Pensar porto como um elo da cadeia logística marítima e terrestre é imediatamente visualizar a chegada e saída de navios junto ao cais. Desde as instalações mais rudimentares até os atuais e modernos complexos portuários, a atracação e desatracação de navios se estabelece pelas mãos de um profissional essencial, o amarrador de navio.
É através da sua técnica e força que os navios conseguem estabelecer contato com o cais e com o meio terrestre. Faz-se imprescindível o trabalho destes homens. No Porto de Santos, eles somam cerca de 150 trabalhadores, sendo 17 deles vinculados à Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp) e os outros 133 ligados a uma empresa terceirizada.
O trabalho, em teoria, consiste em amarrar os cabos do navio junto aos cabeços localizados nos berços de atracação. O amarrador espera o tripulante do navio lançar as cordas para, então, fazer a amarração. Mas a prática exige mais técnica do que força, dizem os trabalhadores. “Nós temos que ter postura senão arrebenta a coluna. Nós temos que saber se livrar dos perigos da amarração dos cabos. Não é tão simples quanto parece”, define o amarrador Maurício do Nascimento.
Os amarradores de navio trabalham 24 horas, todos os dias do ano. Para cada seis dias trabalhados, há um de folga. Eles estão divididos em quatro turnos e, no início de cada período, um funcionário da Codesp repassa a previsão de navios que deverão ser atracados e desatracados naquele setor. A cada confirmação, os atracadores avisam com antecedência de pelo menos meia hora qual é o serviço aos amarradores. Quando o navio está prestes a atracar os amarradores estão de prontidão.
O tempo de uma amarração varia de acordo com dois fatores: o tamanho do navio e o tipo de cabo que ele utiliza. Em média, uma atracação leva uma hora para ser finalizada.
Mas o ofício não é tão simples quanto se descreve. Há muita insegurança durante a operação. Pelo menos é o que alerta o presidente do Sindicato dos Operários Portuários de Santos (Sintraport), Robson Apolinário. ”Locais que operam navios com grãos, como soja, trigo são inseguros. Imagina o piso cheio de soja e irregular. O risco dos trabalhadores escorregarem é enorme. Imagina você puxar o cabo e tentar ficar com os pés firmemente no solo cheio de grãos. O piso não fica aderente. Além disso, outra questão é o não isolamento da área durante a atracação. No cais do Saboó, por exemplo, ao mesmo tempo em que se faz a atracação, se faz o embarque de veículos. O amarrador fica de costas puxando o cabo enquanto está ocorrendo o embarque. Isso não pode acontecer”.
Outra ponto crítico levantado pelos trabalhadores diz respeito à quantidade de cabeços, muitas vezes utilizados para a amarração de mais de um navio. “Às vezes cada cabeço leva oito cordas. É preciso experiência para amarrar os cabos sem causar problemas ao segundo navio que deve ter as cordas encapeladas. E aí que entra a experiência do amarrador. Se o amarrador não souber fazer o trabalho, há o risco de soltar o navio errado.”, explica Maurício.
O amarrador e vice-presidente da Associação Recreativa e Representativa dos Amarradores do Estado de São Paulo, Paulo Henrique Castilho, também ressalta a importância da experiência. “Você não pode deixar o cabo do navio cortando no outro, senão pode virar uma “navalha” e cortar o cabo de outro navio. O amarrador experiente é capaz de ouvir quando o cabo vai estourar. Infelizmente, nós somos uma categoria menosprezada, inferiorizada dentro do cais.”
Instabilidade
O sentimento de desprezo fica mais evidente quando o assunto é a garantia de emprego. Hoje, os trabalhadores terceirizados temem que a Codesp realize concurso público e acabem sendo deixados de lado, mesmo com 14 anos de experiência, desde a criação da Força Supletiva.
Apolinário, presidente do Sintraport, não é contra novas contratações, mas defende a manutenção dos atuais trabalhadores. “Não se pode empregar, desempregando. Tem que ver as condições de cada trabalhador, especialmente no que diz respeito a know-how. Se hoje saírem esses 130 trabalhadores e colocar somente concursados, é caos na certa. Ninguém opera, ninguém amarra navio no porto. E se amarrar, não solta”.
Ele acredita que as chances devam ser as mesmas para todos. “Eu entendo que o concurso público é uma norma justa, tem que ser dadas oportunidades iguais para todos, porém o que não pode se fazer é menosprezar, relegar a segundo plano o conhecimento, a experiência dos companheiros atuais de mais de 13 anos. O Porto tem que ter um compromisso com eles “.
A assessoria de imprensa da Codesp não soube informar quando haverá concurso público para amarradores de navio.