Quarta, 27 Novembro 2024

Marcos Fava Neves é professor das Faculdades de Administração da USP em Ribeirão Preto e da FGV em São Paulo

Vamos ao resumo dos principais fatos do agronegócio do mês de março, começando com uma volta ao passado para nos contaminar de orgulho. Nossa produção de grãos, quando se analisa o período de 1975 até 2017, pulou de pouco mais de 40 milhões de toneladas para quase 240 milhões. A produtividade cresceu 3,43% ao ano, graças à abertura comercial, tecnologia, mecanização, educação, profissionalização, crédito, pesquisa, empreendedorismo, diversificação da produção e integração de lavouras. Neste mesmo período as carnes tiveram incrível salto: frango foi de 370 mil para 13,5 milhões de toneladas, suínos de 500 mil para quase 4 milhões, e bovinos de 1,8 para 7,7 milhões de toneladas.

Falando do presente, a estimativa de produção da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) está agora em 233,3 milhões de toneladas, acima da safra 2017/18 (227,7 milhões de toneladas), mas praticamente 1 milhão de toneladas abaixo da estimativa de fevereiro. O tombo principal foi na soja, onde eram esperadas 120 milhões de toneladas e devemos ter 113,5 milhões (safra passada foi de 119,3 milhões). A Abiove prevê um pouco mais, 116,9 milhões de toneladas, 1 milhão a menos que o estimado em janeiro, bem como a Agroconsult.

Na soja temos colheita quase finalizada, passando de 80%, e os riscos do clima caíram bastante. O risco agora mais forte é a segunda safra principalmente no milho, que a Conab estima em quase 93 milhões de toneladas, que seria a segunda maior da nossa história. Com o clima ajudando, este milho abastecerá bem todas as demandas, do mercado interno, externo, rações e produção de etanol. Segundo o Imea (Instituto Mato-Grossense de Economia Agropecuária) o plantio no MS foi concluído com quase 96% plantados na melhor janela.

O USDA (Departamento de Agricultura dos Estados) soltou no final do mês as expectativas de plantio para 2019/20. Para o milho espera-se uma área 4% maior, totalizando 37,56 milhões de hectares e os estoques são de 218,4 milhões de toneladas (caíram 3% em um mês mas estão acima do que previam analistas em mais de 6 milhões de toneladas). Já na soja a queda deve ser de 5% na área plantada, totalizando 34,24 milhões de hectares. Mas como os estoques estão muito altos (quase 74 milhões de toneladas e 30% maiores que na mesma data do ano passado), este número não alterou o preço. Para o trigo esperam plantar 4% a menos, total de 18,54 milhões de hectares (estoques também muito altos), bem como 2% menor no algodão, com 18,54 milhões de hectares. A principal boa notícia é a área menor de soja, mas com pouco efeito imediato.

Os estoques de grãos no mundo estão em patamar muito confortável, o que força a permanência dos preços provavelmente nos níveis atuais. Pelo USDA no milho ao final da safra 2018/19 (agosto deste ano) os estoques estarão acima de 27% da necessidade de demanda anual (caindo de 31,4% na safra anterior). Na soja, estoque estará próximo a 30% do que será necessário em um ano. Portanto em preços, se nenhum fato novo aparecer, é estabilidade pela frente.

A performance de exportações do agro continua muito boa, em fevereiro vendemos US$ 7,2 bilhões, crescimento de 15,6% comparado com o mesmo mês de 2018. As importações também cresceram quase 10,5% e chegaram a US$ 1,2 bilhão. O superávit do agro cresceu 16,5% em fevereiro, atingindo US$ 6 bilhões. Só de soja foram US$ 2,21 bilhões, o dobro em relação ao ano passado. Pelos dados do MAPA, as carnes atingiram US$ 1,1 bilhão, quase 5% a mais. O café também cresceu 10,4%, atingindo US$ 452,3 milhões. Quem caiu foi o complexo sucroalcooleiro (açúcar e etanol), um total de 22,8% trazendo US$ 425,7 milhões.

Desde o início de 2019, exportamos 10,6 milhões de toneladas somando soja, farelo e óleo, quase 50% a mais que o mesmo período de 2018, trazendo US$ 3,9 bilhões, que representam 44,4% a mais. Os preços estão cerca de 3% menores. A China comprou quase 33% de tudo o que foi exportado, um total de US$ 2,3 bilhões, 77,2% a mais que fevereiro de 2018. Mesmo importando 18% a menos de soja em fevereiro, do Brasil a China comprou mais de 5 milhões de toneladas, 134% a mais que fevereiro de 2018. Nos dois primeiros meses do ano vendemos 7 milhões de toneladas, o dobro das quase 3,5 milhões de 2018. Com isto entraram no Brasil US$ 2,5 bilhões, quase o dobro também dos US$ 1,3 bilhão de 2018. Efeitos dos problemas com os EUA.

E este é um dos principais fatos internacionais a serem monitorados. Temos que ter receio de um acordo entre EUA e China e os impactos na área agrícola, pois a China teria que aumentar suas compras dos EUA. E pensar também como seria a trocas de canais, pois a produção adicional americana que iria para a China seria redirecionada em parte de outros mercados compradores, abrindo espaços nestes se tivermos acesso.

Ainda sobre China, podem ser muito positivos ao Brasil os impactos da peste suína africana na sua produção de suínos. Houve já vigoroso crescimento dos preços de exportação. A oferta chinesa em janeiro foi 12% menor, com queda de venda de rações e de compra de soja. Além de crescimento nas compras de carne suína, também foi observado em outras carnes e pela primeira vez a China foi o maior comprador de frango do Brasil, segundo a ABPA.

O “quinteto mágico” a ser observado nos próximos 30 dias: 1) a chuva sobre o milho; 2) andamento das negociações China x EUA; 3) os impactos da peste suína africana na produção e importações chinesas de carnes; 4) o binômio preços do petróleo e adição de mais etanol de milho na gasolina dos EUA; e 5) o andamento das reformas, com impactos na taxa de câmbio e os devaneios tributários sobre o agronegócio.

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