Cristiane Brasil é deputada federal pelo PTB do Rio de Janeiro e autora do substitutivo do PL 1202/2007, que regulamenta a atividade de relações institucionais e governamentais. O artigo foi publicado, originalmente, no jornal O Globo no dia 22 de junho
Lobby é diferente de corrupção. Numa democracia moderna, a defesa de interesses legítimos de empresas, entidades e organizações junto aos agentes públicos é fundamental para a vitalidade do processo democrático e na tomada de decisões estratégicas pelo Poder Executivo ou Congresso Nacional. A melhor forma de decidir é ter à disposição inúmeras visões e perspectivas antagônicas em relação ao mesmo fato. Tudo precisa acontecer de maneira transparente para todos os lados, sem movimentos nas sombras ou em conversas sem testemunhas. É nesse contexto que defendo a regulamentação da atividade de lobby no Brasil, como já acontece nas maiores economias do planeta. Se queremos ser uma nação vibrante, atrativa para investidores e transparente para os cidadãos, precisamos criar um marco regulatório para essa questão. Isso é lobby.
Corrupção é diferente de lobby. O que assistimos nos últimos anos a partir da Operação Lava-Jato — sucessivas prisões de figurões da República, tenebrosas transações e malas de dinheiro sendo distribuídas na calada da noite — é corrupção. Os denominados “lobistas” pela mídia ou Ministério Público estão bem longe de qualquer definição clássica dessa profissão. O termo ganhou conotação pejorativa e se transformou em sinônimo de tramoias, fraudes contra o patrimônio público e acordos nos quais apenas os envolvidos se beneficiam em prejuízo da sociedade. Isso é corrupção.
Os brasileiros que acompanham o noticiário e ficam estupefatos com a prisão quase diária de “lobistas” precisam entender que essas pessoas são corruptas organizações criminosas que as abrigam. Minha obrigação como parlamentar, eleita pelo povo do Rio de Janeiro, é levar aos meus outros 512 colegas da Câmara dos Deputados e também aos 81 senadores, quando possível, a visão de que o lobby regulamentado será melhor para o país. Dessa forma, poderemos ter um mapa mais claro dos interesses que gravitam em torno de determinados assuntos em discussão no Poder Legislativo. Tanto aqueles de interesse do setor privado quanto dos trabalhadores, representados nas ações de lobby dos seus sindicatos.
Ao apresentar esse projeto de lei, também ambicionei envolver os brasileiros interessados no assunto. E não são poucos. As consultas feitas mensalmente no Google Brasil sobre esses temas mostram os movimentos dessa opinião pública digital. Há 47 formas de buscas para as palavra lobby e lobista. Por mês, em média, ocorrem 23 mil pesquisas sobre o que é lobista e cinco mil para a expressão lobby.
A discussão do projeto que regulamenta o lobby precisa sair de Brasília. Vou utilizar as redes sociais para chegar a cada um dos 117 milhões de brasileiros com acesso à internet, e assim influenciar a maior quantidade de pessoas nesse debate. Normatizar o lobby é dar dignidade a uma categoria profissional, hoje confundida com saqueadores do dinheiro público, e permitir que eles saibam — e que todos nós saibamos — como devem trabalhar. É preciso dar transparência às atividades de representação de interesses e regular a forma como são remuneradas.
Acreditar que exista a simples dicotomia entre interesse público e privado não é postura democrática. O interesse público é uma construção que deve ser erguida a partir de instrumentos transparentes. O sistema eleitoral brasileiro, o princípio democrático que estabelece o valor de “uma pessoa, um voto” é o melhor e mais justo que pudemos construir na busca de igualdade, mas é incompleto.
É preciso regulamentar a representação de interesses, garantindo transparência às escolhas públicas e assegurando que agentes privados não prevaleçam sobre os interesses da sociedade, mas possam contribuir com informações para a tomada de decisão.