Clemente Ganz Lúcio é sociólogo e diretor-técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese)
Anunciada como cura para múltiplos males – como baixo crescimento econômico, desemprego, investimento público pífio, déficit fiscal e desigualdades – mudanças nas regras da Previdência e Seguridade Social foram encaminhadas pelo governo ao Congresso Nacional. Foi dada a largada para uma nova etapa desse jogo social complexo, que inclui produção e distribuição econômica, orçamento fiscal do Estado, tributação, investimentos e gastos públicos, políticas públicas e proteção social, igualdade, equidade e justiça.
O governo afirma que a sua iniciativa cria a “nova Previdência Social” que, ao reformar o sistema de Previdência e Seguridade Social, resolve muitas das mazelas que afligem o País. Para indicar o tamanho da economia que a “nova Previdência Social” realizará, o governo afirma que economizará mais de R$ 1 trilhão de reais em 10 anos!
Truco! Truuuco! A gente paga! Quanto custa esse trilhão por cabeça? Divide aí entre os trabalhadores que hoje contribuem para a Previdência e ... bem, arredondando, por cabeça, dá uma contribuição adicional de 2 mil reais por ano ou de 20 mil reais em 10 anos!
Seeeeeis, frouxão! Vai cortar, responde o posto Ipiranga! Está aqui o projeto!
Portanto, você aí parado, também será tungado! Como? A “nova Previdência” será econômica e vai deixar de pagar um trilhão de reais em direitos! De que jeito? Criando a idade mínima para a aposentadoria de 65 anos para os homens e de 62 anos para as mulheres e exigindo, ao mesmo tempo, um mínimo de 20 anos de contribuição. Esses dois critérios deverão ser cumpridos. Essa régua já excluirá milhões de trabalhadores. Depois, arrochará o valor do benefício de quem conseguir superar a régua idade/tempo de contribuição. Se chegar à idade mínima com 20 anos de contribuição, o aposentado levará para casa o benefício correspondente a 60% do valor médio dos salários que recebeu na vida. Suponha que seu salário seja hoje de R$ 2 mil reais e que a média dos seus salários durante toda a vida tenha sido de R$ 1.600,00 (atenção, essa é uma ótima média). O valor do seu benefício seria de R$ 960,00. Entendeu? Se aposenta muito tempo depois e leva para casa muito menos! Essa é a mágica.
Mais sofisticada, a “nova Previdência” alterará as regras para acesso a todos os benefícios especiais e para o cálculo dos valores correspondentes, sempre reduzindo os valores. Pensões serão reduzidas. Mulheres e trabalhadores rurais, professores e servidores públicos serão os mais afetados.
Os miseráveis que recebem os Benefícios de Prestação Continuada (BPC) da Seguridade Social são brindados com a idade mínima de 70 anos para adquirir o direito de receber um salário mínimo. E, para viver melhor sua pobreza, receberão R$ 400,00 a partir dos 60 anos.
Jabutis (medida estranha que acompanha o conteúdo principal de projetos no Congresso) foram inseridos no projeto da “nova Previdência” para ajudar na economia ou para avançar na reforma trabalhista. O governo mexe, por exemplo, no FGTS, retirando o direito à multa de 40% se, no momento da demissão, o trabalhador já estiver aposentado. Outro Jabutizinho: exclui do direito ao Abono Salarial quem ganha mais de um salário mínimo.
Não tenha dúvida: não há mágica. Se a meta é economizar R$ 1 trilhão, ou vai arrecadar ou vai cortar. A opção foi cortar os direitos dos trabalhadores, acelerando a transição para a entrada de todos na “nova Previdência”. Uma opção que o Congresso não deve aceitar, pois há outros caminhos para uma Seguridade e Previdência acessível a todos, com benefícios dignos e sustentabilidade econômica e atuarial.
Eles dizem: mas, se correr o bicho pega!
Nós dizemos: o bicho é feio, assusta! Mas vamos ficar e é para lutar!