Artur Araújo é consultor da Federação Nacional dos Engenheiros (FNE)
A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), na noite de 6 de junho de 2019, liberando, sem aprovação pelo Congresso, a venda de subsidiárias de empresas estatais foi um erro extremamente grave. Põe em risco a soberania nacional e o desenvolvimento autônomo do Brasil.
A sentença nos ameaça com um dano de proporções talvez maiores do que os da deforma trabalhista (que não gera um emprego, mas precariza todos) e da Emenda Constitucional da Morte (que institui um teto de gastos destruidor de todos os serviços públicos). Com a decisão proferida, a maioria dos ministros deu aval indireto ao privatismo, ao entreguismo e à inviabilização de um projeto nacional de desenvolvimento inclusivo e progressista.
Na verdade, foram até além disso: deram suporte ao chamado “capitalismo de compadrio” e abriram as portas para que corruptores tenham grandes vantagens na conquista de negócios bilionários e de atividades estratégicas para o futuro do Brasil.
Enquanto vigorar essa diretriz do STF é possível comprar operações muito rentáveis – e vitais para o funcionamento integrado e autônomo do parque produtivo do país – em condições e preços sem qualquer controle público.
Ao dispensar a venda de subsidiárias e controladas de prévia aprovação pelo Congresso – e, muito mais grave, dispensando também a obrigação de processo de concorrência pública para seleção dos compradores –, as ministras e os ministros que compuseram a maioria instituíram o “vale-tudo” como nova Lei da Terra.
Petroquímica, gasquímica, biocombustíveis, fertilizantes, distribuição de gás natural e combustíveis, refino de petróleo são algumas das muitas atividades que poderão ser adquiridas por qualquer grupo, inclusive estrangeiro, mediante mero acerto com a maioria dos membros de conselhos de administração, raramente mais do que duas dezenas de pessoas, geralmente bem menos.
Entram também na lista de riscos de grandes prejuízos, via alienação descontrolada de patrimônio nacional, empresas do sistema Eletrobrás, a Embrapa, a administradora de hospitais públicos, a Indústrias Nucleares do Brasil (INB), as seguradoras de Caixa Econômica Federal (CEF) e Banco do Brasil (BB), entre os exemplos mais conhecidos das 88 subsidiárias das 134 empresas públicas brasileiras (36 subsidiárias pertencem à Petrobrás, 30 à Eletrobrás, 16 são do Banco do Brasil).
Quem as adquirir, a sabe-se lá que preço e prazo, delas fará o que bem entender, desde o aumento monopolista dos preços de seus produtos e serviços ao puro e simples encerramento das atividades ou transferência de plantas e empregos para outros países.
Todas as sinergias, todo o encadeamento produtivo e tecnológico, todo o conhecimento acumulado, todo o potencial de geração de ciência aplicada, toda a engenharia integrada que hoje existem – e que foram criados com os esforços e recursos coletivos de todos os brasileiros de múltiplas gerações – serão irremediavelmente perdidos na dispersão mercadista.
A Suprema Corte, tristemente, comunicou aos brasileiros que foi dada a largada para o desmanche definitivo e irreversível da estrutura produtiva do País. Sinalizou, também, que a segurança nacional, que o desenvolvimento econômico e social, que até a probidade são temas sem importância, passíveis de sacrifício em nome da lógica do curto prazo e dos ganhos de ocasião.
Frente a um erro dessa magnitude, urge ação. Todos os brasileiros – e, mais ainda, os engenheiros e suas entidades – com um mínimo interesse na sobrevivência do Brasil como nação autônoma e viável, com capacidade de progresso e de melhoria da vida de seus habitantes, têm que, imediatamente, associar-se em campanha cívica, exigindo do Congresso Nacional legislação emergencial que reverta o desastre anunciado.
Ou detemos já a destruição do futuro ou retornaremos definitivamente ao passado agrário e extrativista, mergulhados na inviabilidade enquanto projeto coletivo de civilização e bem-estar.