Sexta, 22 Novembro 2024

O pai experimentou e não conseguiu parar. Os filhos, um a um, também tentaram sair e não conseguiram. Está provado que o trabalho no Porto de Santos, apesar das dificuldades que impõe, encanta e chama atenção de quem pretende obter estabilidade profissional e pessoal.

 

Para o portuário Wilson Roberto de Lima, o Porto de Santos foi uma segunda casa, para onde ele e seus quatro filhos acabaram migrando, de forma lenta e gradual. Hoje, Wilson – que é secretário geral do Sindicato dos Trabalhadores de Bloco – nutre uma preocupação até certo ponto surpreendente: “Só não quero que meu neto mais velho tente entrar no porto. Aí é muito para meu coração, chega!”.

 

Motivos para se preocupar Wilson tem. Ele começou a trabalhar na Cosipa, mas logo estava no cais santista, mais precisamente, em 1971. Só que Wilson gostava mesmo era de curtir a vida, e isso acabou precipitando sua saída da Companhia Docas de Santos (CDS).

 

“Eu gostava do porto, mas também amava o carnaval. Em 1974, resolvi me realizar e festejei o quanto pude, mas exagerei na dose e fui despedido”, relembra com uma tranqüilidade surpreendente, para então emendar: “Mas botei na minha cabeça que voltaria, e por isso lutei pela carteirinha do bloco”.

 

A determinação de Wilson, segundo o próprio, não assustou sua primeira esposa, com quem teve os quatro filhos portuários. Ele conta que Leonilda de Lima entendia o problema de ver o marido dedicar pouco tempo à família, devido ao excesso de trabalho que o Porto de Santos oferecia. Hoje, vive seu segundo casamento, mas garante que a relação entre a atual esposa, sua ex-mulher e os quatro filhos é harmoniosa.

 

Contadores de histórias

Depois de se inserir no meio avulso, Wilson trabalhou por anos no bloco e na estiva, categorias interligadas por muito tempo. “Até que um dia chegaram pra mim dizendo que um pessoal sairia do sindicato. Do dia para noite fui empossado como presidente do Sindbloco. Tomei um susto, mas tentei ajudar a categoria a não se perder naquele momento”.

 

Este caso aconteceu em 1981. Dois anos comandando o sindicato bastaram para que Wilson fosse eleito oficialmente. A partir de 1983, muitas disputas internas e externas marcaram a carreira de líder sindical. “Cansa bem mais ficar num sindicato que descarregar um navio de açúcar. O braço é substituído pela cabeça”.

 

Hoje, após até mesmo ter sido diretor do Sindicato da Estiva, Wilson se dedica ao Sindicato do Bloco, reeleito há duas semanas para mais um mandato como secretário-geral a frente da entidade. "Do tempo em que fiquei na direção da estiva [2000 a 2002], guardo boas relações com o Vanderlei [da Silva], então presidente. Discuti com ele, discordei de seu posicionamento em uma greve, mas o que levo comigo é a admiração por este homem, um dos mais importantes do meio portuário santista".

 

Por conviverem com este clima em casa, os filhos de Wilson acabaram seguindo a escrita e entraram no porto para trabalhar como avulsos. Primeiro, foi a vez do mais velho, Wilson Lima Júnior, 37 anos. Júnior, como é chamado pelos irmãos, destaca que gostou do porto pelo fato do pai o ter levado ao cais em diversas oportunidades.

 

“O clima é contagiante. Quando você entra, não consegue mais sair, por maior que seja o cansaço. E eu admito que o outro fator que me arrastou para este serviço braçal foi o ganho que os portuários tinham antigamente. O salário de um avulso era aguardado por todo comércio regional”.

 

Um que tentou fugir do destino foi Willians Roberto de Lima, de 34 anos. Ele ri ao lembrar dos vários empregos em que tentou se firmar antes de se render ao ganho que o cais santista lhe ofereceria. “Fui office-boy, cobrador de ônibus... mas meu filho nasceu, precisava de dinheiro para sustentá-lo e só enxergava o porto como saída”.

 

Após 16 anos de porto, Willians resume a importância do pai em sua vida com uma confissão. “Agradeço tudo que tenho ao meu pai. Ele nos educou, e nunca desistiu de nós, embora eu fosse de longe o mais bagunceiro da casa”.

 

Gérson de Lima, 33 anos e 15 de porto, foi outro filho que tentou escapar do serviço portuário e não conseguiu. Ao menos, garante, o dinheiro ganho serviu para compra de alguns bens. Hoje, diz, a renda cada vez menor diminui o poder de aquisição das pessoas. Aprovado no vestibular no mês passado para o curso de Logística na Unip, Gérson sabe que viver só do porto “é coisa do passado”.

 

O quarto filho, Anderson de Lima, acabou não participando da entrevista por estar, justamente no horário, trabalhando em um navio no porto. Este é o único dos filhos que ainda hoje é trabalhador de bloco, pois os outros três são estivadores.

 

Mensagem final

Para encerrar, a família Lima deixa uma mensagem para o PortoGente, que resume o que Wilson, o pai, tentou expressar ao longo de toda entrevista: “Não há orgulho maior para esta família que ter crescido dentro do maior porto da América Latina”. Veja.
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