Opinião | Carlos Magano
Engenheiro Civil, ex-funcionário de carreira e ex-diretor de operação do Porto de Santos
Como a Queda de uma Sanção dos EUA Abre Caminho para Novas Concorrências
A revogação das sanções da Lei Global Magnitsky impostas pelo governo Trump ao ministro Alexandre de Moraes, do STF, parece ser um evento de política externa distante do cais do Porto de Santos. No entanto, em um complexo logístico que é o espelho da economia brasileira, essa decisão ressoa, simbolicamente, no debate mais quente do setor: o leilão do STS-10 (Tecon Santos 10).
A conexão entre a diplomacia em Washington, o Supremo Tribunal brasileiro e o maior arrendamento portuário do país é, essencialmente, uma leitura sobre risco e concorrência.
A estratégia dos irmãos Batista: blindagem global e oportunidade local
A JBS, controlada pela J&F dos irmãos Batista, surge como um potencial player decisivo no leilão do STS-10. Não por acaso.
A proximidade construída ao longo dos anos com o ex-presidente Donald Trump faz parte de uma estratégia de blindagem política e comercial nos Estados Unidos, após os conhecidos escândalos de corrupção. Esse bom trânsito não garante a vitória em um leilão, mas reduz o risco de sanções ou investigações que poderiam comprometer a capacidade financeira de um investimento estimado em R$ 5 bilhões. Em um setor intensivo em capital como o portuário, a solidez financeira global é condição básica para competir.
A grande oportunidade para a JBS está na decisão técnica do TCU e da ANTAQ ao aprovar o modelo bifásico do STS-10. Esse desenho veda a participação de empresas já controladoras de terminais de contêineres no Porto de Santos, como Maersk/MSC e CMA CGM, com o objetivo explícito de reduzir o oligopólio que concentra mais de 80% do mercado santista.
Ao restringir os incumbentes, a regra abre espaço para novos entrantes — como a JBS Terminais — que, em condições normais, teriam enorme dificuldade de enfrentar os grandes grupos logísticos globais já instalados. Nesse contexto, a JBS aparece como favorita não por lobby político, mas por aderir aos critérios de promoção da concorrência definidos pelo regulador brasileiro.
O fim da sanção: um sinal de estabilidade para o setor
A retirada da sanção Magnitsky não altera diretamente a planilha de custos do porto, mas seu significado político é relevante para a logística e para os investimentos em infraestrutura.
A Lei Magnitsky, que pune indivíduos por corrupção e violação de direitos humanos, carrega o risco de contaminação reputacional, tornando potencialmente “tóxicos” para o sistema financeiro global setores ou empresas associadas, ainda que indiretamente, aos sancionados.
A revogação do ato diplomático sinaliza um desanuviamento geopolítico. Elimina um ponto de instabilidade que poderia respingar em grandes projetos de infraestrutura dependentes de bancos e seguradoras internacionais. Trata-se, portanto, de um endosso implícito à resiliência institucional brasileira e de um fator que contribui para um ambiente de negócios mais previsível — exatamente o que investidores portuários buscam.
Em última análise, o megaleilão do STS-10 é o campo onde a política de promoção da concorrência, definida internamente, se sobrepõe à influência do capital externo. A JBS, blindada por sua estratégia internacional e favorecida pelas regras do certame, representa um novo player nacional capaz de romper a concentração histórica e introduzir a concorrência que o Porto de Santos demanda há anos.
Carlos Magano
Engenheiro Civil, ex-funcionário de carreira e ex-diretor de operação do Porto de Santos








