar de inicio preços baixos, mas sim o controle de uma parcela do mercado, especialmente nas obras inferiores a 10 milhões de dólares, pelas novas empresas de dragagem a serem formadas.
Resumindo, a solução que propomos é: O governo e o Congresso criariam ferramentas legais para disponibilizar os recursos da taxa portuária, para contratação e gestão de dragagem através dos terminais privados. Os terminais ou outros interessados criariam empresas de dragagem para absorverem aproximadamente 30% do mercado nacional. As licitações com dragas estrangeiras se limitariam a 50% do volume de trabalho, já sabendo que, a princípio, elas teriam um custo menor do que a das empresas nacionais. O Governo manteria 10 a 15 % do mercado, formando uma empresa de especifico cunho estratégico para formar e treinar tripulação de dragagem, com pequena frota própria de dragas a serem adquiridas, e suprir os eventuais vazios do mercado em portos de baixa viabilidade econômica ou de interesse publico.
Esse modelo se aproxima do adotado nos EUA, e pode ser desenvolvido rapidamente desde que a Casa Civil da Presidência e os terminais privados se unam para esse fim. É plenamente viável que em um prazo inferior a seis meses já tivéssemos dragas nacionais operando no país. Aliais é uma grande oportunidade para o novo Governo Temer demonstrar publicamente a sua audácia para desentravar nossos portos - principal meio para escoar nossas safras e commodities - e resgatar o déficit púbico nacional de 170 bilhões de reais por ano.