Sábado, 23 Novembro 2024

Engenheiro naval, desde 1990 atuando na Libra Terminais, Gustavo Pecly Moreira tem a responsabilidade, desde 1º de julho do último ano, de comandar o Terminal 37 de Santos. O empreendimento de grande porte recebe, desde 2005, mais de 1.000 escalas de navios por ano e, em 2007, operou quantidade superior a 500 mil contêineres. Flamenguista e apreciador de caminhadas na orla da praia de Santos, Pecly veio do Rio de Janeiro – em substituição a Mauro Salgado - para fomentar o crescimento da empresa no maior porto da América Latina. Deixou na capital carioca os dois filhos mais velhos, morando hoje com a esposa e o herdeiro caçula.

 Fotos: Fábio Maradei  

Em entrevista concedida ao PortoGente, embora enfatize que “gosta mais de ler e de ouvir”, Pecly falou bastante, abordando o trabalho de motivação na empresa, as diferenças entre as duas cidades em que trabalhou e até mesmo suas preferências pessoais. A organização logística visando evitar entraves no Porto de Santos, avalia o engenheiro, é uma questão de planejamento. “Temos que procurar antever o que vai acontecer e fazer com que não aconteça”. O trabalho à frente da Libra como diretor-presidente, para ele, requer fazer a informação fluir, motivar e entrar em consenso com as partes envolvidas. “Meu trabalho é muito mais de motivação. A cada conquista, realçá-la. De cada derrota, tirar alguma coisa”.

 

PortoGente - Assim que o senhor chegou a Santos, quais os diferenciais que notou entre os terminais situados nos portos daqui e do Rio de Janeiro?
Gustavo Moreira Pecly – O diferencial está no tamanho, na quantidade de contêineres movimentados. Aqui movimentamos quatro vezes mais. No Rio, contamos com cerca de 120 mil e, aqui, 515 mil contêineres. Para lidar com essa movimentação, é necessário adquirir equipamentos especiais, transtêineres, enfim, fazer investimentos visando a verticalização no pátio do terminal. Como há um tamanho fixo em metros quadrados, o modo de crescer é para cima. Já em termos de acesso e calado, Rio e Santos são similares.

PortoGenteE como o senhor classifica a situação atual da profundidade dos canais de acesso aos dois portos?
Pecly
– Os dois são ruins. E é uma característica do ser humano sempre buscar mais. Se levarmos a profundidade de hoje para 17 metros, ainda vamos ficar insatisfeitos. Muitas pessoas acham que ao proporcionar determinada condição será o suficiente, mas, após se acostumar ao bom, vai aparecer a vontade de ter mais. Se a profundidade for de 14 metros, virão navios de 14 metros e, nesse meio, virá alguns de 15 metros. Assim, 14 metros passa a ser pouco. Então, quando passarmos a 15, aparecerão navios de 16 e assim por diante. Historicamente, a condição física é uma demanda permanente.

 

PortoGenteE como lidar com essas necessidades?
Pecly
– Eu acredito que o mercado sempre procura solução. A possibilidade de Santos absorver o crescimento do Porto está nas mãos do pessoal aqui. Se há 10 anos, nada tivesse sido feito, outros portos teriam absorvido as cargas que passam por aqui.

PortoGenteComo é atuar em meio a conflitos de interesses e a diferentes necessidades dos diversos atores do sistema portuário, como o setor privado, o setor público e a autoridade portuária?
Pecly – Sempre há um ponto de equilíbrio. Temos que separar aquilo sobre o que a gente briga e tratar do consenso. Quem vai ser contra aumentar o calado? No Rio, a Libra e MultiRio fizeram a dragagem do porto com recursos próprios, contando apenas com o auxílio da Docas.

PortoGenteÉ o setor privado fazendo às vezes de estado?
Pecly – Sim, muitas vezes a empresa é mais parceira da Autoridade Portuária do que o governo. Quanto mais o terminal movimentar, melhor para a Autoridade Portuária, vão aparecer outras oportunidades. É um jogo de ganha-ganha.

 

PortoGenteHá uma tendência de contêinerização de cargas?

Pecly – A história mostra que no seu devido momento algumas cargas migram para o contêiner. Na verdade, são quantidades menores, compradores menores de açúcar, por exemplo. Em um contêiner, (a carga) chega numa logística mais simples. É melhor do que levar em sacaria, sem o tombo de carga. Os serviços de contêineres são muito programados, a maioria trabalha em cima de escalas semanais. A regra é o contêiner chegar no dia da semana em que está determinado. Um navio graneleiro já é mais complexo porque a tendência de grandes transportes a granel é envolver grandes boladas de pagamento.

 

PortoGenteQual a sua análise sobre esse momento da atividade portuária, em grande evidência no País?
Pecly – Foi um grande presente que o setor recebeu, primeiro a criação da Secretaria Especial de Portos e, segundo, em ter o ministro Brito. É a primeira vez em que temos uma sinalização e uma execução da política do governo de forma benéfica para o setor. Ele (o ministro) é muito dinâmico. Nas poucas vezes em que estive com ele notei uma verdadeira vontade de realizar tudo aquilo com que ele se comprometeu.

 

PortoGenteComo o senhor se ambientou ao trabalho em Santos? Como trabalhar com uma equipe, uma diversidade de funcionários em uma empresa como a Libra?
Pecly – Eu rapidamente me ambientei. Posso não ser um especialista em tudo, mas, para aquilo que não sei, é importante ter alguém que sabe. A competência em dirigir um terminal também está na escolha dessas pessoas.

PortoGente E como o senhor gerencia esse trabalho em equipe?
Pecly – A informação é o fator mais importante. Tem que garantir que a informação flua, as informações técnicas e sobre o desempenho da empresa. Ninguém quer integrar um time perdedor. Assim, você vai motivando a todos a caminhar na direção do sucesso, para atingir um objetivo. Meu trabalho é muito mais de motivação. A cada conquista, realçá-la. De cada derrota, tirar alguma coisa. E organizar um ambiente no qual cada um se sinta bem.

PortoGenteNessa linha de pensamento, o recurso humano é uma das maiores riquezas da empresa?
Pecly – O equipamento, o mundo pode oferecer para você. Você especifica e compra. Agora, o recurso humano tem muitas variáveis. É ele que vai fazer o equipamento funcionar. O ser humano é fundamental para isso. É aí que está a verdadeira frente de resultados.

 

PortoGenteO senhor se referiu à importância da informação. O senhor gosta de ler? Como se informa?

Pecly – Eu gosto mais de ler e de ouvir do que de falar. Não gosto de dizer como eu quero, gosto de ouvir a todos e, mesmo que leve mais tempo, chegar a um consenso. O consenso faz com que o trabalho flua mais rapidamente e com mais precisão.

 

PortoGenteJá que o senhor procura sempre ouvir e chegar a um consenso, como é sua relação com a Codesp? Há um contato permanente?
Pecly – Não tenho um contato permanente com a Codesp, mas também não tinha no Rio (com a CDRJ). Nossa relação é tranqüila. Mas a maior diferença que vejo entre os dois locais é a relação porto-cidade. Lá (Rio), o Porto quase não existe para a população. Passei oito anos lá e é completamente diferente daqui. A participação econômica do porto para a cidade (em Santos) é muito grande, a cidade convive diretamente com o porto de forma muito importante. No Rio, o porto movimenta apenas 1% ou 2% da economia local. Se você chega para um motorista de táxi no Rio e pede para levar para a zona portuária, é capaz até de ele perguntar ‘onde é que fica?’.

 

PortoGenteE no aspecto pessoal, quais as diferenças que o senhor já notou entre Santos e Rio de Janeiro?
Pecly
– O Rio me irrita (risos). O trânsito não anda, isso me incomoda. Aqui é mais tranqüilo, com a vantagem de também ter a praia e atividades de lazer numa distância em que é possível saber que você vai ‘daqui ali’ em dez minutos. Você se acostuma com isso e tudo fica mais previsível. Aí, quando volta para lá e vai dirigir por cinco quarteirões, o sinal já fecha, nada anda. Não se acostuma mais. Uma vez que você provou uma coisa melhor, você não quer voltar para trás.

 

PortoGenteNa questão do trânsito, como em Santos em que se vê muitas filas de caminhões próximas ao porto, o senhor acredita que falta planejamento?
Pecly – Tudo é planejamento. O agendamento de cargas é planejamento. Planejar tudo dentro do tempo e dentro da demanda. Não adianta virem todas as cargas de uma só vez. A questão logística é resolvida com planejamento. A perimetral vai ajudar a ter vias organizadas, com menos interferência da linha férrea, mas a questão aí é a velocidade em que isso tem que acontecer. As pessoas mais reagem do que agem. Para mim, temos que procurar antever o que vai acontecer e fazer com que não aconteça. Assim, o resultado fica fluído, resolveu antes. É uma luta permanente para se antecipar.

 

PortoGente E o que falta para esse planejamento ser adotado?
Pecly
– No mundo teórico, o caminhoneiro não faz xixi, não toma café. Só que ele pára. Pára pela necessidade ou quando ou caminhão quebra. E quando quebra, tem que se preocupar em parar no lugar certo. As pessoas precisam ter disciplina. O que me chama atenção aqui em Santos é como os carros não sobem na calçada. Os motoristas têm disciplina. No Rio, os carros não descem da calçada, quem desce é o pedestre. Mérito dos que conseguiram (em Santos) assimilar a boa conduta. Tudo funciona em conjunto, como uma orquestra, tem que ter isso na cabeça. E nessa questão, o santista ainda é muito disciplinado. Isso é bom sinal.

PortoGenteO senhor falou em orquestra. Gosta de música? Quais são seus hobbies?
Pecly – Musica só para ouvir. Cantar nem me assanho, de instrumento me mantenho longe (risos). O que gosto mesmo é de ficar em casa com a família e de caminhar. Caminhar na praia é uma terapia (ele anda de 6 a 8 quilômetros todas as manhãs). Me sinto bem, o ambiente da praia é muito agradável.

Curta, comente e compartilhe!
Pin It
0
0
0
s2sdefault
powered by social2s

topo oms2

Deixe sua opinião! Comente!